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proteção das florestas código florestal passivos do agronegócio
2009-04-09
O comprometimento ambiental desejável em todas as esferas sociais transformou os tradicionais vilões do desmatamento na Amazônia em injustiçados durante o Katoomba Meeting 2009, evento que teve o mérito de reunir, em Cuiabá (MT), ruralistas, políticos, pesquisadores, ativistas e uma tímida parcela de representantes de movimentos sociais no dia 1º de abril. Não era mentira. Estavam todos sentados à mesma mesa com uma admirável disposição de negociar o futuro da maior floresta tropical do planeta, declamando frases de efeito com a nítida intenção de impressionar os representantes de dezenas de organismos internacionais, especialmente convidados para conhecer as experiências brasileiras no ramo do pagamento por serviços ambientais.

É verdade que nos últimos anos o governo tem demonstrado mais presença na Amazônia, que os estados estão implantando mecanismos mais confiáveis de regulação e monitoramento das propriedades, que o Brasil é exemplo na verificação do desmatamento por satélite, que os índices de desflorestamento vêm caíndo e também que a queda no preço de commodities agrícolas tem tudo a ver com isso. Todos são fatores que jogam a favor da imagem do Brasil num momento estratégico para que governos, pessoas físicas e jurídicas tenham confiança para financiar a manutenção das florestas tropicais.  

Se os anfitriões do encontro fizeram seu dever de casa e agora aguardam propostas ainda mais favoráveis em dezembro deste ano, quando acontece a Conferência das Partes (COP15) em Copenhagen, na Dinamarca, aos que permanecem na Amazônia brasileira, em especial em Mato Grosso, o Katoomba representou uma tentativa de esverdear graves e reais contradições.

A tempo de provocar alguma reflexão na platéia, Vincenzo Lauriola, assessor da presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai), falou na última mesa do último dia (2 de abril) que o pagamento por serviços ambientais está colocando aliados e inimigos do mesmo lado. “É complicado partir para o novo sem resolver os problemas do passado. Não sei se isso é positivo ou há uma armadilha aí na esquina”, ressaltou.

Quem é quem
Basta questionar qual é o real compromisso ambiental de proprietários rurais flagrados desrespeitando embargos por desmatamento ilegal impostos pelo governo federal. Ou então pensar que parlamentares, pecuaristas e produtores de grãos que prometem parar de devastar quando começarem a ser pagos são os mesmos que dão força a projetos de lei que querem sustar a demarcação de terras indígenas, um deles de autoria do mato-grossense Homero Pereira (PR/MT).  

Há outras dezenas de proposições com este mesmo teor tramitando no Congresso Nacional que, juntas, pretendem subtrair quase 10 milhões de hectares de áreas preservadas dentro de unidades de conservação federais país afora. O curioso é que os modelos de compensação financeira para evitar o desmatamento estão sendo construídos visando justamente que florestas sadias restantes nas zonas tropicais não sejam sacrificadas. E, como lembrou Tasso Azevedo, ex-diretor do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), a maioria das áreas que servirá para pagamento por serviços ambientais são públicas, muitas delas protegidas. Os remanescentes de floresta dentro das propriedades privadas não são as áreas mais prioritárias atualmente.

Não à toa, o Fundo Amazônia, gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) para captar recursos para a preservação do bioma, elegeu a criação e implementação de áreas protegidas e a modernização e eficiência de instituições como Ibama, Instituto Chico Mendes e Polícia Federal como as mais propícias à utilização dos recursos no curto prazo. De acordo com Eduardo Bandeira Mello, representante do banco, financiamento a atividades produtivas sustentáveis que se enquadrem nos propósitos do Fundo Amazônia já podem ser projetos submetidos, mas devem demorar mais a serem atendidos.

Todos na platéia escutaram de novo do governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, que é possível aumentar a produção de grãos e carne do estado sem derrubar mais nenhuma árvore. Se isso fosse levado a sério, não haveria razão para que justamente os representantes daquele estado estivessem tão engajados no Congresso para aprovar as alterações no Código Florestal Brasileiro. A legislação de 1965 proíbe o desmatamento de áreas consideradas essenciais ao suprimento de água (beira de rios, topos de morro, etc.) e estabeleceu porcentagens para que fossem mantidas áreas preservadas dentro das propriedades rurais, na Amazônia alteradas de 50% para 80% a partir de 1996.

Segundo a advogada Giselle Vieira, que coordena o Escritório de Direito Ambiental da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), as reservas legais são uma das aplicações na prática do que a Constituição Federal preconiza ao definir que o meio ambiente é um bem de todos, sujeito à preservação esteja ele dentro ou fora de áreas privadas. Elas podem ser manejadas de forma sustentável e não precisam ser consideradas áreas “perdidas” nas propriedades, aproveitáveis de maneira não-impactante, como com turismo.

Compromissos firmados e código ameaçado
Mas, em vez de tornar o Código Florestal uma ferramenta mais apropriada para garantir a conservação da natureza, as propostas do setor agropecuário abarcam, por exemplo, que áreas de preservação permanentes (APPs) desmatadas até 31 de julho de 2007 não precisem ser recuperadas, permitem ainda o plantio de espécies exóticas, e que a compensação por áreas já destruídas seja autorizada em outros estados ou biomas – o que coloca algumas áreas em avançada situação de degradação em risco de jamais serem recuperadas.

O projeto prevê ainda que os estados possam alterar os valores das medidas das APPs e a reduzir a reserva legal de 80% para 50% nas partes alteradas pelo homem e de 35% para 20% nos Cerrados dentro da Amazônia Legal. Seguindo o exemplo de Rondônia, Mato Grosso marcha na mesma direção. A cláusula consta na proposta de zoneamento que neste momento passa pela sabatina da sociedade em audiências públicas e, ao que tudo indica, não deve ser mexida.

“O código tem que se adequar a nossa realidade. Hoje ele é para ‘inglês ver’”, comentou Vicente Falcão, consultor de meio ambiente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato) e da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat). Para ele, não existe nenhuma contradição entre os esforços para alterar a legislação ambiental e o declarado interesse em receber pela manutenção das florestas preservadas. “Com o Código de hoje não estamos perdendo, estamos deixando de ganhar. Nossa briga maior é com o termo Amazônia Legal, criado para fins de financiamento. Não deveria estar sendo usado para definir questões ambientais”, opina.

Ao tentar convencer a todos sobre os mitos da presença da soja na Amazônia e justificar com a imagem de pessoas desnutridas a obrigação mato-grossense de alimentar o mundo com o grão, o representante da Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso (Aprosoja) Ricardo Arioli arrancou alguns risos incontidos dos presentes. “Vamos precisar de 40 milhões de hectares a mais para atender a demanda mundial. E nós ainda queremos preservar. Nós vamos ser pagos por isso?”, indagou.

Arioli mostrou em números a robustez da produção de soja de Mato Grosso – 8% da produção do planeta – e defendeu que hoje o proprietário rural brasileiro é penalizado ao tentar competir com fazendeiros de países como França e Estados Unidos, que não impõem as restrições ambientais que o Código Florestal Brasileiro estabelece. “Em Mato Grosso os produtores abrem mão de produzir para gerar benefícios para a sociedade”, declarou.

Faltou dizer que, só entre os produtores de soja, existem pelo menos 50 mil hectares de áreas de preservação permanentes, aquelas que por lei deveriam ser mantidas, destruídas. Ainda pelos seus cálculos, 63% do estado já estão protegidos. Os números fecham na apresentação. Mas para quem já viu o interior de Mato Grosso pelas suas longas e precárias estradas ou através de um sobrevôo pode pensar se tratar de outro lugar. Tal desrespeito à lei associado à eterna rolagem de dívidas do setor, na prática, funcionam como “subsídios” à produção agropecuária nacional.

Do ponto de vista dos ruralistas, um dos receios das propostas para pagamento por serviços ambientais é que os recursos não cheguem efetivamente nas pontas. Para Rubens Gomes, do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), o que tem que chegar não é dinheiro, mas assistência, serviços, presença do estado para ajudar a garantir a saúde das florestas. “O Fundo Amazônia deve ser um espaço para repartição de benefícios com as comunidades indígenas e tradicionais que vivem nas áreas de maior interesse à preservação”, destacou Adriana Ramos, do Instituto Socioambiental (ISA). “Não vai ser possível lidar com o mercado de carbono do ponto de vista do desmatamento ilegal, mas sim além do que a nossa legislação exige”, completou a ambientalista.

Michael Jenkings, presidente do Katoomba Group e do Forest Trends, entidades que organizaram o encontro, admitiu saber que no Brasil quase ninguém obedece às leis, mas não respondeu como garantir que tudo dará certo negociando com setores que vivem em contradição. “Os incentivos de mercados são mais fortes do que leis. Para fazer cumprir os acordos o monitoramento por satélite vai ajudar. O fato é que o mundo precisa de mais soja, mais energia. Vamos tentar fazer de Mato Grosso uma região de superserviços ambientais”, declarou.

Mas antes de passar o chapéu e exigir a conveniente ajuda estrangeira, Mato Grosso vai ter que tirar a máscara verde e mostrar em ações concretas que o estado dos latifúndios, da violência no campo, dos altos índices de incêndios e do desmatamento saberá bem onde aplicar os recursos que receber. E, em vez de vangloriar-se da “regularização” de quem infringiu a lei, constatar um dia que o boi e a soja não valem mais do que a floresta.

(Por Andreia Fanzeres, O Eco, 08/04/2009)

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