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parque nacional das emas agrotóxicos soja
2009-04-09
Plantio de transgênico a menos de 500 metros dos limites do parque e uso de agrotóxicos proibidos a menos de 2 mil metros da unidade de conservação ameaçam uma das poucas áreas de preservação de Cerrado no país

Chapadão do Céu (GO) - Uma das poucas áreas de preservação de Cerrado no país, o Parque Nacional das Emas, no Sudoeste de Goiás, é um santuário pressionado pela atividade agropecuária. Em suas fronteiras, grandes sojicultores, alguns amparados por decisões judiciais, utilizam variedades transgênicas e agrotóxicos vetados pelas normas ambientais.

O plano de manejo do parque, aprovado em 2005, permite apenas o uso de agrotóxicos de classe 4, tarja verde, em um trecho de dois mil metros a partir das fronteiras da área de preservação. Mas em outubro de 2008 uma operação do Ibama multou produtores da região e apreendeu equipamentos usados em pulverizações. Os produtores recorreram e, em fevereiro de 2009, uma liminar da Justiça Federal liberou a utilização dos agrotóxicos proibidos.

Quanto ao uso de transgênicos, a situação também preocupa. Em dezembro de 2008, pelo menos 18 produtores foram multados por cultivarem essa variedade de soja a menos de 500 metros da fronteira do parque e tiveram sua produção embargada. O plantio de transgênicos nesse limite é vetado por lei após aprovação e sanção presidencial da medida provisória 327/06.

De acordo com Marcos Cunha, funcionário do Instituto Chico Mendes (ICMBio) e chefe do parque, o Emas é considerado um parque estável, já cercado e sem grandes conflitos fundiários. Mas as dificuldades de lidar com a atividade agrícola que o circunda é permanente. "Meu papel é dialogar com os produtores, explicar o problema e buscar as soluções. Mas nem sempre é uma tarefa fácil", diz ele, que assumiu o posto em meados de 2008.

O Parque Nacional das Emas foi criado em 1961 pelo presidente Juscelino Kubitschek. Possui 131 mil hectares de rica flora e fauna, da qual se destacam emas, veados-campeiros, tamanduás-bandeira, lobos-guará e inúmeras espécies de aves e serpentes. É um exemplo da biodiversidade existente nas áreas de Cerrado, mas que continuam sob risco diante da especulação agropecuária.

Estimativas dão conta de que apenas 2,2% do Cerrado são protegidos por unidades de conservação federais e estaduais, ante 19,9% da Amazônia Legal. Além disso, até hoje esse bioma não possui sistemas dedicados de monitoramento por satélite, como acontece há anos com a Amazônia.

Histórico de ilegalidades
A norma do plano de manejo que proíbe agrotóxicos é uma das mais contestadas pelos produtores da região. Quando o plano foi aprovado, em 2005, ela não foi posta em prática imediatamente e aguardou-se a constituição de um grupo de trabalho para discuti-la. Diante da demora para uma definição, a organização não-governamental (ONG) Instituto Socioambiental (ISA) e o Ministério Público Federal (MPF) foram à Justiça Federal exigindo a aplicação da norma. Em setembro de 2008, a juíza Luciana Laurenti Gheller emitiu decisão favorável. Os produtores foram notificados, mas a fiscalização do Ibama realizada logo depois flagrou o uso de agrotóxicos proibidos.

De acordo com o sojicultor Eduardo Peixoto, também ex-prefeito de Chapadão do Céu, município considerado a "porta de entrada" do Parque das Emas, apenas com os agrotóxicos permitidos não seria possível combater a ferrugem asiática na soja. Ele mesmo alega que teria prejuízos em 1,6 mil hectares dos 1,8 mil que possui nas redondezas do parque. Além disso, Peixoto diz que a proibição não faz sentido do ponto de vista técnico. "O que nós argumentamos é que é uma burrice barrar o uso de certos defensivos com base nas classes, porque elas se referem ao efeito no ser humano, e não nas plantas e nos animais. Foi permitido na região do parque apenas o defensivo de faixa verde, mas há alguns desses que matam peixes", diz ele, que afirma preferir chamar os agrotóxicos de defensivo agrícola.

O produtor Ronan Barbosa Garcia Jr. teve um caminhão e um pulverizador apreendidos por mais de dois meses pelo grupo de fiscais do Ibama durante a fiscalização de outubro. Segundo ele, a impossibilidade de usar agrotóxicos causou prejuízos de 30% em sua lavoura próxima ao parque, por conta da ferrugem asiática. Ele possui cinco fazendas na região, onde planta 4,8 mil hectares de soja, além de milho, algodão e sorgo. "Tenho 21 anos de lavoura e sei que agricultura e meio ambiente podem conviver. Nós usamos agrotóxicos na região há 30 anos e nunca houve problema. Com faixa verde não dá pra ter produção agrícola", afirma Garcia Jr., que diz comercializar sua soja com as grandes tradings que operam na área, como Bunge, Cargill e "principalmente a ADM".

Degradação ambiental
De acordo com o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), os problemas ambientais na região do Sudoeste de Goiás não se restringem ao Parque Nacional das Emas. O engenheiro florestal Fernando Di Franco Ribeiro, chefe do Escritório Regional do Ibama de Rio Verde (GO), um dos principais municípios da região, avalia que é raro encontrar propriedades cuja reserva legal e a área de proteção permanente estejam de acordo com a legislação.

"É sinal de uma agricultura que avançou sem controle", afirma Ribeiro. Para se regularizarem, muitos produtores têm recorrido à compra de terras distantes e mais baratas para comporem a reserva legal. A lei permite que 16 pontos percentuais dos 20 de reserva possam estar localizados fora da propriedade.

O Sudoeste goiano é uma das maiores regiões sojicultoras do país. Em 2007, foram plantados 917 mil hectares, segundo o IBGE. No município de Chapadão do Céu, uma das "portas de entrada" do Emas, a área de soja tem variado entre 60 mil e 100 mil hectares desde o início da década de 90. Em 2007, o plantio foi de 82,3 mil hectares, a maior parte mantida por grandes proprietários de terra.

Preocupado com o futuro do parque, o Ibama iniciou um programa piloto na região do entorno chamado Pró-Legal. Segundo Ribeiro, o órgão tem trabalhado para identificar propriedades irregulares e notificar os produtores. "Depois, buscamos, junto com o Ministério Público Federal, que o proprietário assine um TAC [termo de ajustamento de conduta] para se regularizar", diz o chefe do Ibama.

A idéia é permitir a formação do chamado corredor de biodiversidade do Araguaia, com a conexão do Parque Nacional das Emas ao Araguaia e ao Parque do Taquari. Para que isso seja possível, a intensa atividade agrícola regional permanece como um robusto desafio.

(Por Marcel Gomes, Repórter Brasil, 07/04/2009)

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