Enquanto o Sul e Sudeste rejeitam termelétricas por questões ambientais, o Nordeste tem 40 projetos em andamentoA região Nordeste vai receber, nos próximos cinco anos, uma capacidade de geração de energia superior ao complexo do Rio Madeira, em Rondônia, e vai se tornar exportadora de energia para o resto do País. A diferença é que as usinas nordestinas serão movidas a óleo ou carvão, mais poluentes e que não encontram mais aval no Sudeste, devido ao rigor dos órgãos ambientais. Pelo menos 40 projetos, com potência total de 7,9 mil megawatts estão projetados para a região.
A quantidade de termelétricas é alvo de críticas da própria Empresa de Pesquisa Energética (EPE), estatal responsável pelo planejamento do setor. Em evento na semana passada, o presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, disse que o crescimento da energia térmica é fruto de uma visão "estranha" dos órgãos ambientais, que privilegiam usinas poluidoras em detrimento de hidrelétricas. "Em nome do meio ambiente, nunca se fez tão mal ao meio ambiente", criticou.
Na prática, essa energia suja está sendo deslocada para o Nordeste porque não é mais aceita no Sul e Sudeste, os maiores consumidores de eletricidade do País. Estados e prefeituras nordestinos, por sua vez, aceitam os projetos em busca de investimentos e empregos. "Numa região onde a busca por empregos é incessante, qualquer novo projeto é importantíssimo", diz Paulo Machado, prefeito de Senhor do Bonfim, na Bahia, que deve receber uma das novas usinas.
A Bahia, por sinal é o Estado com maior número de projetos: 16. Boa parte deles está localizada em Camaçari, próximos à Refinaria Landulpho Alves, da Petrobrás, e do complexo petroquímico da Braskem. As maiores usinas previstas, porém, estão no Ceará (térmica a carvão da MPX, com 700 MW) e no Rio Grande do Norte (usina a óleo Macaíba, de 400 MW). Todas as térmicas projetadas pela EPE têm previsão de início das operações entre 2010 e 2013.
Para o professor da Coordenação de Programas de Pós-Graduação em Engenharia (Coppe) da UFRJ e secretário executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Luiz Pinguelli Rosa, o grande número de projetos termelétricos vai na contramão do esforço para reduzir as emissões de gases do efeito estufa. A EPE calcula que, com mais térmicas na matriz energética brasileira, o sistema elétrico estará emitindo 39 milhões de toneladas de gás carbônico equivalente em 2017.
Especialistas concordam que hoje é mais fácil licenciar uma térmica a combustíveis fósseis no Nordeste do que nas regiões Sul e Sudeste. "O licenciamento de térmicas é estadual e, por isso, mais fácil de ser obtido. Há Estados que garantem até beneficio fiscal para os empreendimentos", comenta o professor Nivalde de Castro, do Grupo de Estudos do Setor Elétrico do Instituto de Economia da UFRJ (Gesel).
Do ponto de vista das emissões, o impacto local pode ser minimizado pela instalação de filtros, mas há grande preocupação com o impacto global causado pelas emissões de CO². Outro problema levantado por especialistas está na saturação da infraestrutura viária dos municípios, uma vez que o abastecimento de combustíveis para uma usina demanda pesado tráfego de caminhões.
Castro lembra ainda que a proliferação de térmicas no Nordeste cria a necessidade de reforço nas linhas de transmissão que fazem a interligação entre as regiões brasileiras. "Essas usinas não vão gerar o tempo inteiro. Então, essa nova rede de transmissão deve ficar ociosa boa parte do ano", diz o especialista, prevendo impactos na tarifa de energia de todos os brasileiros.
Alheias a essas discussões, as prefeituras esperam benefícios com a instalação dos projetos. "Esse tipo de empreendimento melhora a matriz energética do município e atrai outros investimentos, gerando empregos e desenvolvimento para a região", diz a secretária de meio ambiente de Cabo de Santo Agostinho (PE), Berenice de Andrade Lima. A cidade já tem duas térmicas a óleo operando e mais cinco em projeto.
O prefeito de Senhor do Bonfim diz que a usina projetada vai gerar entre 15 e 20 empregos. Ele admite que previa um número maior de empregos, mas mesmo assim comemora o empreendimento, que diz ser capaz de atrair empresas para o novo pólo industrial do município. "Pode ser um embrião de novos investimentos."
(Por Nicola Pamplona,
O Estado de S. Paulo, 06/04/2009)