Até 2015, valor do Fundo da Amazônia pode superar o US$ 1 bilhão, proveniente de doação da NoruegaO Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já tem em caixa US$ 110 milhões para gastar em ações que previnam ou reduzam o desmatamento amazônico. Até 2015, esse valor pode superar o US$ 1 bilhão, proveniente de doação da Noruega. E é de olho nessa montanha de dinheiro que pela primeira vez governos, organizações não-governamentais (ONGs) e iniciativa privada começam a falar o mesmo idioma.
O Fundo da Amazônia, criado a partir de doações de países, empresas e até pessoas físicas, deve permitir que a lógica da ocupação ilegal do solo amazônico e a consequente destruição da biodiversidade mude para o modelo de receber para manter a floresta em pé.
Na conferência Katoomba, encerrada nesta quinta-feira, 2, em Cuiabá, o chefe do departamento de gestão do fundo do BNDES, Eduardo Bandeira de Mello, saiu carregado de cartões de visitas. Eram produtores rurais, secretários municipais de ambiente e ONGs interessados em se aproximar do "gerente do banco amazônico". Em quase todos, surgiu a palavra REDD, embora nem todos soubessem bem o que estavam falando.
REDD é a sigla para Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação. Funciona mais ou menos assim: um poluidor do outro lado do mundo poderá compensar suas emissões comprando créditos REDD de quem ainda tem a oferecer. A Amazônia pode ofertar muitos desses créditos. E esse vai ser um dos principais instrumentos de barganha do governo brasileiro nas discussões, que ocorrerão em dezembro em Copenhague, do novo acordo climático que substituirá o protocolo de Kyoto.
"Não estamos pedindo esmola, mas um reconhecimento do esforço que a sociedade brasileira tem feito ao tomar a decisão de reduzir seu desmatamento e seguir com a matriz energética limpa", afirma Paulo Moutinho, coordenador científico do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia. "Não podemos perder a última chance de salvar a Amazônia."
O BNDES recebeu até agora 25 consultas para projetos de REDD, entendidos no sentido mais amplo. Inclui não só ações para redução de desmatamento, mas também programas que ajudem a conservar a floresta. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, por exemplo, deve ser contemplado com verba do Fundo da Amazônia para antecipar o lançamento de dois satélites de monitoramento ambiental.
No noroeste do Mato Grosso, o Instituto Centro de Vida (ICV) elabora com sete prefeituras a criação de um projeto de REDD para uma área de 8,6 milhões de hectares, onde ocorre a maior pressão pelo desmatamento. Segundo o coordenador-adjunto do ICV, Laurent Micol, é imprescindível a formação de um pacto com os municípios e produtores. "Se os produtores reduzirem seu desmatamento, mas só um deles continuar destruindo, não haverá crédito para ninguém", alerta.
Todo mundo vai ter projetos REDD", afirma Tasso Azevedo, do Serviço Florestal Brasileiro, órgão do Ministério do Meio Ambiente. A partir da próxima semana, ele vai assessorar o ministro Carlos Minc nas discussões do REDD e do Fundo Amazônia. Tasso estava na delegação brasileira na reunião do G-20, em Londres, onde surgiu um consenso mundial de que será preciso doar entre US$ 10 bilhões e US$ 15 bilhões aos países detentores de floresta tropical pelos próximos dez anos. A parte que caberá ao Brasil deverá ser direcionada para o Fundo Amazônia.
"Os Estados querem participar ativamente desse debate e não é possível que ele seja feito só pelo governo federal", cobrou o secretário de meio ambiente do Pará, Valmir Ortega. Já para a ambientalista Adriana Ramos, do Instituto Socioambiental, o Brasil saiu na frente com a criação do Fundo Amazônia. Mas ressaltou a importância de que essa enorme quantia de dinheiro chegue aos que estão preservando a floresta. "Não pode ser um método de cima para baixo, tem de ir para os projetos de seringueiros, dos indígenas, das comunidades locais."
Para o engenheiro agrônomo Ricardo Arioli, da Associação de Produtores de Soja do Mato Grosso, os produtores rurais também devem participar da partilha desses recursos. Mas questionou se no futuro, ironicamente, não serão cobrados por preservar em vez de produzir. "Seremos pagos para não aumentar a produção, mas o mundo precisa de mais alimentos. Isso é ético? Não queremos que esta outra acusação recaía sobre nós", disse.
(Por Eduardo Nunomura,
O Estado de S. Paulo, 03/04/2009)
* O repórter viajou a convite do Instituto Centro de Vida