O secretário municipal de Esportes e Lazer do Rio, Francisco de Carvalho, conhecido como Chiquinho da Mangueira, é acusado de improbidade administrativa pelo Ministério Público por ter renovado sem licitação a permissão de uso de um terreno público, numa área tombada, por uma academia de ginástica de luxo. A Estação do Corpo, que tem artistas famosos entre os cerca de 4.000 clientes, fica às margens da lagoa Rodrigo de Freitas, uma das áreas mais valorizadas do Rio.
Em 2003, quando estava à frente da Suderj (órgão do Estado responsável pelo terreno), Carvalho renovou, por dez anos, a permissão de uso da área de 18 mil metros quadrados na zona sul onde a academia está desde 1997. Para a Promotoria, pela lei de licitações, isso não pode ser feito sem licitação e com prazo definido. A 5ª Promotoria de Tutela Coletiva e Cidadania ofereceu em agosto uma ação civil pública, aceita pela Justiça, contra o secretário. Nela, pede a cassação de seus direitos políticos. Também são réus a empresa Sport 4º Centenário, responsável pela academia, e a Suderj.
Carvalho argumenta que o Estado pode retomar a área "quando quiser". A empresa diz que houve licitação em 1965, na primeira cessão do terreno, informação negada pelo secretário. A lei de licitações é de 1993. "Esta situação acarreta prejuízo à coletividade, vez que um bem público, localizado em área indubitavelmente privilegiada, dotada de beleza reconhecida mundialmente, prezado pela coletividade, vem sendo usufruído por uma pequena parcela da população", diz o Ministério Público na ação.
A Promotoria já solicitou a desocupação para "uso de uma forma menos egoísta e impessoal". A Procuradoria Geral do Estado concordou, mas a Justiça negou a pedido da academia.
Treze anos, 11 juízesA ação é a mais nova medida de um processo que se arrasta há 13 anos na 1ª Vara de Fazenda Pública, iniciado por uma ação popular proposta pelo procurador aposentado Flávio Monteiro de Carvalho. Ele queria, em 1996, impedir a construção da academia, argumentando que o espelho e o entorno da lagoa são tombados desde 1990. A ação da Promotoria foi anexada à mais antiga.
O processo já passou pela mão de ao menos 11 juízes, segundo o site do Tribunal de Justiça. Já sofreu danos até com vazamento de um bebedouro do TJ. Mas nenhuma sentença foi proferida. Sete anos após a construção, perícia do Ministério Público detectou irregularidades na obra. Segundo o laudo, a academia obstrui a vista dos pedestres para a lagoa e uma das edificações está acima do permitido (7,06 m contra 4 m autorizados).
Além disso, o Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural do Rio não aprovou, de forma definitiva, a construção na área tombada. O laudo diz que a construção foi irregular desde o início. Decreto de 1975 tornou não edificável a área em volta da lagoa, sendo tolerados imóveis já instalados ou novos com aprovação do conselho. Segundo o Ministério Público, não havia construção ali antes da lei.
A área, cedida pelo Estado em 1965, já abrigou pista de patinação e drive-in. Em 1997, "ganhou" a academia. Desde 1989, houve quatro contratos de permissão de uso, todos sem licitação. O negócio era de responsabilidade do empresário Ricardo Amaral até 2002, quando foi vendido para o empresário Nelson Tanure. A academia cobra mensalidade de R$ 218 a R$ 358.
(Por Italo Nogueira,
Folha de S. Paulo, 27/03/2009)