Em corrrespondência enviada à redação do AmbienteJá em 19 de março último, a coordenadora da Rede Virtual-Cidadã pelo Banimento do Amianto para a América Latina, engenheira Fernanda Giannasi, solicita revisão no projeto de lei do deputado Pepe Vargas (PT-RS), que prevê redução para, no máximo, seis horas semanais de exposição do trabalhador que tem contato com amianto em seu ambiente ocupacional. Reproduzimos a correspondência na íntegra:
"Caros e caras amigos gaúchos
Embora se depreenda ser o deputado Pepe Vargas (PT -RS) conhecedor do tema e ser seu relatório muito bem escrito e louvável seus argumentos em defesa do banimento do amianto, creio que há um equívoco em seu veto, tendo em vista que a redução de exposição é uma das medidas preconizadas pela Higiene Industrial enquanto não se tem uma decisão de banimento total da fibra cancerígena. Outro detalhe importante a ressaltar que mesmo após o banimento, algumas atividades de manutenção e demolição remanescerão e que precisarão ser regulamentadas e restringidas.
Acho que o ideal seria ter se feito algum tipo de gestão junto ao deputado gaúcho Pepe Vargas para que ele tivesse apresentado um substitutivo ou emenda (não sei qual é o mais adequado e permitido nesta fase de apreciação nas comissões) para que a redução da jornada fosse implementada até o total banimento da fibra cancerígena e nas atividades remanescentes (pós-banimento) de manutenção e demolição de estruturas contendo amianto.
Vocês conhecem o deputado Pepe Vargas e poderiam conversar com ele sobre isto ou pedir a ele que revisse seu veto?
Atenciosamente,
Fernanda Giannasi."
Projeto de Pepe Vargas
"COMISSÃO DE SEGURIDADE SOCIAL E FAMÍLIA
PROJETO DE LEI No 3.030, DE 2004
Acrescenta parágrafos ao art. 7º da Lei n.º 9.055, de 1º de junho de 1995, a
fim de limitar em trinta horas semanais e seis horas diárias a duração do trabalho
nas atividades e operações com asbesto/amianto.
Autor: Deputado ANTÔNIO CARLOS
MENDES THAME
Relator: Deputado PEPE VARGAS
I - RELATÓRIO
O presente projeto de lei propõe limitar em trinta horas semanais e seis horas diárias a duração do trabalho nas atividades e operações com asbesto/amianto, definindo sanção para seu descumprimento. Na exposição de motivos do projeto, argumenta-se que a exposição constante ao minério em uma jornada de 8 horas diárias leva ao
desenvolvimentos de patologias em poucos anos. No prazo regimental, não foram apresentadas emendas ao projeto.
Além desta Comissão de Seguridade Social e Família, a proposição será também encaminhada para análise de mérito à Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público. Em seguida, será apreciada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, a respeito de sua constitucionalidade, regimentalidade e juridicidade. Por ter caráter conclusivo nas comissões, dispensa a apreciação do Plenário.
II - VOTO DO RELATOR
Como já assinalado pelo eminente Autor, o asbesto, ou amianto, consiste em um grupo heterogêneo de minerais facilmente separáveis em fibras. Por apresentar potencial carcinogênico importante, o uso de qualquer de seus tipos foi abolido em vários países. Entre as patologias causadas pelo amianto, encontram-se: neoplasia maligna de estômago, laringe, brônquios e pulmões; mesotelioma da pleura, do peritônio ou do pericárdio; placas epicárdicas, pericárdicas ou pleurais; asbestose e derrame pleural.
No Brasil, a legislação vigente ainda permite a utilização do amianto do tipo crisotila, considerando-o de menor potencial patogênico. No entanto, tal argumento é bastante controverso, motivo pelo qual a discussão sobre o amianto vem ocupando posição de relevo na pauta legislativa da Câmara dos Deputados. De fato, tal problemática não preocupa apenas o âmbito legislativo, mas também o acadêmico e a própria sociedade civil, especialmente os setores mais diretamente influenciados por sua utilização. Nessa discussão, é possível identificar algumas posições díspares. Os segmentos ligados à saúde ocupacional ou pública posicionam-se favoravelmente ao banimento do produto do País, considerando os efeitos nefastos que a crisotila exerce sobre a saúde daqueles que com ela têm contato. Os setores relacionados à produção do amianto, por sua vez, tencionam apenas a regulação do seu uso, enquanto os setores que competem com a indústria do amianto buscam seu banimento, porém por razões de mercado.
Ocorre, todavia, que segundo autores importantes, a exemplo do Prof. René Mendes (UFMG), também a forma crisotila apresenta relação inequívoca com a gênese de patologias; pode gerar asbestose, câncer de pulmão e mesotelioma. Também a Agência de Proteção Ambiental (EPA), dos Estados Unidos, e a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC), da OMS a consideram substância carcinogênica. Ainda, a ACGIH (American Conference of Governmental Industrial Hygienists) classifica a crisotila como tipo A1 - carcinogênico humano confirmado -; enquanto a IARC, como grupo 1 - carcinogênico para seres humanos.
Não obstante tais dados, ainda não foi possível alcançar posição de consenso quanto à sua proibição no Brasil. Para decidir sobre a questão, foi criada, em 2004, a Comissão Interministerial do Amianto/Asbesto, cuja função era elaborar uma política nacional relativa ao amianto/asbesto. A portaria de sua criação - Portaria Interministerial n.º 8, de 19 de abril de 2004 - já assume como premissa a comprovada carcinogenicidade do amianto/asbesto em todas as suas formas e a inexistência de limites seguros de exposição. Todavia, a comissão não chegou a deliberar sua abolição. Em dezenas de países, a forma crisotila do amianto foi proibida há vários anos; o movimento de abolição do produto vem-se desenvolvendo desde a década de 80. Alguns países, entretanto, ainda mantêm sua utilização, porém com várias restrições. Nos Estados Unidos, o Limite de Exposição Permitido (LEP) pelo OSHA e o Limite de Exposição Recomendado (LER) pelo NIOSH para fibras maiores que 5 micra é de 0,1 fibra/cm³.
A legislação brasileira, por sua vez, estabelece apenas o limite de tolerância, considerando as fibras respiráveis de asbesto crisotila aquelas com diâmetro inferior a 3 micrômetros, comprimento maior que 5 micrômetros e relação entre comprimento e diâmetro superior a 3:1. O Anexo 12 da Norma Reguladora n.º 15 do Ministério do Trabalho e Emprego define tal limite em 2,0 f/cm³, bem acima do permitido em outros países. Isso posto, fica evidente que se trata de tema pulsante, de vital importância. É nesse contexto que o projeto de lei em apreço se insere, propondo redução do tempo de exposição ao produto. Em que pese a emérita preocupação do insigne Deputado Antônio Carlos Mendes Thame, não é possível afirmar que a exposição por 30 horas semanais seja segura para o trabalhador. Isso se dá por não existir definição técnica de qual limite poderia ser considerado seguro para a exposição ao amianto crisotila.
Eis, na realidade, o principal argumento para que se defenda o completo banimento deste produto do País. Quanto a isso, ressalto que a utilização do amianto crisotila é proibida em dezenas de países há vários anos; o movimento de abolição do produto vem-se desenvolvendo desde a década de 80.
Em 1996, os ilustres Deputados Eduardo Jorge e Fernando Gabeira apresentaram o Projeto de Lei 2186, que dispõe sobre a substituição progressiva da produção e da comercialização de produtos que contenham asbesto/amianto, e dá outras providências. Segundo tal propositura, a utilização do amianto crisotila deveria ser substituída até o prazo de um ano, sendo proibida a partir de então.
Em decorrência do grande número de emendas apresentadas, foi criada Comissão Especial para sua apreciação em 1999, sob a relatoria do insigne Deputado Ronaldo Caiado; foi proposto, então, um substitutivo cujo texto omite a proibição ao amianto crisotila. Tal substitutivo ainda não foi votado, pois em 2002 o nobre Deputado João Paulo Cunha apresentou recurso solicitando que fosse apreciado em Plenário. Assim, a proposição encontra-se ainda na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, aguardando deliberação desde 20 de junho de 2002.
Parece-me que o mais apropriado, quanto ao assunto, seria solicitar que a matéria fosse incluída na pauta para deliberação. Tal medida permitiria que a discussão se ampliasse, e proporcionaria a possibilidade de aprovação do projeto com o texto original. Assim sendo, considerando o comprovado efeito deletério que o amianto crisotila pode causar sobre a saúde dos trabalhadores, entendo que sua utilização deva ser proibida no Brasil. A simples restrição da jornada de trabalho não poderia ser considerada medida eficaz para a proteção do trabalhador. Dessa forma, posiciono-me pela rejeição do Projeto de Lei n.º 3.030, de 2004.
Sala da Comissão, em 21 de agosto de 2007.
Deputado Pepe Vargas (PT/RS)."
(Enviado por e-mail por Fernanda Giannasi em 19/03/2009)