Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) confirmaram nesta quinta (19/03), por 10 votos a 1, que a demarcação da terra indígena Raposa/Serra do Sol, em Roraima, deve ser contínua, com a consequente saída dos não índios da área. Apesar de o Supremo ter declarado que o cumprimento da decisão será "imediato", ficará a cargo do relator da ação, Carlos Ayres Britto, definir os prazos para a retirada dos arrozeiros.
Considerada histórica pelos próprios ministros, a decisão põe fim a uma polêmica iniciada durante o governo FHC (1994-2002), quando a área foi demarcada. A reivindicação dos índios, do uso exclusivo da terra, durava há quase 30 anos. A saída dos não índios não deverá ser imediata, apesar de Britto ter dito que a medida será "a curto prazo".
Durante o julgamento, ele chegou a propor 15 dias. Ele disse que pretende definir a data ainda hoje, após falar com o ministro Tarso Genro (Justiça) e o presidente do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) -que tem jurisdição em vários Estados, entre eles Roraima. Ficará a cargo da Justiça Federal, sob supervisão de Britto, monitorar o cumprimento da decisão.
Não se sabe o número exato de não índios na reserva. O Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), responsável por reassentar as famílias em outro local, afirma que já foram removidas 264 famílias, das quais 105 foram reassentadas. Restariam 47. A Fundação Nacional do Índio, que cuida das indenizações, afirma que 285 propriedades já foram restituídas.
O órgão diz que a mesma família pode ser dona de uma ou mais propriedades. Os rizicultores, no entanto, são cinco, donos de seis fazendas que ocupam 1,5% da reserva, localizada na fronteira entre Venezuela e Guiana.
O julgamento sobre a demarcação da Raposa começou em agosto de 2008, quando foi interrompido pelo ministro Carlos Alberto Direito. Na ocasião, o relator propôs manter a demarcação, conforme decreto do presidente Lula de 2005.
Ao retomar o debate, em dezembro, Direito acompanhou Britto, mas apresentou 18 condicionantes que deverão ser observadas em Roraima e demais reservas indígenas. Ontem, o ministro propôs outra condição, acatada pelos colegas: que Estados e municípios envolvidos sejam ouvidos durante o processo de demarcação.
Até então, segundo o ministro Gilmar Mendes, eles eram ouvidos só uma vez. O TRF-1 terá de averiguar o cumprimento das condições. Esses pontos devem ser observados pelo governo para demais processos de demarcação - há outras 22 ações sobre o tema que tramitam no STF.
O presidente da Funai, Márcio Meira, comemorou a decisão, "histórica", segundo ele, e uma vitória dos índios do país. Um dos líderes dos rizicultores, Paulo César Quartiero disse estar "desnorteado". "Acabaram com a possibilidade de Roraima ser produtiva." Segundo ele, ficou inviável produzir no Estado. "Só se for no céu. Teríamos de fazer um segundo piso, o primeiro já foi."
(Por Felipe Seligman e Lucas Ferraz,
Folha de S. Paulo, 20/03/2009)