Um dia de chuvas em São Paulo, com nuvens carregadas de vapor que veio da Amazônia, pode ser equivalente a 115 dias de consumo de água dos paulistanos. As mesmas nuvens sobre Cuiabá, no Mato Grosso, significam 32% mais chuva na cidade. Em Ribeirão Preto, o acréscimo na média anual é de 60%, e pode chover mais 40% na mineira Uberlândia. Todas as vezes que a água que evapora na floresta amazônica passa por cima de alguma cidade do Centro-Oeste ou Sudeste, o nível de precipitação aumenta entre 10% e 15%.
Esses dados são os primeiros resultados do projeto "Rios Voadores", financiado pela Petrobras e que reúne um time de pesquisadores do clima empenhados em descobrir se o desmatamento e as mudanças climáticas podem influenciar no balanço de água da região amazônica e o valor real do fluxo de vapor d'água que sai de lá e parte para outras regiões do Brasil.
Durante dois anos, o engenheiro e aviador Gerard Moss realizou 12 campanhas perseguindo "rios voadores", o nome dado para identificar correntes de ar que levam umidade de um lado para o outro do Brasil. Coletou 500 amostras de umidade das nuvens, que estão sendo analisadas por especialistas do Centro de Energia Nuclear na Agricultura, o Cena, de Piracicaba.
"Voo no Brasil há 25 anos e me surpreendo toda vez que estou em uma região onde a umidade relativa do ar é 35% e de repente entro em outra, ao lado, que tem 80%", conta Moss. "Queremos entender este movimento", diz ele. "O Brasil pode ser o país do samba e do futebol, mas é certamente o país da água", continua.
Em fevereiro de 2008, Moss fez um voo ideal perseguindo um rio voador que saiu de Belém e veio dar em São Paulo. A viagem levou oito dias. A vazão do "rio voador", que estava sobre São Paulo em 10 de fevereiro de 2008, era de 3.200 m3 ou 27 vezes a vazão média do Tietê. A origem das chuvas que caem no Sudeste nem sempre tem a ver com a evaporação da Amazônia, mas este elo parece ser muito importante, segundo demonstra o projeto. O pesquisador Pedro Dias, lembra, por exemplo, que é a chuva que cai em Minas que alimenta o rio São Francisco - e os "rios voadores" passam por ali.
(Por Daniela Chiaretti,
Valor Econômico, 19/03/2009)