A Sabesp, estatal paulista responsável pelos serviços de água e esgoto em 365 das 645 cidades do Estado, entrou no bilionário mercado de lixo. A empresa, vinculada à administração José Serra (PSDB), assinou neste mês um protocolo de intenções para implantar e operar o aterro sanitário de São João da Boa Vista e fará o mesmo hoje com Itapecerica da Serra (Grande São Paulo). A expectativa é que inicie o serviço nos próximos 90 dias.
Essas duas cidades -ambas geridas pelo PMDB, são o primeiro passo para a Sabesp atuar nos serviços de lixo não só em São Paulo mas também em outros Estados e países. Para isso, a Sabesp alterou seu estatuto com base na lei estadual 1.025/07, que criou a Agência de Regulação dos Serviços de Saneamento e Energia e autoriza sua participação nos mercados de "drenagem, serviços de limpeza urbana (coleta, por exemplo), manejo de resíduos sólidos e energia".
O presidente da Sabesp, Gesner Oliveira, diz que está em estudo uma relação de cidades em que a empresa poderá participar de licitações do lixo, inclusive em parcerias. Segundo ele, essas mudanças não têm o objetivo nem abrem caminho para privatização. "Ao contrário. Isso fortalece a empresa."
Falta de terrenosA falta de áreas para a construção de aterros é um problema sério em várias regiões. Para o prefeito de Itapecerica, Jorge Costa (PMDB), a Sabesp, por ser uma estatal, terá mais condições políticas para negociar a construção de aterros regionais, com várias prefeituras.
Ele diz que a ideia é operar um aterro que atenderá, além de Itapecerica, outras cinco cidades (Taboão da Serra, Embu-Guaçu, Embu, São Lourenço e Juquitiba). "A despesa [R$ 240 mil/mês] cairá pela metade. Hoje levamos o lixo para um particular a 54 km daqui."
O prefeito de São João, Nelson Mancini (PMDB), afirma que propôs à Sabesp para que ela assumisse o aterro ainda em 2005, dentro da negociação de renovação do contrato do abastecimento de água da cidade. "Tenho ojeriza à terceirização. Mesmo tendo participação privada, a Sabesp ainda é estatal e seu objetivo não é estritamente a obtenção do lucro." Somente o Estado de São Paulo produz por dia cerca de 40 mil toneladas de lixo, conforme dados da ABLP (Associação Brasileira de Resíduos Sólidos e Limpeza Pública). Trata-se de um mercado dominado por grandes empreiteiras e no qual não são raras denúncias de corrupção.
A cidade de São Paulo, maior geradora de resíduos do país, com 15 mil toneladas diárias, despende por mês R$ 41 milhões em coleta e destinação final do lixo e outros R$ 25 milhões com a varrição, contrato que inclui a lavagem de calçadas, conforme a prefeitura. São R$ 792 milhões/ano.
Informada pela Folha dos planos da Sabesp para o setor, a diretoria da ABLP disse que não poderia comentar o assunto ontem porque não tinha detalhes do projeto, mas vai colocar o caso em discussão. O promotor de Ribeirão Preto Aroldo Costa Filho, que participou da investigação de uma suposta máfia do lixo no interior de São Paulo, disse considerar positiva a participação da Sabesp nesse mercado. "Isso diminui as chances de uma eventual fraude nas licitações e a fiscalização de uma empresa pública é muito mais fácil."
Já o líder da oposição na Assembleia, Enio Tatto (PT), critica a expansão da empresa. "A Sabesp não faz nem o que deveria fazer, que é cuidar do abastecimento de água e do tratamento do esgoto. Não sou contra a empresa entrar em novos negócios, mas precisa primeiro resolver o que deveria ser a sua prioridade."
A iniciativa da Sabesp também coincide com um avanço na fiscalização dos aterros sanitários do Estado pela Cetesb (agência ambiental paulista), órgão ligado à Secretaria de Estado do Meio Ambiente. O próprio aterro municipal de Itapecerica da Serra foi fechado em 2008 pela Cetesb e, por isso, a prefeitura teve de contratar um aterro particular. Serra participará hoje da assinatura do protocolo que transfere para a Sabesp o aterro de Itapecerica.
(Por Rogério Pagnan e José Ernesto Credendio,
Folha de S. Paulo, 17/03/2009)