Apontado como responsável pela morte de 86 toneladas de peixes no Sinos recebeu pena de 30 anos
Pela primeira vez no País a Justiça condena a uma pena expressiva de 30 anos um acusado de cometer crimes exclusivamente ambientais. Na tarde de ontem, o juiz da comarca de Estância Velha, Nilton Filomena, sentenciou o ex-responsável técnico e diretor da União dos Trabalhadores em Resíduos Especiais e Saneamento Ambiental (Utresa), Luiz Ruppenthal, a 18 anos de prisão em regime fechado e 12 em semi-aberto. Ruppenthal é apontado pela Justiça como o responsável pela morte de 86 toneladas de peixes no Rio dos Sinos, em outubro de 2006.
Apesar da sentença proferida, ele permanece em liberdade até que se esgotem todos os recursos possíveis. Isso graças ao habeas-corpus concedido pelo Supremo Tribunal Federal, em 20 de novembro de 2007. Enquanto o Ministério Público (MP) define a decisão como uma vitória na área ambiental, a defesa do engenheiro químico a considera absurda e diz que recorrerá até a última instância. Ruppenthal deve ser intimado hoje ou no máximo até segunda-feira para audiência com Filomena, para receber oficialmente a sentença. O juiz não quis se manifestar sobre o processo.
Após 29 meses do desastre ambiental que chocou o Estado e teve repercussão nacional, o anúncio da condenação de Ruppenthal é visto como uma conquista expressiva, pelo promotor de Justiça de Estância Velha, Paulo Eduardo de Almeida Vieira. "Abre um precedente importantíssimo no que diz respeito aos crimes ambientais no Brasil", aposta Vieira, que trabalhou nas investigações e apresentou a denúncia dos 20 crimes. O MP apresentou mais uma denúncia de outros 30 crimes contra Utresa e Ruppenthal, em maio de 2007. Todos são referentes a irregularidades encontradas na Utresa durante a intervenção judicial. O processo está em andamento.
O advogado de defesa de Ruppenthal, Nereu Lima, disse não acreditar que a pena se sustente no Tribunal de Justiça e avisou que ingressará com apelação assim que receber a intimação. "Em crimes hediondos, quando o réu é primário, as sentenças ficam abaixo de 20 anos. É totalmente injusto e desproporcional", analisou.
Sentença diz que Ruppenthal valeu-se da confiança de entidades
A sentença proferida pelo juiz Nilton Filomena tem 101 páginas, mais quais apresenta, entre os argumentos para a condenação, que a Utresa e Ruppenthal devem ser penalizados pela mortandade, diante do que definiu como "contundente prova da relação de concausalidade entre os efluentes clandestinamente lançados nos recursos hídricos e a asfixia dos peixes." Afirma ainda que uppenthal "agiu motivado pela possibilidade de ganho fácil, utilizando-se de uma fachada de OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) para angariar confiança, tanto do setor produtivo que encaminhava os resíduos à Utresa, como da própria fiscalização ambiental, quiçá comovida com os argumentos de inexistência de intenção de lucro."
Após receber o anúncio da condenação na audiência com o juiz, o advogado do réu, Nereu Lima tem, o prazo de cinco dias para entrar com recurso na comarca estanciense. Resta ainda apelação no Tribunal de Justiça do Estado e no Supremo Tribunal Federal.
A Utresa passa por total reformulação desde sua intervenção, coordenada pelo biólogo Jackson Müller e o engenheiro civil Heraldo Finger. Em novembro de 2007 a intervenção foi renovada por mais três anos. A reportagem do Jornal NH esteve na casa de Ruppenthal, em Estância Velha, mas familiares informaram que ele não moraria mais na cidade.
Entenda o caso
7 de outubro de 2006 - Localizados os primeiros cardumes de peixes mortos, de um total de 86 toneladas, em um trecho de 12 quilômetros do Rio dos Sinos
20 e 23 de outubro de 2006 - Após denúncias, o Ministério Público (MP) de Estância Velha faz diligências nas proximidades da Utresa, onde encontra saídas clandestinas de chorume para os Arroios Portão e Cascalho (que desembocam no Sinos)
28 de novembro de 2006 - Juiz da comarca de Estância Velha, Nilton Filomena, determina a intervenção da Utresa e decreta a prisão preventiva de Ruppenthal, que é considerado foragido
29 de novembro de 2006 - Começam as mudanças na Utresa para corrigir irregularidades
15 de dezembro de 2006 - MP de Estância Velha apresenta à Justiça denúncia de 20 crimes ambientais que teriam sido causados por Ruppenthal e Utresa
28 dezembro 2006 - O titular da 1ª DP de Sapucaia do Sul, Leonel Baldasso, entrega no Foro da cidade o inquérito policial da mortandade. Foram indiciadas 18 pessoas por crimes ambientais, entre elas, diretores e responsáveis técnicos de seis empresas autuadas pela Fepam em 19 de outubro de 2006 e dois fiscais da própria Fepam, por negligência no licensiamento da Utresa
25 de janeiro de 2007 - TJ gaúcho nega por unanimidade o habeas-corpus para Luiz Ruppenthal
19 de março de 2007 - Justiça de Estância Velha determina que cinco empresas envolvidas na mortandade paguem como indenização um salário mínimo a cada uma das 765 famílias da Colônia de Pescadores Z-5
3 de maio de 2007 - O Ministério Público apresenta denúncia de novos 30 crimes contra Utresa e Ruppenthal (23 contra Utresa e 30 contra Ruppenthal)
19 de outubro de 2007 - STF concede habeas-corpus em caráter liminar a Ruppenthal e em 20 de novembro Ruppenthal se apresenta à Justiça
12 de março de 2009 - Filomena condena Ruppenthal a 30 anos de prisão, 18 deles de detenção no presídio de Montenegro e 12 de reclusão no presídio de Novo Hamburgo (semi-aberto)
(Jornal NH, 13/03/2009)