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Rio de Janeiro jacarés urbanização desordenada
2009-03-11
Os moradores do Recreio, bairro da zona oeste do Rio de Janeiro, já quase não se surpreendem ao ver um jacaré interromper o trânsito ou zanzar em suas piscinas. Quem não se acostumou a que cada vez mais pessoas invadam seus pântanos e lagoas são esses répteis. “Vimos um enorme atravessando a rua e tivemos de parar o carro”, conta espantado um morador. A presença de jacarés (família Alligatoridae), outrora donos e senhores deste território, é cada vez mais frequente na cidade, assim como a de muitos outros animais da floresta nativa.

A organização não-governamental SOS Mata Atlântica atribui a estes e outros répteis uma “extrema importância para o equilíbrio natural, porque controlam a população de insetos e outros invertebrados”. Nas áreas inundadas que eram seus lares de procriação, os jacarés hoje convivem com o lixo jogado pelas pessoas e os esgotos. E sobrevivem com o fruto de sua própria pesca, ou com os pedaços de carne que alguns jogam às suas mandíbulas sempre alertas.

Denise Monsores, administradora do Parque Chico Mendes, que protege estas e outras espécies nativas, explica que a explosão imobiliária da última década no Recreio limitou o habitat dos jacarés. Encurralados, começaram a vagar pelo asfalto. Este Parque é praticamente o único reduto livre de seres humanos que lhes resta. Monsores atribui o problema ao desordenado crescimento urbano. Para construir o Recreio, pântanos e zonas inundadas,onde viviam os jacarés e outras espécies, foram drenados ou usados como depósitos do esgoto dos edifícios.

As capivaras (Hydrochoerus hydrochaeris) também foram expulsas de seu meio original e costumam aparecer em lagoas ou praias da elegante zona sul da cidade, para alvoroço dos banhistas. A cultura carnavalesca carioca captou o fenômeno. Uma capivara perdida inspirou o nome de uma banda. O bloco A Capivara Ensaboada (em alusão ao animal que escorregava das mãos dos bombeiros que tentavam devolvê-lo ao seu habitat) compôs um samba em sua homenagem.

Afastando-se da Floresta da Tijuca, a enorme jibóia (Boa constrictor constrictor), branca e vermelha, começou a aparecer mais do que o desejado em meios urbanos. No final de 2008, moradores da favela do Borel chamaram especialistas do Parque Nacional da Tijuca por causa de “jibóias em abundância”, recordou o chefe dessa reserva, Ricardo Calmon. Assim descobriram o que atraía as serpentes: o crescente número de ratos, que por sua vez proliferam no lixo acumulado.

O Rio de Janeiro convive com uma das maiores florestas urbanas do mundo: a Mata Atlântica, que se estende por 17 Estados e é generosa em fontes hídricas, flora e fauna. Tem 1.020 espécies de aves, 350 de peixes, 340 de anfíbios, 251 de mamíferos e 197 de répteis, segundo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). Embora ocupe 1,3 milhão de quilômetros quadrados – cerca de 15% do país – conserva apenas 7% de seu tamanho original.

As regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro e Vitória desmataram 793 hectares, segundo o Atlas dos Remanescentes Florestais da Floresta Atlântica 2005-2008, da SOS Mata Atlântica e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Nos Estados da Mata Atlântica vivem 62% da população, aproximadamente 110 milhões de pessoas, que destroem as próprias florestas que precisam para garantir “o abastecimento de água, a regulação do clima e a fertilidade do solo, entre outros benefícios ambientais”, afirma a SOS Mata Atlântica.

Nesta área, as atividades humanas, a especulação imobiliária, a caça e a pesca, a extensão agropecuária e o mau planejamento urbano ameaçam 383 espécies animais, das 633 em perigo no país. Algumas têm maior capacidade de adaptação e convivência com o ser humano, segundo o biólogo Mario Moscatelli, titular da cadeira de Administração de Ecossistemas do Centro Universitário da Cidade.

Os macacos fazem acrobacias nas sacadas das casas vizinhas à Floresta da Tijuca, para comer ou roubar frutas deixadas pelos moradores. Os jacarés nadam em meio ao lixo com uma garrafa de plástico sobre a cabeça. Os abutres vigiam a estrada do alto dos postes de iluminação, à espera de algum animal atropelado pelos automóveis. Outros, como o guará (Eudocimus ruber), uma ave que quase desapareceu do Rio de Janeiro, “são mais delicados e, como não resistem ao contato com as pessoas e sua produção de lixo e esgoto, partem ou morrem”, acrescentou. “Os animais não invadem a cidade. Na realidade, a cidade está invadindo os últimos fragmentos de mangues, zonas inundadas, florestas”, um processo que “após 500 anos mostra uma nova etapa de ocupação”, acrescentou Moscatelli.

No zoológico municipal, os veterinários conhecem as consequências desse processo. “As entidades de captura trazem para cá todos os animais originários de nossas florestas”, contou Vitor Hugo Mesquita, diretor técnico do Zoológico. “É muito comum trazerem macacos, jibóias, jacarés, bichos-preguiça, doninhas e diversas espécies de mamíferos”, disse. Paradoxalmente, algumas espécies protegidas por novas e rigorosas leis se salvaram da extinção e começam a se tornar uma praga. Segundo Calmon, algumas espécies de primatas hoje são alvo de planos de esterilização.

“Como fruto desse desequilíbrio do ecossistema e da falta de um predador natural como a onça-pintada (Panthera onca), que vivia na floresta, algumas espécies começam a superpovoar a área. Pelo fato de a floresta estar cercada pela cidade, não existe uma escala suficiente para que sobrevivam outras espécies da cadeia alimentar”, explicou o chefe do Parque da Tijuca. Moscatelli prefere não chamar de “praga” os animais, mas o ser humano, que “desordenou toda a cadeia alimentar”.

É necessária uma “redistribuição da população de animais em outras áreas” para que “não criem problemas no meio urbano”, propõe Moscatelli. As espécies silvestres podem espalhar doenças, como a raiva ou a febre maculosa transmitida pelo carrapato, ou podem agredir as pessoas, como os jacarés, para defender seus filhotes.

(Por Fabiana Frayssinet, Terramérica, Envolverde, 09/03/2009)

* A autora é correspondente da IPS. Este artigo faz parte de uma série produzida pela IPS (Inter Press Service) e pela IFEJ (Federação Internacional de Jornalistas Ambientais) para a Aliança de Comunicadores para o Desenvolvimento Sustentável (www.complusalliance.org)

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