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via campesina passivos do agronegócio
2009-03-11

No segundo dia de mobilizações em torno da Jornada das Mulheres da Via Campesina, uma comissão de agricultoras foi recebida em Brasília pelo Diretor-Geral da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura), Jacques Diouf. No encontro, Diouf ouviu um relato das ações que as camponesas realizam nesta semana para denunciar a prioridade do governo ao agronegócio e às empresas transnacionais do setor exportador, especialmente da agricultura, enquanto deixa em segundo plano os trabalhadores rurais, a produção de alimentos e a Reforma Agrária.

O dirigente da FAO afirmou que a ONU defende as mesmas proposições da Via Campesina e que sua luta é “justa e necessária”, e relacionou a atuação do agronegócio no campo brasileiro ao aumento da fome. Para Diouf, o Estado deve financiar a pequena agricultura, uma vez que a “agricultura empresarial tem plenas condições de se sustentar”. Diouf ressaltou, ainda, que a realização da Reforma Agrária, a limitação da propriedade da terra e a atualização dos índices de produtividade são condições para o fim da fome no Brasil. “Um país só tem soberania e desenvolvimento se nele houver terra para produzir alimento”, afirmou.

Também em Brasília, um grupo de cerca de 350 mulheres, integrantes de movimentos sociais urbanos e da Via Campesina, realizaram uma vigília em frente ao prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) para protestar contra a recente ofensiva da direita contra os movimentos sociais. “A Justiça deveria prender os assassinos dos mais de 1.500 trabalhadores e trabalhadoras rurais mortos na última década, em vez de criminalizar nossas companheiras Sem Terra, que lutam pelo justo direito à reforma agrária, que lutam pela vida”, afirmou Isabel Freitas, integrante da Marcha Mundial de Mulheres. Durante a vigília, as mulheres depositaram faixas de protesto na estátua que simboliza a Justiça. No Senado Federal, outro grupo de mulheres da Via Campesina participaram do lançamento da Aliança Camponesa Ambientalista em Defesa da Reforma Agrária e do Meio Ambiente, ao lado de pastorais sociais/CNBB e organizações ambientalistas.

Novos protestos e repressão
As mulheres da Via Campesina seguem com as mobilizações e atividades em torno do Dia Internacional da Mulher por um modelo agrícola baseado na pequena agricultura, através da realização da reforma agrária, e por uma política econômica voltada para a geração de empregos para a população. Hoje (10/03), foram realizados novos protestos em Pernambuco e no Pará. No Rio Grande do Sul e em São Paulo, as mulheres sofreram ameaças e repressão.

Em Pernambuco, cerca de 700 mulheres ocuparam na manhã de hoje (10/03) as sedes da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco) nas cidades de Petrolina e Petrolândia (PE), para protestar contra o avanço do agronegócio na região através dos grandes projetos de irrigação que vêm sendo implantados pela Codevasf na região do Sertão do São Francisco.

”O Governo federal, através da Codevasf, está investindo milhões em está investindo milhões de reais em projetos como a transposição do Rio São Francisco, o Pontal Sul e o Canal do Sertão, para a construção de infra-estrutura de irrigação voltada para o agronegócio. Esses projetos desalojam centenas de pequenos agricultores e agricultoras, camponeses que vivem em assentamentos da Reforma Agrária à beira do Rio São Francisco não possuem nenhum sistema de irrigação para suas lavouras, e não há nenhum investimento público para a construção de tais sistemas”, denunciam as pernambucanas.

No Pará, 250 mulheres realizaram estudos sobre soberania alimentar, questão agrária e a violência no estado no acampamento Helenira Rezende, na Fazenda Cedro, município de Marabá. A fazenda, ocupada desde 1 de março, pertence ao banqueiro Daniel Dantas e possui criação ostensiva de gado de exportação, um dos principais motivos da destruição da floresta e da biodiversidade local. A área era uma reserva de castanha-do-pará, cuja concessão para a extração havia sido dada aos membros da família Mutran - conhecidos na região pela sua truculência e como os maiores e mais poderosos latifundiários do estado – por meio do aforamento. As castanheiras foram derrubadas para dar lugar ao pasto e assim, a fazenda foi vendida a Dantas por R$ 85 milhões. No final de janeiro, a Justiça bloqueou cerca de 10 mil hectares a pedido do Governo do Pará.

As mulheres denunciam ainda a ilegalidade de todas as 49 fazendas adquiridas por Daniel Dantas em 11 municípios, muitas com suspeitas de grilagem e ocorrências de trabalho escravo. A Polícia Federal suspeita que este investimento em gado seja feito para lavagem de dinheiro. Dantas também é investigado pelo Ministério Público e PF por corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha pela Operação Satiagraha.

Na manhã desta terça-feira (10/03), pelotões da Brigada Militar do Rio Grande do Sul reprimiram violentamente as 700 mulheres da Via Campesina que estavam acampadas na Fazenda Ana Paula, da Votorantim Celulose e Papel (VCP), em Candiota. As camponesas foram revistadas, cercadas pelo Batalhão de Operações Especiais (BOE) e tiveram seus pertences destruídos. Elas saíram da área e exigem a libertação de seis mulheres detidas e de um padre que apoiava a atividade. Mais uma vez, as mulheres denunciam a ação truculenta da Brigada Militar contra os movimentos sociais no Rio Grande do Sul. “Mulheres e crianças são novamente alvo da violência da polícia naquele estado, cujo governo defende os interesses de empresas que degradam o meio ambiente, expulsam o camponês e não geram emprego”, afirma Marina dos Santos, da coordenação da Via Campesina.

Em São Paulo, também pela manhã de hoje, oficiais de justiça acompanhados de um representante da Cosan (a maior usina de açúcar e etanol do mundo em capacidade de moagem de cana, símbolo do setor sucroalcooleiro) tentaram entregar uma reintegração de posse às mulheres que ocupam desde ontem uma área da empresa no município de Barra Bonita, em São Paulo. Calados, os oficiais deixaram que o representante da Cosan tomasse a frente da entrega do documento. Ele ameaçou utilizar violência policial para retirar as cerca de 600 mulheres e 40 crianças que estão no local. Seguranças privados armados e sem identificação rondam o acampamento com motos e carros na intenção de intimidar as mulheres. Em assembléia realizada pela manhã, as mulheres decidiram permanecer no local e continuar o corte da cana para a ampliação do acampamento.

Em Alagoas, cerca de 1500 mulheres ocuparam ontem (09/03) a fazenda Campo Verde (a 65 km de Maceió, no município de Branquinha), para exigir sua vistoria pelos órgãos governamentais e a consequente desapropriação das terras. O usineiro e ex-deputado federal João Lyra, dono da fazenda, recebeu no ano passado notificação por prática de trabalho escravo, quando 61 trabalhadores foram libertados por um grupo móvel do Ministério do Trabalho.

A dominação fundiária da monocultura da cana-de-açúcar gera em Alagoas uma brutal concentração de terras e riquezas, produzindo miséria, exploração da classe trabalhadora e degradação ambiental.Ainda esta semana, será protocolado um pedido oficial ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) de vistoria e desapropriação da área.

Ontem foram realizados protestos em outros sete estados (Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Espírito Santo, São Paulo, Rio Grande do Sul e Paraná) e em Brasília.

Existem no Brasil 130 mil famílias acampadas e mais de quatro milhões de famílias sem-terra. “A realização da Reforma Agrária e a consolidação de um novo modelo agrícola dependem da derrota do modelo econômico vigente. A oferta de crédito rural do governo federal para a agricultura empresarial nesta safra (2008/09) é de R$ 65 bilhões e de apenas R$ 13 bilhões para a agricultura familiar, com isenção dos impostos de exportação. Exportar somente matéria-prima não desenvolve o país, nem distribui renda”, afirma Itelvina Masioli, integrante da Via Campesina.

(MST, 10/03/2009)


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