Falar sobre o clima não é sinônimo de falta de assunto para o engenheiro agrícola Eduardo Delgado Assad, de 51 anos — ao contrário. Ele está à frente de algumas das mais relevantes pesquisas sobre efeitos de mudanças climáticas na produção de alimentos do país. Na chefia da Embrapa Informática Agropecuária, Assad coordena 24 projetos, que envolvem 70 profissionais. Algumas das pesquisas causam calafrios. É o caso do estudo feito em parceria com especialistas da Unicamp que relata impactos do aquecimento global em plantações nos próximos 100 anos: prejuízos acima de 7 bilhões de reais nas safras de 2020, áreas férteis que se tornam estéreis e loucuras climáticas capazes de fazer a mandioca sumir do Nordeste e aparecer no Sul. Do seu escritório, na Unicamp, no interior de São Paulo, Assad conversou com a INFO.
Qual é a tecnologia usada para estudar o impacto do aquecimento global na produção agrícola?ASSAD - Usamos a tecnologia de zoneamento agrícola de riscos climáticos. É um sistema desenvolvido pela Embrapa e outras instituições que informa o nível de risco de 5 600 municípios para várias culturas. Foram aplicadas a esse zoneamento projeções de aumento de temperatura que consideram as emissões de gases de efeito estufa. Adotou-se um cenário pessimista, com aumentos de temperatura entre 2°C e 5,4ºC até 2100, e outro mais otimista, com aumentos entre 1,4°C e 3,8ºC. Com esses dados, o CPTEC (Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos) simulou cenários climáticos em 2010, 2020, 2050 e 2070.
Como se chegam a esses resultados?Usamos modelagem matemática e simulações para calcular o impacto do aquecimento e as perdas econômicas nas culturas de café, algodão, arroz, cana-de-açúcar, feijão, girassol, mandioca, milho e soja. Foram anos de ajustes e validações de sistemas e equações. Usamos 25 computadores que funcionaram quatro meses sem parar. Estamos evoluindo para colocar tudo isso em um supercomputador
Em que etapa do projeto vocês estão atualmente?Agora que temos as projeções e o impacto econômico, estamos concluindo a fase de redação de relatórios que mostram quanto custa e quanto tempo leva para fazer modifi cações genéticas em uma planta, de forma que ela suporte o aumento de temperatura. O Brasil acumula grande conhecimento tecnológico em agricultura tropical e pode adotar soluções que mitiguem os efeitos do aquecimento. Já temos mistura de café mais resistente ao aumento de temperatura, por exemplo.
Que instituições estão envolvidas nesse estudo?O projeto envolve uma rede integrada com 25 instituições de pesquisa, 70 pesquisadores e 12 bolsistas. Começou focando algumas culturas e agora são 41, crescendo junto com a carteira de produtos cultivados no Brasil.
Que tipo de ferramentas vocês oferecem para os agricultores?Uma delas é o software de diagnose virtual, para que os agricultores identifiquem doenças de sua plantação via web. Os produtores rurais entram com os sintomas que ocorrem na sua lavoura, para identificar as medidas de controle. Já dá para fazer o diagnóstico online de doenças do milho.
Ainda neste ano, haverá informações sobre feijão, trigo, soja, tomate e pimentão. Futuramente, o acesso poderá ser feito por celulares e palmtops.
A população tem acesso à produção científica da Embrapa?Sim, ela está depositada no Repositório Digital Embrapa, que oferece quase 500 mil títulos sobre pesquisa em agricultura.
São textos integrais dos trabalhos técnico-científicos feitos da Embrapa.
Qual a importância do software livre na Embrapa?Por ser pública, a Embrapa deve pesquisar, testar e difundir o uso do software livre na agricultura. O nosso Repositório Digital Embrapa é um software livre, assim como os aplicativos usados nos escritórios. Mas não queremos ser vistos apenas como fazedores de software. O essencial é organizar e disponibilizar a informação para pesquisadores, produtores e público em geral.
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Revista Info Exame, 10/03/2009)