Poucos debates no Brasil são tão controversos, erráticos e destituídos de objetividade quanto o da conservação da Amazônia. As matas ardem ao ritmo de 500 quilômetros quadrados a cada mês. Mas o país não consegue formular um plano factível que contenha o avanço da exploração predatória e, ao mesmo tempo, permita o desenvolvimento sustentável da região, uma área equivalente à metade do território brasileiro. Preservar a maior floresta do planeta, contudo, é uma meta perfeitamente alcançável, de acordo com um estudo minucioso que acaba de ser concluído por uma das mais respeitadas consultorias do mundo, a McKinsey.
O trabalho estima em 17 bilhões de reais ao ano o volume de investimentos necessário para preservar a floresta ao longo de duas décadas. Tais recursos não são extravagantes: representam pouco mais de 1% dos impostos arrecadados no Brasil; ou que o gasto anual com o Bolsa Família, de 12 bilhões de reais; ou a metade do déficit nas contas da Previdência em 2008.
A McKinsey chegou a esse cálculo dentro de um estudo mais amplo, sobre as oportunidades e os custos de reduzir, no Brasil, as emissões dos gases que provocam o efeito estufa, a principal causa do aquecimento global. A consultoria fez a mesma investigação em outras vinte regiões, abrangendo todo o globo, na mais detalhada iniciativa sobre o assunto. As queimadas na Amazônia significam mais da metade dos 2,1 bilhões de toneladas de CO2 que o Brasil lança na atmosfera a cada ano, deixando o país num constrangedor posto de quarto maior emissor do planeta – atrás apenas da China, dos Estados Unidos e da Indonésia.
Conter a devastação da floresta, portanto, é a maior contribuição que o país poderia dar no combate ao aquecimento global. Os consultores definiram propostas específicas para cada uma das atividades exploratórias. "O desafio para a Amazônia não está simplesmente em deter o desmatamento. É preciso incentivar o desenvolvimento de atividades formais, para dar emprego àqueles que hoje vivem da exploração predatória e também elevar o padrão de vida dos 25 milhões de pessoas que habitam a região", afirma Stefan Matzinger, diretor da McKinsey e coordenador do trabalho.
O estudo "Uma economia de baixas emissões de carbono para o Brasil" será apresentado na quinta-feira 12 no ciclo de debates do Planeta Sustentável, promovido pela Editora Abril. Depois, estará disponível gratuitamente no site da consultoria.
No plano de cinco frentes de atuação proposto pela McKinsey, os dois requisitos essenciais são regularizar as propriedades rurais e aprimorar a vigilância (veja quadro). Hoje, menos de 10% das terras têm posse definida. O Brasil possui hoje 3 600 guardas florestais. Precisaria chegar ao menos a 10 000, seguindo parâmetros internacionais. Ainda que a preservação da Amazônia seja o foco do trabalho da McKinsey, o estudo apresenta também a análise de como o Brasil poderá reduzir a emissão de gases do efeito estufa em outras atividades econômicas. Um exemplo disso é a agropecuária.
O maior problema aqui é o metano emitido pelo rebanho bovino. Produzido por bactérias que participam do processo digestivo do gado, o metano, ao ser liberado na atmosfera, é vinte vezes mais poderoso que o CO2 no acirramento do efeito estufa. A solução, aponta a McKinsey, seria reduzir o ciclo de vida do gado, elevando a produtividade, e incentivar o uso de medicamentos especiais.
Ao todo, a consultoria define com clareza 200 oportunidades para o Brasil reduzir a emissão desses gases nos mais relevantes setores econômicos – e aponta o custo de cada uma delas. Se todas forem adotadas, calcula o estudo da McKinsey, o país diminuirá em mais da metade o seu nível atual de emissões. Trata-se de uma contribuição valiosa.
(Por Giuliano Guandalini, Veja,
Planeta Sustentável, 09/03/2009)