A Amazônia é mais sensível à seca do que se acreditava, segundo uma nova pesquisa conduzida na maior floresta tropical do mundo. O estudo, publicado na edição desta sexta-feira (6/3) da revista Science, apresenta a primeira evidência sólida de que episódios de seca causam perdas massivas de carbono em florestas tropicais, principalmente por meio da mortalidade de árvores.
“Durante anos, a Amazônia tem ajudado a reduzir a velocidade das mudanças climáticas, mas confiar nesse ‘subsídio’ da natureza é extremamente perigoso”, disse Oliver Phillips, professor da Universidade de Leeds, no Reino Unido, que coordenou o estudo.
Participaram da pesquisa diversos países, entre os quais o Brasil, representado por cientistas que integram o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, o Museu Paraense Emílio Goeldi, o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, a Universidade Federal do Acre e a Universidade de Oxford.
“Se o sequestro de carbono realizado pelo planeta diminuir, ou se, em vez de sequestrar carbono as áreas de florestas emitirem, os níveis de dióxido de carbono aumentarão em uma velocidade maior. Por isso, cortes profundos nas emissões de carbono serão necessários para estabilizar o clima”, destacou Phillips.
O estudo, uma colaboração international entre mais de 40 instuições, teve como base a extraordinária seca que afetou a Amazônia em 2005. O episódio ofereceu aos cientistas uma ideia dos efeitos das futuras mudanças climáticas na Amazônia. Estima-se que o aquecimento das águas do Atlântico Norte possa fazer com que a estação seca na Amazônia se torne mais intensa e mais quente.
A seca inverteu drasticamente o processo de absorção de carbono que ocorria há décadas, quando a Amazônia contribuía para diminuir os efeitos das mudanças climáticas.
Normalmente, a floresta absorve quase 2 bihões de toneladas de dióxido de carbono por ano, mas a seca em 2005 causou perda de mais de 3 bilhões de toneladas.
“Visualmente, a maior parte da floresta parecia pouco afetada pela seca, mas nossos dados mostram que a taxa de mortalidade de árvores aumentou. Devido à imensa dimensão da região amazônica, mesmo uma pequena alteração ecológica pode provocar um grande impacto no ciclo global do carbono”, disse Phillips.
“Algumas espécies de árvores, incluindo palmeiras importantes, foram especialmente afetadas, mostrando que a seca ameaça também a biodiversidade”, disse Abel Monteagudo, do Jardim Botânico de Missouri, em Oxapampa, no Peru, outro autor da pesquisa.
O estudo envolveu 68 cientistas de 13 países que trabalham na Rede Amazônica de Inventários Florestais (Rainfor), iniciativa internacional de pesquisa que se dedica ao monitoramento das florestas ao longo de toda a região. A rede é coordenada pelas universidades de Leeds e de Oxford, no Reino Unido.
Para calcular mudanças no estoque de carbono, os cientistas examinaram mais de 100 parcelas de inventários florestais ao longo dos 600 milhões de hectares da Amazônia, identificaram e mediram o crescimento de mais de 100 mil árvores e registraram tanto árvores mortas como novos exemplares. Os cientistas ainda mediram e mapearam cuidadosamente os padrões climáticos da região.
O estudo revelou que, durante pelo menos 25 anos, a floresta amazônica agiu como sequestradora, retirando dióxido de carbono da atmosfera. Processo similar também ocorre na África. Nas últimas décadas, as florestas tropicais têm absorvido um quinto do carbono emitido mundialmente pela queima de combustíveis fósseis.
Contudo, esse processo foi revertido em 2005. A mortalidade de árvores mostrou-se acelerada em regiões onde a seca foi mais intensa e mesmo em locais com seca menos severa as florestas foram afetadas.
A Amazônia abriga mais da metade das florestas tropicais do mundo, cobrindo uma área de 6 milhões de quilômetros quadrados. Nenhum outro ecossistema do planeta abriga o enorme número de espécies, tampouco exerce tamanho controle no ciclo do carbono.
O artigo Drought sensitivity of the Amazon Rainforest, de Oliver Phillips, Luiz Eduardo Oliveira e Cruz de Aragão e outros, pode ser lido por assinantes da Science em www.sciencemag.org.
(
Agência Fapesp, 06/03/2009)