Reunidos em Belém para participar do seminário “Espécies Ameaçadas e Áreas Críticas para a Biodiversidade no Estado do Pará”, promovido pelo Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) e Conservação Internacional (CI-Brasil), com o apoio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema), especialistas no assunto indicaram ao governo paraense como prioridades para ações emergenciais de conservação quatro áreas do Centro de Endemismo Belém - a antiga fazenda Pirelli, localidades do litoral paraense e as propriedades do Grupo Agropalma e da empresa Cikel - e as corredeiras junto à Serra dos Martírios-Andorinhas, no rio Araguaia.
O Centro de Endemismo Belém (CEB) incorpora as florestas e os ecossistemas localizados a leste do rio Tocantins, no Pará, e a Amazônia maranhense. É o setor mais ameaçado da Amazônia – 70% de suas florestas já foram desmatadas – e a mais antiga área de ocupação humana da região. “É urgente agir para conservar os remanescentes florestais do CEB existentes nessa área”, defende Teresa Cristina Ávila-Pires, herpetóloga. Junto com Ana Luisa Albernaz, ecóloga e também pesquisadora do Museu Goeldi, Teresa coordena um projeto de pesquisa que busca identificar as potenciais áreas críticas para a biodiversidade no Pará.
“As primeiras indicações surgem em caráter emergencial, num tempo de ação que foi chamado ‘zero’, e pretendem barrar as maiores ameaças de extinção da biodiversidade no estado”, observa Thais Kasecker, analista de biodiversidade do Programa Amazônia da CI–Brasil.
Para atingir seu objetivo – a definição de áreas críticas -, os pesquisadores precisam refinar os mapas de distribuição das espécies da Lista Vermelha do Pará, através da estruturação e ampliação dos dados disponíveis sobre cada espécie estudada, e também modelando a distribuição potencial de algumas delas.
Não é um exercício simples. A megadiversidade encontrada na maior porção do território nacional – a região amazônica – ainda está longe de ser satisfatoriamente inventariada e mesmo muito do material já disponível em coleções científicas, no Brasil e no exterior, necessita ainda ser estudado. Ou seja, faltam dados, existem muitas lacunas de informação, e, o que agrava bastante a situação, o processo de ocupação, transformação e degradação das áreas naturais não para - avança aceleradamente alterando a paisagem, ecossistemas e provocando perda de espécies.
Os maiores volumes de informação encontrados nas coleções científicas, na literatura e nas bases de dados são das áreas mais acessíveis, do curso dos grandes rios, estradas e, principalmente, do entorno das grandes cidades regionais. A decisão dos 35 especialistas reunidos pelo MPEG e CI-Brasil, então, foi de propor áreas críticas para ações emergenciais e, após mais dois meses de trabalho, inserindo mais dados e refinando mapas e modelos, propor ações de médio e longo prazo ao Programa Extinção Zero, lançado em 2008 pelo Governo do Pará.
Áreas para ações emergenciais
A Fazenda Pirelli, que ocupa uma área de oito mil hectares no município de Marituba, Região Metropolitana de Belém (RMB), passou a ser propriedade do estado do Pará há cerca de dez anos. O terreno é cercado de vegetação nativa e serve de depósito para madeira ilegal apreendida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e pela Sema. Atualmente, existem propostas para que a fazenda Pirelli sirva de espaço para construção de 9 mil habitações populares.
Dário Amaral, botânico do Museu Goeldi e um dos participantes do Seminário, informou que na Região Metropolitana de Belém foram avaliados seis fragmentos de remanescentes de floresta primária, incluindo a fazenda Pirelli, onde foram inventariadas um total de 330 espécies (apenas árvores - acima de 10 cm de diâmetro e a 1,30 m do solo) em 15 ha. Foi o local de maior diversidade arbórea (ao lado do fragmento do Gunma) e de maior concentração de espécies ameaçadas.
Entre as espécies ameaçadas ali encontradas destacam-se: Aspidospermum desmanthum (araracanga), Cedrela odorata (cedro), Eschweilera piresii (mata-mata-jarani), Euxylophora paraensis (pau-amarelo), Hymenolobium excelsum (angelim) e Manilkara huberi (maçaranduba).
Agropalma
O Grupo é composto por duas empresas que formam o maior e mais moderno complexo agroindustrial de plantio e processamento de óleo de palma do país, respondendo por cerca de 80% da produção nacional. Com 106 mil hectares de extensão, as propriedades da Agropalma abrangem os municípios de Acará, Tailândia, Moju e Tomé-Açu, distantes cerca de 150 quilômetros de Belém. As propriedades estão localizadas no Centro de Endemismo Belém e fazem parte de duas das mais importantes bacias hidrográficas desse Centro de Endemismo - Acará e Moju.
Não há nessas áreas unidades de conservação que garantam a preservação das florestas restantes. No entanto, em suas propriedades, a Agropalma mantém 75 mil hectares de florestas primárias e secundárias de grande importância para a conservação da biodiversidade global, pois abrigam populações de várias espécies endêmicas e ameaçadas de extinção. Desde 2007, a Conservação Internacional trabalha em parceria com a Agropalma e com o Instituto Peabiru para que a produção seja ambientalmente adequada e socialmente justa.
Enquanto o Instituto Peabiru é responsável pelo diagnóstico e proposta de projeto social que envolve funcionários e comunidades do entorno, a Conservação Internacional realizou expedições com o objetivo de apresentar um diagnóstico sobre a biodiversidade e a situação ambiental na área da Agropalma, apresentando um plano de gestão ambiental e uma proposta de programa para a proteção das espécies ameaçadas que ocorrem nas áreas de reserva legal mantidas pela empresa.
No que se refere à biodiversidade, foram feitos levantamentos rápidos sobre a herpetofauna (répteis e anfíbios), aves e mamíferos dessas áreas. Em poucos dias de amostragem, foi encontrada a maior parte das espécies de aves e mamíferos constante da lista estadual de espécies ameaçadas de extinção, sendo seis espécies de aves e outras seis de mamíferos, dentre os quais duas espécies criticamente ameaçadas, de acordo com a Lista de Espécies Ameaçadas do Estado do Pará (disponível em www.sectam.pa.gov.br/relacao_especies) e a Lista Nacional das Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção (disponível em: www.mma.gov.br/port/sbf/fauna).
A Conservação Internacional avalia que a garantia de conservação dessas espécies na área ainda não está ocorrendo de forma efetiva e que isso só será possível através da formalização da criação de uma unidade de conservação. Já foram identificadas pressões de diversas ordens ocorrendo na área, como a retirada de madeira e a caça ilegal. Além disso, o desmatamento no entorno da propriedade está ocorrendo numa taxa bastante alta.
Até agora o projeto de pesquisa já compilou mais de quatro mil pontos de ocorrências de espécies ameaçadas, que servirão de base para indicação de áreas importantes para conservação no Pará. Todavia, o grupo quer ir além. “Para termos informações mais completas na indicação de áreas críticas para ações de médio e longo prazo, achamos necessário acrescentar dados de fitofisionomia e modelagem de nichos”, explica Ana Luisa Albernaz, ressaltando que até o final do primeiro semestre de 2009 a coordenação do projeto entregará o relatório final para a Secretaria de Meio Ambiente do Pará.
(Conservation International,
Amazonia.org, 04/03/2009)