Acima da segunda maior mina de carvão a céu aberto do mundo, em Korkino, nos Montes Urais, na Rússia, só se ouve o vento glacial soprando. Um silêncio raramente interrompido por um ruído surdo, vindo debaixo, a mais de 600 metros de profundidade, onde a extração do carvão se dá com dificuldades. Nessa região carvoeira do coração da Rússia, a indústria já está mal há alguns anos: o gás substituiu o carvão para alimentar as centrais elétricas, enquanto o carvão extraído é de uma qualidade cada vez mais baixa.
A PRODUÇÃO DE CARVÃO
Produção
321 milhões de toneladas de carvão por ano (5ª maior do mundo)
Reservas
173 bilhões de toneladas, o que faz do país o segundo maior do mundo, atrás dos EUA.
Indústria
A Rússia conta 240 minas, a céu aberto ou subterrâneas. O setor carvoeiro ainda emprega 300 mil pessoas.
Terceira energia
O carvão constitui 16% das fontes de energia primárias na Rússia, logo atrás do petróleo, que corresponde a 19%, e do gás natural, responsável por 54%.
Recursos mundiais remanescentes
Segundo os analistas, o país possui 17% do carvão, mas de menor qualidade.
Com a crise econômica atual, a indústria do carvão sofre um novo choque, do qual ela pode não se recuperar. Desde dezembro de 2008, milhares de mineradores não são mais pagos, e agora já se fala em simplesmente se fechar as minas.
Uma catástrofe para as cidades que não conheciam nenhuma outra indústria além da carvoeira.
"Antes, isso aqui fervilhava", lembra Viktor Belov, ex-minerador em Korkino, apontando o enorme abismo de três quilômetros de circunferência. Hoje, são raros os vagonetes que circulam nos trilhos que envolvem a "Xícara", como chamamos aqui essa cratera monstruosa. Do cume, conseguimos ver algumas máquinas ao fundo, que parecem minúsculas por causa da distância, mas a atividade é mínima.
No entanto, a cidade de Korkino só existe em função da Xícara. Quando a extração carvoeira começou, nos anos 1930, ela não passava de uma aldeia. Hoje, é uma cidade de 60 mil habitantes que circunda a Xícara, enquanto uma segunda mina, subterrânea, foi perfurada nas proximidades. Situada a cerca de 50 quilômetros da capital regional, Tcheliabinsk, a cidade de Korkino constitui, junto com os municípios de Kopeisk e Emangelinsk, um dos três locais de extração da Companhia Carvoeira de Tcheliabinsk (TchOuK).
"Há alguns anos, havia 3.500 mineradores na Xícara", lembra Oleg Kirtch, assessor municipal em Korkino. "Agora, eles não passam de 1.200, às vezes com semanas de trabalho de dois dias, no máximo. O que vai ser dessa cidade? Não há nada além da mina. E como os mineradores poderão mudar de ramo, com um nível baixo de educação, e tendo, em sua maioria, mais de 40 anos? Não há nenhum projeto para esta cidade, nenhum plano anticrise. O Estado se esqueceu de nós".
Os salários também foram esquecidos. Em dezembro, os mineradores de Korkino só receberam uma parte ínfima do que lhes era devido, mais nada. No fim de janeiro, um pequeno grupo improvisou uma greve sem o apoio do sindicato oficial, subordinado à direção da TchOuK.
"Todos os empregados da mina seguiram o movimento, sem exceção", afirma Liuba, uma mineradora de 34 anos que organizou a paralisação do trabalho. "Meu salário habitual é de 11 mil rublos (€ 242), mas só recebi 3 mil rublos em dezembro. Por enquanto, estamos vivendo dos legumes em conserva colhidos no verão passado; parei de comer carne, eu a deixo para as crianças". Os mineradores voltaram ao trabalho depois de três dias de greve, seguindo a promessa da direção de pagarem os atrasos antes do dia 15 de fevereiro. Mas até hoje, nada foi depositado ainda.
Na sede da empresa TchOuK, em Tcheliabinsk, Kostantin Strukov mexe nervosamente com sua caneta. "Nossos 6 mil funcionários são pagos em dia, não houve demissões, não temos medo da crise", garante o presidente do conselho de direção e principal acionário da empresa. As explicações serão breves. Ao se mencionar os salários atrasados e o depoimento de seus empregados, ele bruscamente põe um fim à entrevista: "Vocês não têm crise na França? Por que vêm remexer a lama aqui, fiquem na casa de vocês!"
Um nervosismo que traduz a amplitude dos problemas da indústria. As pequenas centrais elétricas a carvão, que constituíam os principais clientes, agora são deixadas para as centrais a gás, mais baratas.
O que é ainda pior, após anos de extração, o carvão que sobrou seria de qualidade medíocre. Algumas centrais elétricas da região também preferiram comprar sua matéria-prima no vizinho Cazaquistão,um melhor mercado e de melhor qualidade.
Resultado: a empresa, que extraía até 40 milhões de toneladas de carvão por ano, só produziu 2,3 milhões em 2008. "O fechamento das minas nos próximos meses é uma possibilidade real", teme Marina Morozova, jornalista em Korkino. A crise econômica, extinguindo a demanda, poderia aplicar um golpe fatal em uma indústria já moribunda. "No momento, a mina não é mais rentável", explica Marina Morozova. "Em resumo, não só o trabalho está mais escasso, como a direção assume mais riscos por economia, em detrimento da segurança. Quando acontecem os pequenos incêndios no interior da mina, eles são apagados sem se evacuar os mineradores que trabalham ali.
Antes, isso seria impensável!"
Em Kopeisk, outro lugar de extração de carvão de TchOuK, a situação não é melhor. Nesse "monogorod", cidade de uma só indústria, as minas começam a se esgotar. Um dos três locais de extração já foi fechado, enquanto as duas funcionam de forma lenta. A cada dia, os corredores da agência para o emprego são tomados por centenas de trabalhadores "dispensados", que vêm se inscrever para obter indenizações às vezes inferiores a 1000 rublos (€ 22).
Nessa pequena manhã de fevereiro, a diretora da agência, Svetlana Buldashova, abre com dificuldade um caminho entre a multidão para penetrar em um local superlotado, para explicar aos desempregados os seus direitos. "E isso é só o começo", ela diz entre duas apresentações. "Nas minas de Kopeisk, as grandes ondas de demissões devem acontecer em abril ou em maio..."
Que futuro haverá para os "monogorod" dos Montes Urais? Na ausência total de diversificação econômica, nenhuma alternativa à indústria carvoeira está prevista para esses grandes povoados de dezenas de milhares de habitantes. "As únicas ofertas de emprego em Kopeisk propõem empregos de segurança na entrada de pequenas lojas", diz com um sorriso amargo Vitali, um desempregado com cerca de 40 anos. "Daqui a alguns anos, só haverá os porteiros aqui... Mas, para vigiar o quê?"
(Por Alexandre Billette, Le Monde, UOL, 03/03/2009)
Tradução: Lana Lim