O Projeto de Lei 817/2008, do Poder Executivo, enviado à apreciação da Assembleia Legislativa de São Paulo (AL-SP) no final do ano passado, pretende classificar e regulamentar a utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Cerrado do Estado de São Paulo. Em fase de exame pelo relator especial pela Comissão de Constituição e Justiça, deputado Roberto Massafera (PSDB), nomeado em 18/02, a matéria estabelece critérios para a identificação e preservação da mata nativa do bioma, restringindo a supressão da vegetação assim caracterizada, de acordo com o Código florestal vigente no país (Lei Federal 4.771, de 15 de setembro de 1965).
Em 19 de setembro de 2008, dia em que se comemora nacionalmente o cerrado, a Secretaria Estadual do Meio Ambiente havia suspendido a supressão da mata assim identificada por 180 dias. Logo depois, enviou à Casa o PL 817/08 com vistas à sua preservação. De acordo com o site da Secretaria do Meio Ambiente, as duas medidas integram o "Pacote Primavera" inserido no Projeto Ambiental Estratégico Desmatamento Zero.
O Bioma Cerrado, originalmente, ocupava uma área de 3.474.900 hectares, o que correspondia a 14% da área do território paulista. Em 2008, o cerrado restringe-se a 0,84% da área total do Estado.
Dados do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), indicam que na região do cerrado podem ser encontradas 67 espécies de mamíferos, 837 de aves, 120 de répteis e 150 de anfíbios, muitos deles ameaçados de extinção. O projeto de lei tem por objetivo proteger a flora e fauna da área através de maiores restrições aos licenciamentos.
O cerrado paulista
Em seu artigo 2º, o PL 817/2008 classifica o Bioma Cerrado como vegetação savanica da América do Sul, apresentando as seguintes fisionomias: cerradão (vegetação florestal em que a cobertura arbórea compõe dossel contínuo, com mais de 90% de cobertura da área do solo, com altura média entre oito e 15 metros, apresentando, eventualmente, árvores emergentes de maior altura); cerrado stricto-sensu (vegetação de estrato descontínuo, composta por árvores e arbustos geralmente tortuosos, com altura média entre três e seis metros, com cobertura arbórea de 20% a 50%, e a cobertura herbácea, no máximo, de 50% da área do solo); campo cerrado (vegetação composta por cobertura herbácea superior a 50%, e com cobertura arbórea de, no máximo, 20% da área do solo, com árvores tortuosas de espécies heliófitas, tolerantes a solos muito pobres e ácidos, com idênticas características e espécies encontradas no cerrado stricto-sensu, porém, de menor porte, além de subarbustos e árvores com caules subterrâneos); campo (vegetação predominantemente herbácea e, eventualmente, com árvores no formato arbustivo, cuja paisagem é dominada principalmente por gramíneas e a vegetação lenhosa, quando existente, é esparsa).
A possibilidade de supressão, de acordo com o PL, ficaria restrita à obtenção de permissão da Secretaria do Meio Ambiente, obedecidas as medidas de compensação e mitigação cabíveis a serem definidas nos processos de licenciamento ambiental, desde que a área não esteja ocupada irregularmente.
O texto prevê ainda exceções no caso de supressão para atender as necessidades de segurança nacional, segurança pública, proteção sanitária, instalação de estabelecimentos públicos de educação, e obras de infraestrutura relativas à saúde, comunicação, transporte e de saneamento e energia. O uso de interesse social também é discriminado, incluindo o manejo agropecuário, com características de agricultura familiar ou de pequena propriedade, desde que ambientalmente sustentável.
Pesquisas levadas a efeito por técnicos e especialistas da Universidade Estadual Paulista (Unesp) mostram que a riqueza da flora e da fauna de um dos maiores ecossistemas do país, nas últimas décadas, vem sofrendo um grande processo de devastação. O bioma está presente em 16 Estados brasileiros e se caracteriza pelo solo ácido, clima seco e matas de árvores com caule fino e tortuoso, intercaladas por campos abertos. Com apenas 20% de sua vegetação nativa, é a segunda área mais rica em biodiversidade no Brasil, depois da Amazônia, que conta ainda com 80% de sua floresta. Marcada por um cenário de desmatamento e extinção de espécies, a parte paulista do cerrado tem sido amplamente pesquisada pela Unesp, nos últimos anos.
Localizada ao sul do bioma, a vegetação do cerrado paulista é influenciada pelo clima mais frio. "Essa característica limita a ocorrência de espécies típicas do clima tropical do planalto central, sensíveis ao frio mais intenso", observa o biólogo Osmar Cavassan, da Faculdade de Ciências (FC), campus de Bauru, que há 25 anos estuda a vegetação nativa do Interior do Estado.
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AL-SP, 27/02/2009)