O Ministério Público Estadual (MPE) informou ontem que nove municípios paulistas serão acionados para não emitirem mais licenças de construção ou alvarás em uma região de 8 milhões de metros quadrados da Serra da Cantareira. O avanço da destruição na área (que tem 7,9 mil hectares, o equivalente a 44 parques do Ibirapuera) contou com o respaldo de 865 licenças emitidas por prefeituras e órgãos estaduais em áreas de preservação permanente entre os anos de 2000 e 2007. O avanço da destruição foi apresentado pelo Estado no domingo.
As licenças emitidas depois de 2000 também serão analisadas pelo MPE e poderão ser alvo de ações, com pedido de revisão da concessão, informou o promotor José Eduardo Ismael Lutti. Desde novembro, um grupo de três promotores da capital e outros oito nas cidades da região da Cantareira analisam imagens do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)que ilustram a propagação de construções irregulares em áreas de mananciais da serra. O convênio entre o MPE e o Inpe está em vigor há quatro meses.
"São assustadoras e preocupantes as ocupações que se propagam nos topos de morro, perto de cidades como Mairiporã e Caieiras", disse Lutti, que ainda não tem um número oficial sobre a área que a serra pode ter perdido nos últimos três anos com invasões e loteamentos regulares. O ofício do MPE que vai pedir o fim da emissão de alvarás e a suspensão dos projetos em tramitação será enviado em até dez dias às prefeituras de São Paulo, Santa Isabel, Mairiporã, Caieiras, Guarulhos, Osasco, Franco da Rocha, Arujá e Nazaré Paulista. Também serão oficiados, segundo o MPE, o Departamento de Proteção aos Recursos Naturais (DPRN), a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) e o governo do Estado. "Vamos pedir que todos os processos em análises no Estado e nas prefeituras sejam suspensos diante da gravidade da situação."
O MPE afirma também que poderá responsabilizar as autoridades que emitiram alvarás após 2000, com base no Código Florestal. A maior parte foi concedida por municípios vizinhos da capital, como Guarulhos e Mairiporã. A Prefeitura de São Paulo, por exemplo, não emite licenças nos bairros próximos da Cantareira desde novembro de 2004, apesar de as ocupações irregulares continuarem a avançar em bairros como o Distrito Anhanguera, cuja região, perto da Cantareira, cresceu 171% nos últimos oito anos.
O Grupo de Aprovação de Projetos Habitacionais da Secretaria de Estado do Meio Ambiente também suspendeu as licenças para loteamentos com mais de 15 mil m² na região da serra desde 2006. Mas, com 73% de sua área considerada de preservação permanente, Mairiporã registrou um crescimento de 41% no seu território entre 1998 e 2008. Novos loteamentos também crescem no entorno de fragmentos de mata atlântica em Caieiras, Arujá e Guarulhos, segundo imagens do Inpe. Com base na Lei de Uso e Ocupação do Solo, de 1998, os municípios podem, por exemplo, autorizar a subdivisão de lotes de 10 mil m², o que aumenta a possibilidade de fragmentação de chácaras e propriedades rurais em imóveis residenciais e comerciais.
O prefeito de Mairiporã, Antonio Aicyda (PSDB), e os de cidades vizinhas como Caieiras e Santa Isabel argumentam não ter espaços para crescer. Eles também dizem que as ações da capital para impedir ocupações no pé da serra estão causando um fluxo migratório para as regiões no alto dos morros da Estrada de Santa Inês, onde favelas crescem à beira de córregos sem coleta de esgoto. Sete dos nove prefeitos que se tornaram alvo do MPE na Cantareira se reuniram ontem em São Paulo com o secretário de Estado de Meio Ambiente, Xico Graziano, e com o vice-governador, Alberto Goldman, e consideraram a ação dos promotores um pouco radical.
Os prefeitos também reclamam que a degradação da serra ocorre por falta do saneamento, que deveria ser executado pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). "Na minha cidade, 83% da área é de preservação. Não podemos fazer nada na cidade. Estamos sem recursos, viemos aqui com o chapéu na mão", afirmou Helio Buscarioli (PSDB), prefeito de Santa Isabel. Antes de o MP pedir suspensão da emissão de alvarás, o governo já havia chamado os prefeitos para analisar formas de combate à ocupação da serra.
No encontro, não foi discutida a possibilidade de congelar a emissão de licenças. "Mas é uma possibilidade a ser estudada", disse Graziano. O vice-governador afirmou que as demandas dos prefeitos serão levadas à Sabesp.
NÚMEROS
9 municípios
paulistas serão acionados para não emitirem mais alvarás
7.900 hectares
compõem a área da Cantareira
865 licenças
foram dadas entre 2000 e 2007
(Por Diego Zanchetta,
O Estado de S. Paulo, 18/02/2009)