O Leopardus tigrinus é um felino especial. Não é necessariamente mais bonito, nem mais esperto do que um gato doméstico. É pequeno. Não ultrapassa os 85 centímetros de comprimento e dificilmente pesa mais do que três quilos. Conhecido como gato-do-mato-pequeno, vive em ambiente de cobertura vegetal densa e está presente na maioria dos ecossistemas brasileiros, desde a Floresta Amazônica até os Pampas Gaúchos. Em Santa Catarina, o animal fez da restinga no Parque Estadual da Serra do Tabuleiro o seu lar.
Ameaçada de extinção devido à captura ilegal e à comercialização de peles no país, a espécie sofre agora com uma nova ameaça em SC: o Projeto de Lei nº 347.3/08, que prevê a criação do Mosaico de Unidades de Conservação da Serra do Tabuleiro. “As pessoas dizem que vão construir, mas sem prejudicar. Para o gato não serve, ele não vive nem perto de áreas urbanas. É necessário conservar áreas grandes de restinga”, comenta o biólogo Marcos Tortato, que pesquisa o felino.
O grande problema avaliado por Tortato é que, ao mudar o status de três regiões no interior e nas proximidades do parque para Áreas de Proteção Ambiental (APAs), o “uso sustentável” e a ocupação passam a ser permitidos. “Fica claro ao ler o projeto que ele não contempla a razão biológica, não estão preocupados com a conservação da restinga”, reitera. Ele faz uma estimativa baixa de que, atualmente, existem mais de dois mil hectares de restinga bem conservados na área do parque.
O pesquisador estuda o gato-do-mato-pequeno desde abril de 2003, quando, por acaso, descobriu a existência do animal na restinga catarinense. Para monitorá-lo e estudá-lo, Tortato criou o “Projeto Felinos do Tabuleiro” e realizou, até agora, pesquisas básicas sobre a espécie, que ajudam a entender o seu comportamento.
A próxima etapa é saber justamente como o gato-do-mato-pequeno utiliza a restiga. “Já se pode afirmar com segurança que ele, ao contrário do que alguns afirmam, é sim residente do local e depende muito das presas nativas para sobreviver”, aponta Tortato. O felino se alimenta principalmente de pequenos roedores, aves (do tamanho de um canário) e répteis (pequenos lagartos), e cumpre o papel de regulador dessas espécies ao manter o controle das populações.
Algumas espécies do parque já foram extintas
A mudança prevista no projeto do mosaico da Serra do Tabuleiro atinge também outros animais. Um deles, o preá das Ilhas Moleque do Sul (Cavia intermedia), é um dos mamíferos mais raros do planeta, com a existência estimada de apenas 60 indivíduos. Outras espécies viviam no parque até há pouco tempo, mas foram extintas, como a onça-pintada (Panthera onca), o veado-campeiro (Ozotoceros bezoarticus) e a ariranha (Pteronura brasiliensis).
Marcos Tortato diz que o parque tem potencial de abrigar inúmeros outros animais. “Os peixes da restinga, por exemplo, nunca foram estudados. As mudanças [do projeto], se acontecerem, com certeza afetarão a fauna, não posso precisar em números agora, mas que vão, vão”, afirma.
Na semana passada, Tortato e outros biólogos entregaram uma carta com dados relativos às espécies que vivem no Parque Estadual da Serra do Tabuleiro aos deputados da Assembleia Legislativa de Santa Catarina.
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(Por Juliana Dal Piva, Ambiente JÁ, 18/02/2009)