O governo do Pará definirá amanhã o destino de 1,3 milhão de hectares, área quase nove vezes o tamanho da cidade de São Paulo, na qual estão interessadas gigantes mineradoras, madeireiros, grileiros, índios e 105 comunidades ribeirinhas. A redefinição dos donos e da função das terras -cinco glebas no oeste paraense de propriedade do Estado- pode transformar a relação entre moradores e mineradoras, dificultar o desmatamento ilegal e facilitar a demarcação do território pretendido pelos indígenas. Por outro lado, deve gerar resistência, se for definido que os grileiros devem sair da área.
A disputa pelo território é intensa, não só pelo ouro e pela bauxita do subsolo, mas também devido à floresta quase intocada na superfície -mais de 80% da área é mata densa, diz o Ideflor (Instituto de Desenvolvimento Florestal do Pará). No início desta década, a chegada de madeireiros recrudesceu o conflito fundiário na região. Em 2007, um índio líder da etnia borari foi sequestrado e espancado por denunciar invasões. Índios e ribeirinhos dizem que a disputa principal é com cinco cooperativas madeireiras. Elas não têm os títulos das terras, mas querem mais de 460 mil hectares da área, que dizem ocupar. Há outros madeireiros em 23 lotes, cujos títulos conseguiram em 2006.
De acordo com Heder Benatti, presidente do Iterpa (Instituto de Terras do Pará), dificilmente esses madeireiros serão retirados. Mas as cooperativas devem acabar expulsas. A Folha apurou que o governo de Ana Júlia Carepa (PT) criará ao menos uma área de concessão florestal e uma unidade de proteção que, se for uma estação ecológica, não poderá sofrer exploração mineral. Mas os grandes beneficiados serão os ribeirinhos, que devem conseguir quase toda a terra que exigem, e os índios, já que o Estado não mexerá na área pretendida por eles.
Segundo o promotor Raimundo Moraes, que atuará no caso, essa regularização fundiária afastará os madeireiros "aventureiros". Já para Edivaldo Matos, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santarém, o resultado será positivo, mas não deve cessar o assédio dos "forasteiros". Com os títulos, os moradores receberão os royalties pagos pelas mineradoras e terão mais poder para exigir indenizações, se, pelas obras de uma mina, sentirem-se prejudicados.
Quase toda a área já foi requisitada ao DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral) para lavra ou pesquisa mineral. A Vale, por exemplo, tem 21 autorizações para pesquisa nas glebas. Ela confirmou o interesse, mas afirmou que não iria se pronunciar. Dentro da área, a Alcoa tem autorização de lavra para viabilizar a extensão de uma mina de bauxita, já em construção. A empresa diz que a titulação facilitará a relação com os moradores, que, no início do mês, fecharam uma estrada em protesto contra supostos danos causados pela mina.
(Por João Carlos Magalhães, Folha de S. Paulo, 16/02/2009)