A polêmica resolução do Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema RS) que trata de critérios para o licenciamento ambiental de empreendimentos ou de atividades localizadas em Área Urbana Consolidada situada em Área de Preservação Permanente (APP) foi novamente adiada na primeira reunião de 2009 do órgão realizada na sexta-feira (13/02). O texto já havia sido remetido duas vezes à reanálise, por pedidos de vistas de conselheiros, em reuniões anteriores.
A proposta, que em princípio deveria espelhar-se na
Resolução Conama 369, de 28 de março de 2006, já que esta trata do mesmo tema, tem por objetivo orientar os órgãos estadual e municipais de meio ambiente sobre o licenciamento ambiental em áreas urbanas ocupadas de forma desordenada, as quais tiveram seus atributos naturais – especialmente os de vegetação –descaracterizados.
Contudo, diferentemente da Resolução Conama 369/2006, a minuta de resolução estadual correspondente não deixa claro que a intervenção do órgão ambiental, nessas áreas, deve ocorrer apenas para a “implantação de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social, ou para a realização de ações consideradas eventuais e de baixo impacto ambiental”, conforme estabelece o artigo 1º das Disposições Gerais da resolução federal. Este foi um dos argumentos levantados pela ONG Mira Serra para se opor à aprovação do texto. A mesma justificativa foi endossada pelo Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (Ingá). “Há também o problema dos requisitos para a classificação de áreas urbanas consolidadas, eles são imprecisos e deixam margem a múltiplas interpretações”, afirma Paulo Brack, representante do Ingá.
Segundo a Resolução Conama 369/2006, as áreas sujeitas a intervenção, entre outros requisitos, devem possuir, no mínimo, três dos seguintes itens de infra-estrutura urbana implantada: malha viária, captação de águas pluviais, esgotamento sanitário, coleta de resíduos sólidos, rede de abastecimento de água, rede de distribuição de energia.
Já na proposta de resolução estadual, consta que essas áreas devem apresentar pelo menos quatro dos seguintes requisitos: malha viária com canalização de águas pluviais, rede de abastecimento de água, rede de esgoto, distribuição de energia elétrica e iluminação pública, recolhimento de resíduos sólidos urbanos, tratamento de resíduos sólidos urbanos.
Outra questão contestada por ambientalistas e por outras entidades presentes à reunião é que, segundo o parágrafo único do artigo 3º da minuta de resolução estadual, “os municípios qualificados pelo Consema não necessitam de anuência prévia do órgão ambiental estadual para regularização ou licenciamento de atividades ou empreendimentos localizados em áreas urbanas consolidadas situadas em áreas de preservação permanente em seus territórios” .
Além disto, o artigo 4º da proposta afirma que “poderá ser realizado licenciamento ambiental de empreendimentos ou de atividades considerados efetiva ou potencialmente poluidores ou daqueles que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental em áreas urbanas consolidadas situadas em área de preservação permanente”. “Nós entendemos que o licenciamento ‘deverá’, e não ‘poderá’ ser realizado nesses casos”, observa Brack. De acordo com ele, o texto ainda abre excepcionalidades para que conselhos municipais de meio ambiente possam analisar a possibilidade de licenciamento, nessas áreas, preenchendo-se três, e não quatro, dos itens inicialmente previstos.
JustificativaA justificativa desta proposta de resolução é que a legislação ambiental brasileira é muito protecionista e não contemplou, ao longo do tempo, a realidade de áreas ocupadas de forma desordenada, ou seja, desconsiderou o fenômeno da antropização. “Só que nós não podemos desconsiderar o que aconteceu recentemente em Santa Catarina, por exemplo. A tragédia dos deslizamentos devido à ocupação irregular em encostas de morros chocou toda a sociedade. Mas algum tempo se passou, e as pessoas esqueceram o ocorrido, sem refletir que pode voltar a acontecer se medidas de proteção ambiental não forem adotadas”, assinala Brack. “A sociedade vai esperar outras tragédia para servir de lição? O cerco à legislação ambiental já é sistêmico no Brasil”, afirma.
VotaçãoCom apenas três votos favoráveis à sua aprovação – de representantes da Federação das Associações dos Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), da Fepam e da Soeciedade de Engenharia do Estado – a minuta de resolução não passou pelo plenário do Consema. Inclusive entidades tradicionalmente estimuladoras da atividade empreendedora, como a Federação da Agricultura do Estado (Farsul) e a ONG Amigos da Floresta manifestaram-se pelo reexame da matéria.
Como resultado, o texto deverá voltar para análise da Câmaras Técnicas de Biodiversidade e de Assuntos Jurídicos do Consema, para novas análises.
(Cláudia Viegas, AmbienteJÁ, 14/02/2009)