O chamado “Projeto Anitápolis” das multinacionais Bunge e Yara, sócias da Indústria de Fosfotados Catarinense (IFC), que está sendo licenciado pela Fatma, órgão de licenciamento ambiental do Estado de Santa Catarina, prevê a implantação de um complexo de fabricação do fertilizante Superfosfato Simples Granulado (SSP-G), produzido através da reação química entre o fosfato e o ácido sulfúrico. Além da mina, o empreendimento, localizado na Grande Florianópolis, teria barragens e bacias de rejeitos, área industrial, infra-estrutura e depósito de estéreis.
As principais atividades seriam a mineração a céu aberto; concentração do insumo por flotação (separação via úmida do minério e rejeito); disposição dos rejeitos da concentração fosfórica em duas bacias de decantação; e fabricação de ácido sulfúrico com utilização de enxofre importado, que viria do porto de Imbituba (SC), no sul do Estado.
O investimento total previsto é de R$ 565 milhões, com produção final de 540 mil toneladas anuais do fertilizante SSP-G. O projeto espera gerar 1.250 empregos diretos no pico da obra de implantação; a operação do complexo pretende criar 423 vagas diretas e 1.300 indiretas.
Na audiência pública da quinta-feira passada (05/02), porém, algumas pessoas questionaram a duração e a sustentabilidade desse empreendimento. A mina funcionaria durante 33 anos e, depois disso, Anitápolis deveria encontrar outras alternativas econômicas. Para o ornitólogo e ambientalista Jorge Albuquerque, nenhuma mineração pode ser considerada uma atividade sustentável, já que não é passada para as gerações seguintes.
O projeto do complexo prevê construção no topo e nas encostas da Serra do Rio Pinheiro. Duas barragens com mais de 50 metros de altura represariam a água do rio Pinheiro para formar lagos que receberiam os rejeitos da mineração – depois, ela seria filtrada para poder seguir o seu curso até o rio Braço do Norte.
Essas obras preocupam alguns moradores e ativistas porque ficariam acima da vila de São Paulo dos Pinheiros e da sede do município. “O rio Pinheiro corre por um vale estreito que termina como um pequeno cânion. O vale desce de uma encosta íngreme, atingindo o leito estreito que se afunila antes de atingir o rio Braço do Norte. Pontes são destruídas freqüentemente em Anitápolis após chuvaradas intensas”, escreveu Albuquerque no blog em que divulga uma campanha contra o empreendimento.
“O desmoronamento das barragens do Projeto Anitápolis em uma chuvarada como a que aconteceu em Santa Catarina [em novembro de 2008] colocaria em risco imediato as pessoas que moram no município”, acrescenta. As fortes chuvas que mataram 135 pessoas no estado no ano passado também atingiram Anitápolis, provocando deslizamento de barreiras e desmoronamentos de estradas.
“Eu fiz uma pergunta por escrito na audiência: entre 1960 e 2008 aconteceram mundialmente 86 acidentes com barragens de mineração. Existem garantias absolutas? Como pensam em controlar as chuvas? Como vão lidar com as mudanças climáticas?”, conta o fotógrafo Luhk Zeller.
“O consultor das barragens começou um discurso técnico, aí perguntei como vão lidar com as mudanças climáticas. A resposta foi: ‘não sabemos’. Falei que se trata de uma questão de vida e morte. Então, se não sabe, não faz”, acrescenta Zeller, que mora em Florianópolis, traduz textos sobre assuntos relacionados ao projeto da associação Bunge-Yara e os envia para pessoas e entidades do exterior.
“Creio que o consultor não estava seguro de que as barragens propostas pelo Projeto Anitápolis suportem uma chuva similar a que caiu em novembro de 2008, ou durante a enchente de Tubarão nos anos 70”, analisa Jorge Albuquerque. “São muitas as testemunhas da enchente de Tubarão que narram o terror que cobriu Anitápolis naquela época. As chuvas foram muito fortes e intensas nas cabeceiras do rio Braço do Norte [que deságua no rio Tubarão]”.
Uma moradora da vila São Paulo dos Pinheiros, Rachel Back, questionou a segurança das barragens e perguntou se os representantes da Bunge e da Yara topariam morar lá se o complexo de mineração fosse construído. Eles desconversaram.
Procuradora da República em SC diz que projeto não é viável
Durante o debate, o presidente da filial brasileira da Yara, Lair Vianei Hanzen, afirmou que só levaria o projeto adiante se não houvesse risco, na tentativa de acalmar o público. A procuradora da República em Santa Catarina, Analúcia Hartmann, contestou esse comentário e disse que não existe projeto sem risco.
Hartmann também falou, na audiência, que o Ministério Público Federal está preocupado com o transporte de enxofre na BR-101, que virá do porto de Imbituba, e com a capacidade da BR-282 em suportar o tráfego pesado.
Sua preocupação maior, contudo, são os desastres ambientais, como os que ocorreram em SC no ano passado. Única integrante da mesa da audiência a falar sobre isso, ela afirmou que, se fosse decidir pela viabilidade da fosfateira hoje, diria “não” em função das incertezas do projeto e dos últimos desastres no Estado.
(Por Rodrigo Brüning Schmitt, Ambiente JÁ, 13/02/2009)