A Fundação de Assistência Social e Cidadania tem como um dos seus focos de atuação a retirada dos pedintes das ruas de Porto Alegre. O que se pôde ver na tarde desta quinta-feira, entretanto, foi algo muito parecido com o que é feito pelos moradores de rua, só que sendo realizado dentro do gabinete do secretário Kevin Krieger. Durante a apresentação do projeto do Centro Material de Reciclagem (Cemar) pelo Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) ao secretário nacional de Transporte e Mobilidade Urbana, Luiz Carlos Bueno de Lima, o que mais se pôde ver foram pedidos de liberação de recursos por parte do Ministério das Cidades para a viabilização do projeto.
Mais uma vez, o centro das discussões foi a questão envolvendo os carroceiros e carrinheiros (trabalhadores que puxam seu próprio veículo) de Porto Alegre. A Lei 10.531, que determina a retirada gradual em oito anos das carroças da Capital, resultará em cerca de oito mil pessoas sem terem como se sustentar. "Se nós não prepararmos e buscarmos um espaço para essas pessoas, toda a cidade, todo o sistema de assistência social de Porto Alegre irá sofrer. Esse é um primeiro passo, que é reunir as secretarias e os departamentos da prefeitura. Vamos trabalhar para que essas pessoas tenham uma autossustentabilidade. É o começo da busca de uma solução para o problema. A ideia é trabalhar com assistência social e não com o assistencialismo", afirma Krieger.
Para o vereador e autor da lei, Sebastião Melo (PMDB), o problema é social, antigo e muito amplo. "Essa é uma questão social, acima de tudo. A quantidade de carroceiros e carrinheiros que existem na cidade é a face de um modelo excludente. As centrais de triagem do DMLU são uma alternativa, mas não a única solução. É preciso cadastrar socialmente todas essas pessoas e suas famílias para que tenhamos uma real noção do tamanho desse problema", diz.
Segundo o projeto apresentado pelo DMLU, serão necessários R$ 1,5 milhão para a construção do galpão, a compra de maquinários e de equipamentos. Quando pronto, o Cemar abrigará 350 trabalhadores empregados diretamente, com cada um deles recebendo uma renda mensal de R$ 500,00. Pela previsão do departamento, em cinco anos, o centro gerará um total de R$ 10, 5 milhões em recursos. "Atualmente, nós temos em torno de mil carroceiros e carrinheiros trabalhando nas 16 unidades de triagem do DMLU. O Cemar será uma grande unidade de triagem, dotada de uma estrutura maior. Assim teremos mais condições de convencer esses trabalhadores a sair da informalidade", enfatiza o presidente do departamento, Mário Moncks.
O projeto do Cemar é um piloto que será instalado no Centro de Porto Alegre, podendo, futuramente, ser ampliado para outras regiões da cidade. "Esse projeto atenderá basicamente aos carroceiros das ilhas. Cerca de 80% dos carroceiros do Centro da cidade são oriundos das ilhas. Se atendermos a essa parte da Capital, boa parte do problema será resolvido. Atualmente nós não conseguimos entrar no Centro porque lá o lixo já tem dono", observa Moncks.
A execução do projeto ficará por conta da Cooperativa Mista de Produção e Serviços do Arquipélago (Coopal), da Associação dos Moradores, Carroceiros e Papeleiros da Ilha Grande dos Marinheiros (Amapag) e da prefeitura de Porto Alegre. A ideia é de que o Cemar seja abastecido com material recolhido pela coleta seletiva do DMLU. Os trabalhadores receberão os resíduos já no local de trabalho e lá trabalharão. A prefeitura fará o transporte, através de ônibus, dos trabalhadores das ilhas para o Cemar e de lá para as ilhas. A administração ficará por conta de um conselho gestor formado pelo poder público e por entidades representativas dos trabalhadores. O DMLU já possui um terreno, localizado entre as avenidas Voluntários da Pátria e Frederico Mentz, destinado à construção dos módulos.
Segundo Moncks, a mudança na coleta seletiva de Porto Alegre, que passará a valer a partir de março, auxiliará a implantação do Cemar. "Atualmente a coleta é realizada duas vezes por semana em 11 bairros e uma vez por semana nos demais. Com a entrada em vigor do novo contrato, em março, nós teremos a coleta seletiva duas vezes por semana em todos os bairros da Capital. Com isso, teremos muito mais material para enviar para o Centro", ressalta.
O representante do governo federal destacou a importância da iniciativa. "É um projeto que melhora a questão da mobilidade urbana e resultará em formação e qualificação para esses trabalhadores. O projeto é interessante porque resolve dois problemas, um no trânsito em Porto Alegre e o outro na formação profissional dos trabalhadores. Vamos trabalhar muito, buscando verbas em outros ministérios, se for possível, para que esses recursos sejam disponibilizados", afirma Bueno.
Apesar de toda a apresentação e da entrega do projeto ao governo federal, não existem garantias de que as verbas virão para Porto Alegre. Enquanto isso, a cidade aguarda outras medidas da prefeitura para a colocação da lei do vereador Melo em prática.
(Jornal do Comércio, 06/02/2009)