"Daqui a 10 anos, será possível colocar um etanol hipereficiente num carro com motor desenhado exclusivamente para etanol, que será produzido num canavial com sustentabilidade ambiental. Teremos um sistema sustentável numa cidade com baixa poluição".
A projeção é do professor Marcos Silveira Buckeridge, do Instituto de Biociências (IB) da USP, que coordena o recém-criado Instituto Nacional de Biotecnologia para o Bioetanol. O grupo reunirá pesquisadores de todo o País para estudar a produção de energia a partir de biomassa.
Depois da autossuficiência, a sustentabilidade
"O Brasil já possui autossuficiência energética, mas precisa caminhar para a sustentabilidade", ressalta o professor. Com um investimento inicial de R$ 7 milhões, o principal foco do Instituto é estudar a cana-de-açúcar.
Buckeridge explica que a partir da cana se produz o açúcar (sacarose), que então é transformado em etanol através da ação de leveduras.
"Quando se faz isso, sobra o bagaço e a palha que fica no campo. Esses dois resíduos contêm açúcares na forma de celulose. Um dos objetivos do nosso Instituto é transformar essa celulose em um tipo de açúcar acessível para a levedura transformá-lo em etanol, chamado etanol celulósico" explica o professor.
Bagaço para gerar eletricidade
Atualmente, o bagaço é queimado para produzir eletricidade para que a usina fique autossuficiente. A palha fica no campo, metade é aproveitada como adubo e o resto é desperdiçado. Outro foco do Instituto é estudar como a cana-de-açúcar responde ao gás carbônico elevado, verificando a fotossíntese, o crescimento e outras condições em diversas variedades de cana que serão melhoradas em laboratório.
Buckeridge explica que a produção existente hoje no Brasil está na chamada primeira geração de produção de etanol, na qual a partir da cana-de-açúcar produz-se sacarose e então etanol. No entanto, as pesquisas caminham para a segunda geração, em que novas variedades de cana, além da sacarose, produzirão mais bagaço e mais palha, ou seja, produzindo mais açúcar (energia).
O professor ressalta também os estudos rumo a uma terceira geração, em que fungos e enzimas melhoradas em laboratório completarão a digestão do bagaço e da palha da cana-de-açúcar. E por último, a quarta geração: a cana transformada geneticamente se auto-amolece, ou seja, amolece a própria celulose, e um fungo (também transformado) fará o trabalho de hidrólise de uma maneira mais eficiente. "Nosso objetivo é baixar o custo e aumentar a eficiência dos processos", diz o professor.
Pesquisa auto-organizada
O Instituto vem para organizar e agregar todas essas pesquisas num projeto maior e que produza resultados. Antes não havia uma conexão das pesquisas, mas cada pesquisador sabia o que o outro pesquisava e havia uma auto-organização.
"Em 2006 nós fizemos um levantamento e começamos a pensar num programa de integração, pois havia várias pesquisas correlacionadas. Então, em 2008, através de workshops, combinamos e conversamos rumo a uma integração dos laboratórios para a produção do etanol celulósico. Quando surgiu o Instituto de Biotecnologia os laboratórios já estavam interligados" conta Buckeridge.
Integração nacional
O Instituto conta com 29 laboratórios espalhados por seis estados brasileiros e que são divididos em quatro centros: Centro de Fisiologia Vegetal e Biologia Celular, que fará a fisiologia de diversas variedades de cana; o Centro de Caracterização de Enzimas e Engenharia de Processos, que estudará as leveduras, a fermentação dos açúcares, as proteínas e suas estruturas e também a composição da parede celular com o objetivo de melhorar o desempenho na quebra dos açúcares; o Centro de Expressão Gênica, que estudará dados para produzir novas variedades de plantas, modificadas geneticamente, que consigam digerir sua própria parede celular como se fosse um fruto e preparar o sistema para ser digerido pelos fungos; e o Centro de Prospecção de Fungos e Desenvolvimento de Hidrólise Ácida, que estudará fungos que produzem as enzimas de fermentação da biomassa.
"Além dos centros, temos um programa de pesquisa em Bioenergia, o Bioen-Fapesp [da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo], do qual eu sou um dos fundadores e que possui R$ 20 milhões em investimentos na área de biomassa. Já temos parte do genoma da cana-de-açúcar mapeado e temos um projeto para mapeá-lo por inteiro, assim como o genoma humano" observa o professor.
"Uma parte grande do Instituto é para divulgação, nós queremos explicar muito bem o que é pesquisa. Apesar de ligados ao governo, estamos abertos a outras fontes, inclusive privadas" conclui.
(Por Paulo Roberto Andrade, Inovação Tecnológica, 06/02/2009)