A chuva que inundou o sul do Estado despejou ontem os corpos de mais cinco vítimas, elevando para 11 o número de mortos, até a noite. O cenário segue desolador. Ruíram 44 pontes em quatro distritos da área rural da região de Pelotas, mantendo ilhadas dezenas de famílias. As rodovias BR-392 e BR-116 seguem bloqueadas em alguns trechos.
– Pelos nossos registros, é uma das maiores tragédias ambientais da história do Rio Grande do Sul. A situação é mais grave porque ocorreu num curto espaço de tempo e em uma região limitada, formada por quatro municípios – disse o tenente-coronel Joel Prates Pedroso, coordenador da Defesa Civil do Estado.
O socorro aos flagelados, a situação das estradas e a explicação do fenômeno que atingiu o sul do Estado
Pelotas, Turuçu, Morro Redondo e Capão do Leão decretaram situação de emergência. Conforme Prates, as pesquisas feitas até agora nos registros da Defesa Civil desde 1970 confirmam que a enxurrada foi uma das maiores catástrofes climáticas do Estado.
– Temos registro de uma enchente em Torres, em 1973, com 14 mortes. Mas, neste caso, foram contabilizadas pessoas que morreram em Santa Catarina.
Muitos moradores se recusam a deixar suas residências com medo de saques, e há mais de 1,4 mil refugiados em abrigos públicos da região. Eles formam filas para receber alimentos e vestimentas repassados por órgãos públicos.
Um dos corpos encontrados era o do maquinista do trem que descarrilou com a chuva na noite de quarta-feira. Adão Luiz Almeida, 49 anos, foi encontrado morto a um quilômetro do local do acidente, em um arroio próximo à BR-116. A poucos metros dali, o corpo da estudante Priscila Pereira, 26 anos, foi localizado instantes depois.
Segundo informações da Brigada Militar de Pelotas, ela teria tropeçado e caído em um açude enquanto acompanhava a operação de resgate do condutor da locomotiva.
Na lista de desaparecidos também estava o lenhador Leandro Ferreira, 26 anos, encontrado morto junto a uma árvore no interior de Pelotas. Os corpos do caminhoneiro José Fagundes de Andrade, 51 anos, e Osmar Renato Costa, 17 anos, caroneiro de uma moto, ambos engolidos pelas águas do Arroio Fragata, no km 527 da BR-116, foram localizados no final da manhã.
O prefeito de Pelotas, Fetter Júnior (PP), estava em férias e reassumiu o cargo. Ele vistoriou os pontos de alagamento para fazer uma avaliação geral da situação e recuperar as áreas urbanas afetadas. Fetter se reúne hoje pela manhã com o secretário Nacional de Defesa Civil, Roberto Guimarães.
Ontem, as pessoas atingidas pela enxurrada receberam auxílio da Defesa Civil do Estado. Foram enviadas para a região oito carretas com colchões, lençóis, travesseiros, cobertores, 250 cestas básicas e 200 kits de limpeza. Mais mantimentos serão mandados durante o final de semana.
Em Pelotas, o quadro ainda preocupava em dois locais até a noite, na Vila Farroupilha e na área do Terminal de Ônibus, onde as vendas de passagens continuavam suspensas.
Nem os tesouros históricos escaparam da enchente, que castiga a cidade desde quarta-feira. As charqueadas, região onde o município se originou, foram tomadas pela água. As casas do século 19, parte delas preservadas da ação do tempo, foram atingidas e danificadas pela água do Arroio Pelotas.
Em algumas construções, o nível da água chegou a um metro. Foram poucas as estruturas que escaparam, entre elas a Charqueada São João, famosa pelas gravações da minissérie da Rede Globo Casa da Sete Mulheres.
A mesma sorte não teve a Charqueada Barão do Botuí, cuja reforma havia sido concluída no fim do ano passado. A dona da propriedade, a arquiteta Débora Stoll, pelotense residente na Inglaterra e que adquiriu a área há pouco tempo, só conseguia entrar no terreno de barco.
O centro da cidade, outra região tomada por prédios do século 19 e começo do século 20, teve as ruas tomada pelas águas no fim da tarde de ontem, quando um novo temporal atrapalhou a vida dos pelotenses. Em poucos minutos, as vias se transformaram em rios e o medo de uma nova tragédia tomou conta de todos. Nas vilas mais atingidas, moradores que já tentavam secar móveis e roupas, tinham que correr para colocar os seus objetos para dentro de casa novamente.
– Fizemos tudo o que foi possível até agora, mas o nosso maior medo é que venha mais chuva para cá, aumentando os flagelados e acabando com a cidade – afirmou a secretaria municipal de Cidadania, Beth Marques Dias.
O sol que apareceu durante boa parte do dia fez o nível da água baixar e ajudou moradores a fazer a limpeza na região. Móveis e roupas foram colocados para secar, e os baldes entraram em ação para enxugar as centenas de casas atingidas.
Para hoje, a Central de Meteorologia prevê forte redução da chuva e aumento do vento. As nuvens pretas devem permanecer sobre a área e pode haver chuva fraca. No domingo reaparece o sol, podendo haver somente uma garoa.
(ZH, 31/01/2009)