A terra onde Marta Ortega de Wing criou centenas de porcos até 10 anos atrás está sendo engolida pela selva - palmeiras, lagartos e formigas. Em vez de plantar e criar animais, ela agora faz compras no supermercado e seus filhos e netos vivem em locais como Cidade do Panamá e Nova York.
Aqui e em outros países tropicais ao redor do mundo, pequenas propriedades como a de Ortega de Wing - e áreas antes cultivadas muito maiores - estão revertendo à natureza, à medida que as pessoas abandonam suas terras e se mudam para as cidades em busca de condições melhores de vida.
Estas novas florestas "secundárias" estão surgindo na América Latina, Ásia e outras regiões tropicais em um ritmo tão veloz que provocou um sério debate sobre se o salvamento da floresta tropical primitiva - uma causa ambiental icônica - pode ser menos urgente do que antes se imaginava. Segundo uma estimava, para cada acre de floresta tropical derrubado a cada ano, mais de 50 acres de novas florestas surgem nos trópicos em terras antes cultivadas, desmatadas ou devastadas por desastre natural.
"Há muito mais floresta aqui do que há 30 anos", disse Ortega de Wing, 64 anos, que se lembra das plantações de manga e banana.
As novas florestas, argumentam os cientistas, poderiam abrandar os efeitos da destruição das florestas tropicais ao absorver o dióxido de carbono, o principal gás do efeito estufa associado ao aquecimento global, um papel crucial exercido pelas florestas tropicais. Elas também poderiam, em menor grau, fornecer um hábitat para espécies ameaçadas.
A idéia tem provocado ultraje entre os ambientalistas, que acreditam que esforços vigorosos para proteger a floresta tropical nativa devem permanecer uma prioridade. Mas a idéia vem ganhando terreno em organizações importantes como a Instituição Smithsoniana e a ONU, que em 2005 concluiu que as novas florestas estavam "aumentando dramaticamente" e seus benefícios ambientais eram "subestimados". A ONU está realizando o primeiro catálogo global de novas florestas, que variam enormemente em estágio de crescimento. "Os biólogos estavam ignorando estas imensas tendências populacionais e agindo como se apenas a floresta original tivesse valor de conservação, o que está errado", disse Joe Wright, um cientista sênior do Instituto Smithsoniano de Pesquisa Tropical daqui, que provocou uma tempestade no ano passado ao sugerir que as novas florestas poderiam compensar substancialmente a destruição da floresta tropical.
"Esta é uma verdadeira floresta tropical?" perguntou Wright, caminhando pela propriedade de uma antiga plantação de cacau americana que foi abandonada há cerca de 50 anos, apontando para as figueiras e vastas teias de aranha e macacos barulhentos.
"Um botânico pode olhar para estas árvores e dizer que é um recrescimento", ele disse. "Mas a temperatura e a umidade estão certos. Veja o número de pássaros! Funciona. Este é um hábitat adequado."
Wright e outros dizem que a proteção com excesso de zelo das florestas tropicais não apenas impede a população pobre local de lucrar com as florestas tropicais em suas terras, mas também desvia financiamento e atenção de outras abordagens para o combate do aquecimento global, como a eliminação das usinas a carvão.
Mas outros cientistas, incluindo alguns dos principais colegas de Wright, discordam, dizendo que a proteção à força das florestas tropicais é particularmente importante diante das ameaças da agricultura industrializada e da exploração de madeira.
A questão também provocou um debate sobre a verdadeira definição de floresta tropical. Como as antigas florestas se comparam às novas em seu valor ambiental? Toda floresta tropical é sagrada?
"Sim, há florestas ressurgindo, mas nem todas as florestas são iguais", disse Bill Laurance, outro importante cientista do Smithsoniano, que trabalhou extensamente na Amazônia.
Ele zombou ao ver a nova vegetação da propriedade de Ortega de Wing: "Esta é uma caricatura de uma floresta tropical!" ele disse. "Não há cobertura suficiente, há luz demais, há apenas poucas espécies. Há mudanças demais ao redor daqui esculpindo a floresta, de estradas a empreendimentos."
Apesar das novas florestas poderem absorver as emissões de carbono, ele disse, elas dificilmente salvarão as espécies mais ameaçadas da floresta tropical, que não têm como chegar até elas.
Todos, incluindo Wright, concordam que a destruição em grande escala das florestas tropicais na Amazônia e na Indonésia precisa ser limitada ou administrada. As florestas tropicais são os principais escoadouros de carbono do mundo, absorvendo as emissões que os seres humanos lançam na atmosfera e fornecendo um santuário para a biodiversidade.
Em questão está como computar os custos e benefícios das florestas, em um momento em que uma maior atenção está sendo dedicada à gestão do clima global e do carbono.
Wright - um cientista respeitado internacionalmente - disse que sabia que provocaria controvérsia ao sugerir em uma conferência de biólogos tropicais que a destruição das florestas tropicais poderia não ser tão ruim. Após ter vivido no Panamá por 25 anos, ele está convencido de que os levantamentos científicos do futuro das florestas tropicais não estão levando em consideração os efeitos da população e das tendências de migração que são óbvios no solo.
Na América Latina e na Ásia, as taxas de natalidade caíram dramaticamente; a maioria das pessoas tem dois ou três filhos. Novos empregos ligados à indústria global, assim como melhoria dos transportes, estão atraindo a população rural para cidades que estão crescendo rapidamente. Melhores técnicas agrícolas e acesso a sementes e fertilizantes significam que terras marginais não mais são cultivadas, porque são necessários menos produtores para alimentar a população crescente.
Gumercinto Vasquez, um trabalhador rural casual que estava capinando um campo em Chilibre sob sol escaldante, disse que ficou difícil para ele encontrar trabalho, já que muitas fazendas foram abandonadas.
"Muito poucas pessoas por aqui estão cultivando atualmente", ele disse.
Wright, olhando para a nova floresta, vê possibilidade. Ele disse que nova pesquisa sugere que 40% a 90% das espécies da floresta tropical podem sobreviver na nova floresta.
Laurance se concentra no que estará faltando, riscando espécies como onças, antas e uma série de aves e invertebrados.
Apesar de reconhecer que uma nova floresta pode absorver algum carbono, ele insistiu: "Este não é o ecossistema rico de uma floresta tropical".
Ainda assim, o destino das florestas secundárias não está apenas na biologia. Uma recessão global poderia eliminar empregos nas cidades, levando os moradores de volta ao campo.
"Estas são questões para economistas e políticos, não para nós", disse Wright.
(Por Elisabeth Rosenthal, NYT, UOL, 30/01/2009)