A cada sete imóveis construídos na região de Pinheiros, a mais valorizada de São Paulo, um não mantém áreas livres de concreto para absorver água da chuva, como estava previsto no projeto aprovado na prefeitura.
A projeção foi baseada em relatório de uma comissão da Subprefeitura de Pinheiros criada para comparar os projetos apresentados entre setembro de 2006 e junho de 2008 com a construção já concluída. O documento diz respeito aos imóveis nos distritos de Alto de Pinheiros, Itaim Bibi, Jardim Paulista e Pinheiros.
Foram analisadas 430 obras -em 60 delas (14%), a área permeável era menor ou inexistente. Pela lei de zoneamento, áreas mistas devem manter 15% do terreno livre de edificações -índice que dobra nos setores residenciais.
A restrição foi estabelecida para permitir que a água da chuva seja absorvida pelo solo e não escorra para ruas e avenidas, agravando as enchentes. O terreno livre de construções também ajuda a reduzir a temperatura da cidade.
Uma chuva de 50 mm despeja cerca de 500 mil l de água em uma quadra-padrão, de 100 m x 100 m. Se a área estiver concretada, a água vai para a rua. O percentual de irregularidades pode ser ainda maior, pois a comissão flagrou casos em que o proprietário, após a vistoria atestar que o imóvel estava adequado, fez obras para elevar a taxa de ocupação do terreno.
A fraude acontece, segundo o relatório, principalmente em prédios comerciais. Isso porque os preços dos imóveis e dos aluguéis na região de Pinheiros são muito altos e, aproveitando o máximo possível do terreno, o proprietário lucra mais.
Além da redução das áreas permeáveis, os técnicos descobriram que, entre os imóveis com alguma irregularidade, 28% tinham área construída superior à aprovada no projeto. A fraude reduz o IPTU (Imposto Predial e Territoral Urbano), tributo que considera o tamanho da construção.
Com base no relatório, os técnicos apontam a necessidade de intensificar a fiscalização das subprefeituras tanto em relação à área construída quanto à supressão de terrenos livres.Segundo a arquiteta Adriana Rolim de Camargo, coordenadora do grupo, ficou claro que só a fiscalização não conseguirá combater os problemas.
"O fiscal vai ao local, autua e cobra a regularização. O proprietário faz o serviço, mas em seguida refaz toda a cobertura no terreno. É preciso que a população se conscientize."
Nos casos analisados, diz ela, não houve aplicação de multa, mas a prefeitura negou a licença pedida pelo proprietário até o imóvel se ajustar ao projeto.
O relatório evidencia uma "situação grave" em SP, segundo o promotor José Carlos Freitas, da área de urbanismo do Ministério Público, que investiga obras irregulares na cidade há quase uma década.
"Fica demonstrado que a prefeitura não fiscaliza o andamento da obra. Quando o fiscal chega, a situação [obra ilegal] já está consolidada", diz.
Parte da responsabilidade, diz, se deve à legislação municipal. É que, em boa parte dos casos, basta uma declaração do proprietário e do engenheiro da obra atestando a suposta conformidade para a prefeitura liberar um imóvel. Mas, caso assinem documentos com informações falsas, ambos ficam sujeitos a processo por falsidade ideológica.
(Por José Ernesto Credendio,
Folha de S. Paulo, 30/01/2009)