O Ministério Público Federal na Paraíba (MPF/PB) propôs ação civil pública contra o Departamento Nacional de Obras contra as Secas (Dnocs) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), por inércia dos órgãos na conservação da área de preservação permanente, às margens do Açude Epitácio Pessoa (Açude Boqueirão). O açude está localizado no município de Boqueirão (PB), a 159 km da capital.
De acordo com o procurador da República Victor Carvalho Veggi, autor da ação, invasões e construções são realizadas diuturnamente ao longo da Área de Preservação Permanente (APP), sem que o Ibama e o Dnocs realizem qualquer fiscalização. Além disso, há o dano causado pelo uso de agrotóxicos nas plantações em torno do reservatório.
Segundo relata o procurador, em maio de 2007 foi instaurado um inquérito civil público para apurar a ocorrência de eventuais danos ao meio ambiente em decorrência do uso de agrotóxicos e da irrigação em plantações localizadas às margens do Açude Boqueirão.
Consta nesse inquérito um relatório de vistoria realizada pelo Ibama e Secretaria Estadual de Desenvolvimento da Agropecuária e da Pesca (Sedap), em que os fiscais detectaram várias irregularidades como revenda de agrotóxico sem receituário agronômico, inexistência de cadastro do estabelecimento junto ao órgão competente, venda de produtos de forma fracionada, produtos vencidos, produtos armazenados no mesmo ambiente onde se armazena ração animal, bem como a inexistência de local para recolhimento das embalagens vazias.
Também foi verificado que os agricultores usam produtos de alta toxidade desnecessariamente e não possuem equipamento de proteção. Há embalagens espalhadas dentro da área de plantio proporcionando contaminação do solo e da água do açude, além de agrotóxicos armazenados junto com alimentos e super dosagem de fungicidas e inseticidas.
Já as construções foram realizadas por particulares, sem licença ambiental, em área que pertence, em parte, ao Dnocs. Consta na ação que houve conivência do Dnocs e conhecimento do Ibama e que essas construções geram danos ambientais capazes de poluir a água do açude, comprometer a saúde da população, bem como de assoreá-lo.
Para o Ministério Público, a inércia do Ibama deu causa e estimulou as construções irregulares, bem como o início de atividades potencialmente poluidoras que sequer foram licenciadas, nem submetidas a estudo de impacto ambiental ao longo da APP do açude.
“Tais fatos foram constatados diuturnamente ao longo dos anos, seja através de ofícios expedidos pelo MPF, pela imprensa e pela própria população, porém o Ibama não exerceu de forma eficiente seu poder de polícia, capaz de evitar os danos sucessivos amplamente constatados inclusive por ele mesmo”, argumenta o procurador, complementando que “tanto o Dnocs como o Ibama estavam cientes das irregularidades. Mesmo assim, não agiram para evitar a apropriação do bem público por particulares, e acabar o cometimento permanente de crime ambiental ao reservatório”.
O MPF alerta que se os órgãos públicos continuarem inertes, haverá estímulos a novas construções no entorno do açude, bem como novas ocupações ao longo da propriedade pública sob domínio do Dnocs, incrementando os danos ambientais já existentes. “O mau desempenho do Ibama e Dnocs no exercício do poder de polícia vem estimulando as sucessivas construções, inclusive luxuosas, ao longo da APP”, relata a ação.
Durante o trâmite do inquérito civil os órgãos mencionados manifestaram profunda preocupação com os problemas ambientais afligidos na APP de Boqueirão, como se tal problema estivesse sendo causado por outros órgãos ou pessoas. “Afinal, se todos os órgãos mencionados expressam a preocupação com os danos ambientais existentes, por que é que tais ofensas ambientais continuam a ocorrer?” questiona o procurador e conclui: “tais danos ambientais, causados ao longo do tempo, devem ser depositados, primordialmente, ao poder público que sequer foi capaz de fazer cumprir obrigação por ele mesmo imposta”.
PedidosO MPF quer liminar para obrigar os réus a não concederem licença ambiental a qualquer atividade, construção ou instalação, na área de preservação permanente; realizarem a delimitação física da APP, no prazo máximo de sessenta dias, sob pena de multa diária; fiscalizarem ininterruptamente toda a área para evitar novas construções ou edificações; promover a desocupação dos imóveis construídos e ocupados irregularmente e realizar demolições das construções realizadas e que já foram notificadas pelo Ibama e pelo Dnocs.
Pede-se também que seja interrompida toda e qualquer atividade que não estiver licenciada, nem autorizada nos termos da legislação ambiental, realizando para tanto, interdições, aplicação de multa, embargos e demolições. O Ministério Público Federal requer ainda que os réus afixem, mantenham e conservem placas de alerta sobre os limites da APP, informando que a área de domínio do Dnocs é bem público que não pode ser apropriado por particulares.
Construído pelo Dnocs entre os anos de 1951 e 1957, o Açude Epitácio Pessoa possui capacidade superior a 535 milhões de metros cúbicos, com a finalidade de atender ao abastecimento humano e animal, tornar perene trecho do Rio Paraíba, irrigar, gerar energia elétrica e abastecimento de água da cidade de Campina Grande.
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Portal Correio, 28/01/2009)