Três grandes projetos de terminais portuários de multinacionais no Estado do Rio tiveram suas instalações reprovadas pelo governo fluminense por questões ambientais, sociais e econômicas, já que nenhum deles gerava ICMS para os cofres estaduais. A decisão final foi tomada pelo governador Sérgio Cabral, embasado em estudos do grupo técnico (GT) criado por decreto em outubro de 2008 e coordenado pela secretaria de Desenvolvimento, que avaliou 11 empreendimentos, oito terminais privados, um público e dois estaleiros. Não passaram no "pente fino" do GT os terminais da anglo-australiana BHP Billiton, da Ferrous Resources do Brasil Ltda. e o da Brazore, joint-venture entre a ArcelorMittal e a canadense Adriana Resources, cujos investimentos somavam cerca de R$ 5 bilhões.
Júlio Bueno, secretário de Desenvolvimento, que liderou este processo por considerar que o litoral fluminense estava ficando saturado por esse tipo de obra, disse ao Valor que todas as empresas com projetos enquadráveis, inclusive o do estaleiro da Marinha e do novo estaleiro que será licitado pelo Estado em março, foram ouvidas e tiveram seus documentos apresentados ao GT e exaustivamente analisados. "Não dá para ninguém brigar com a gente, pois vamos garantir o direito de embarque para todos em nossos portos, inclusive para os que ficaram de fora desta seleção". Bueno adiantou que os terminais privados aprovados com base na sustentabilidade - Petrobras, LLX Sudeste, CSN, Gerdau, Usiminas e o terminal de Docas - vão dispor de capacidade de 250 milhões de toneladas anuais de produtos, volume equivalente a quase toda exportação de minério do país.
O plano do governo estadual é buscar promover contratos "a preço justo" de uso dos novos terminais para as mineradoras excluídas da seleção, o que é atraente para o Rio, adiantou Bueno. Outra novidade anunciada por ele é permitir que estas empresas participem da licitação para construção e operação do terminal público da Cia. Docas do Estado do Rio, em Itaguaí, com capacidade de 50 milhões de toneladas de minério. "A licitação deve acontecer em breve, pois já estamos fazendo o licenciamento ambiental do projeto", contou o secretário.
Apesar destes acenos positivos do governo fluminense, as mineradoras multinacionais não se sentiram muito confortáveis com o fato de que seus planos de escoamento do minério que retiram das minas de Minas Gerais não poderem ser concretizados no litoral sul fluminense.
O presidente da BHPB no Brasil, Sebastião Ribeiro, procurado pelo Valor não quis se manifestar ontem sobre a questão. Em entrevista de agosto de 2008, Ribeiro admitiu que havia entregado o projeto de licenciamento do terminal portuário da companhia à Feema para começar a fazer os estudos do EIA-RIMA e disse que teria ouvido dizer que o parecer técnico do órgão ambiental teria sido contrário à construção do porto. Mesmo assim, ele se mostrou confiante numa solução, já que o terminal de minérios integrava um projeto da BHP de produzir minério de ferro no país e exportar no mínimo 50 milhões de toneladas anuais do produto. Esta era a capacidade prevista para o futuro Porto de Itacuruçá, situado no município de Mangaratiba, na Baia de Sepetiba, no sul do Estado.
A Ferrous Resources Brasil, com projeto na mesma região do terminal da BHPB, está considerando a possibilidade de aderir a estas alternativas de embarque levantadas por Bueno e que serão discutidas com estas empresas. Mas, Jório Dauster, presidente do conselho de administração da mineradora, que é formada por fundos de investimentos americanos, australianos e ingleses, que foi informado do veto ao projeto na terça-feira por Jùlio Bueno, disse que a companhia vai estudar a decisão do governo fluminense. "Não se pode impedir que a empresa embarque seu minério", declarou. Dauster informou que a Ferrous está ainda numa fase de estruturação de seus negócios no país e tinha planos de fazer uma abertura de capital na bolsa, iniciativa abortada pela crise financeira global.
Guilherme Moretson de Andrade, responsável pelo projeto do terminal da Brazore, braço brasileiro da mineradora canadense Adriana Resources, se surpreendeu com o veto ao projeto, situado também no município de Mangaratiba, em frente à ilha de Itacuruçá, na Baía de Sepetiba. Ele disse ao Valor não ter sido comunicado do fato. O comunicado da reprovação foi feito pelo secretário Julio Bueno à controladora do projeto, a gigante siderúrgica ArcelorMittal. Segundo fontes próximas da companhia, o veto não foi bem recebido pela gigante siderúrgica.
Andrade lamentou não ter sido comunicado, pois foi ele que apresentou o projeto ao GT em 22 de dezembro. "Não entendi este veto, se não apresentamos EIA-RIMA do projeto". Segundo destacou, o objetivo do terminal portuário, com capacidade de 45 milhões de toneladas ao ano, era dar suporte as atividades minerais da Adriana Mineração. Em 2008, a mineradora se associou no empreendimento com a Arcelor Mittal, que adquiriu participação de 80% no negócio.
Os três projetos reprovados estão situados na região de Itacuruçá, na Baía de Sepetiba, escolhida pelas companhias porque é servida pela ferrovia MRS. Mas o lugar apresenta forte fragilidade ambiental e vocação turística, segundo os estudos do GT. Por esta razão, as multinacionais receberam as piores notas entre os oito terminais privados examinados pelo grupo, que tinha representantes da secretaria estadual de meio ambiente, de transportes, da agência reguladora de transportes aquaviários, da Firjan e da Cia.Docas. Foi usada uma matriz com multicritérios para fazer a seleção dos projetos, com destaque para o item ambiental e a sustentabilidade do empreendimento.
Entre os projetos aprovados, o destaque foi o do terminal portuário da Petrobras, em Itaguaí. O terminal é estratégico para o pré-sal e vai envolver investimentos de R$ 4 bilhões. Vai contemplar dois terminais - um de granéis líquidos e outro de sólidos e cargas gerais, que terá um terminal de minério com capacidade de 50 milhões de toneladas. O complexo logístico vai render ao governo fluminense R$ 500 milhões de ICMS e R$ 200 milhões de ISS ao ano.
Bueno informou ainda que o governo estadual pretende negociar com Petrobras, CSN e Gerdau um compartilhamento dos píers de acesso aos berços para evitar conflitos de posições na área dos terminais em Itaguaí. Também já está conversando com Usiminas e LLX para que o projeto da siderúrgica, na mesma região, "com acesso ao mar", possa ser compartilhado com o da LLX. O projeto da LLX Sudeste foi analisado e aprovado pelo GT do governo estadual levando em conta este compartilhamento com a Usiminas. "Se não houver compartilhamento pode ter embolação. Vamos coordenar isso. Afinal, temos todo direito de regular a ocupação do nosso litoral", declarou Bueno.
(Por Vera Saavedra Durão,
Valor Econômico, 29/01/2009)