O debate sobre o universo das altas diluições ganha novo fôlego com o lançamento do livro "Signal and Images: contributions and contradictions about high dilution research". A obra reúne trabalhos apresentados nos simpósios anuais do Grupo Internacional de Pesquisa sobre o Infinitesimal (Giri, na sigla em francês).
Criado em 1986, o Giri é uma sociedade científica independente dedicada exclusivamente à pesquisa científica sobre altas diluições – um campo emergente que se estendeu, a partir do campo tradicional da homeopatia, para diferentes disciplinas e aplicações.
De acordo com a organizadora do livro, a professora Leoni Villano Bonamin, presidente do Giri de 2002 a 2008, a obra representa uma coletânea dos trabalhos mais interessantes apresentados nos simpósios anuais da instituição nos últimos seis anos.
“Cada capítulo é a síntese de um trabalho selecionado. A compilação dessas publicações periódicas reflete o estado atual da pesquisa sobre ultradiluições desenvolvidas pelos membros dessa sociedade científica”, disse Leoni à Agência Fapesp.
De acordo com Leoni, a homeopatia, formulada na Alemanha no século 18 e hoje reconhecida como especialidade médica, tem seu estatuto de ciência continuamente contestado por se utilizar de preparados com diluição acima do número de Avogadro, a constante física que torna possível calcular o número de moléculas em uma amostra com uma certa massa de uma substância. "Apesar disso, essas soluções ultradiluídas têm efeitos biológicos que ainda precisam ser explicados”, disse.
O livro está dividido em cinco partes: “Epistemologia”, “Pesquisa básica em modelos de física”, “Pesquisa básica em modelos biológicos”, “Pesquisa clínica”, “Pesquisa e prática clínica veterinária” e um epílogo que apresenta, segundo a pesquisadora, “uma perspectiva da possibilidade de se utilizar a homeopatia como uma ferramenta de baixo custo e eficiente para tratamento de problemas endêmicos em regiões menos favorecidas”.
Segundo Leoni, o Giri é dedicado ao estudo de todas as formas e aplicações das altas diluições, incluindo a homeopatia. “A aplicação das altas diluições segundo o princípio da similitude é o que chamamos de homeopatia. Esta é a questão mais polêmica deste tema”, afirma.
Tradicionalmente, o princípio da similitude – semelhante cura o semelhante – foi descrito por Hipócrates no século 5 a.C. e resgatado por Samuel Hahnemann no final do século 18, quando as bases da homeopatia foram lançadas. Mas hoje, diz, a homeopatia está perdendo seu caráter doutrinário, instituído por Hahnemann, e passando a se constituir como uma ciência, ou seja, sendo passível de observação sistemática e objetiva.
“Atualmente, o princípio de similitude pode ser visto como um fenômeno biológico, demonstrável através de modelos experimentais adequados, e não mais como uma ‘lei’ ou ‘crença’, como reza o senso comum”, destaca.
Para avançar nesse tema, a multidisciplinaridade é uma condição fundamental, de acordo com Leoni. Outro aspecto da multidisciplinaridade dos estudos em homeopatia, diz ela, vem da necessidade de se compreender o fenômeno homeopático com novos paradigmas.
“Uma das grandes contribuições recentes que têm despontado no cenário científico é o conjunto de trabalhos publicados sobre as mudanças das propriedades físico-químicas da água após o processo de diluição seriada de substâncias. Todos esses trabalhos são feitos por físicos, em universidades conceituadas”, conta.
“Mas isso ainda não é suficiente. É preciso também o correspondente do lado biológico”, disse. Para Leoni, é preciso desenvolver modelos biológicos que possam corroborar ou não os achados experimentais obtidos nas pesquisas físicas. Para que se encontrem modelos biológicos adequados, “é preciso recrutar pesquisadores de diferente áreas: imunologia, patologia, neurobiologia, fisiologia, toxicologia, bioestatística, bioinformática e assim por diante”.
“É importante destacar o ineditismo da iniciativa, tanto do grupo como do livro em organizar uma atividade científica séria e rigorosa em torno de um tema tido como ‘maldito’ e até certo ponto negligenciado pela comunidade científica – que tradicionalmente rejeita a homeopatia como ciência – e pela comunidade homeopática mais conservadora, que historicamente rejeita a ciência cartesiana como ferramenta útil para entender a homeopatia. Estamos abrindo novos espaços”, diz.
O principal objetivo do Giri, acrescenta, é reunir pesquisadores atuantes em universidades e institutos de pesquisa comprometidos em desenvolver pesquisa de alto nível metodológico sobre o tema. Atualmente, o grupo conta com cerca de 150 membros em todo o mundo. “É um número pequeno, mas o universo da pesquisa séria sobre homeopatia e altas diluições é de fato bem reduzido”, afirmou.
Signals and Images: contradictions and contributions about high dilution research
Organizadora: Leoni Villano Bonamin
Lançamento: 2008
Preço: US$ 209
Mais informações, clique aqui.
(Por Alex Sander Alcântara, Agência Fapesp, 27/01/2009)