O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) encerrou seu encontro em comemoração aos 25 anos de existência em Sarandi, no norte do Estado, impelido a marchar por novos caminhos. A preocupação em reconquistar espaço social e peso político perdidos, manifestada durante o evento, que se prolongou de terça-feira a sábado, motiva uma mudança de rumos alinhavada em solo gaúcho. O encontro ainda marcou a ruptura entre a organização e o governo federal, que sequer foi convidado para a celebração.
Onovo mapa dos sem-terra destaca os centros urbanos e o alto-mar brasileiro como alvos da nova mobilização campesina. Apesar disso, a ameaça feita ao final do evento é de que as tradicionais invasões de terra serão intensificadas este ano.
Nos cinco dias do 13º Encontro Nacional do MST, no assentamento Novo Sarandi, os líderes decidiram reforçar os laços com entidades citadinas.
– A ligação com as cidades não é nova, já que 20% dos assentados no Estado vieram delas, mas pode ser aprofundada não para arregimentar sem-terra, e sim diversificar a ação do movimento – avalia o professor de Sociologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Ivaldo Gehlen, especialista em desenvolvimento agrário.
A estratégia inclui chegar às cidades com o auxílio de sindicatos de servidores públicos e centrais de trabalhadores participando de mobilizações conjuntas, mas não exclui ações como invasões de empresas urbanas.
– O MST sempre esteve presente nas cidades. Só vamos intensificar nossas lutas – diz um líder do movimento.
A voltagem das ações do MST foi outro ponto de discussão. Um grupo de sem-terra entende que o movimento deveria adotar uma postura mais moderada em vez de apostar em ações agressivas capazes de desgastar a imagem dos sem-terra. Ao eleger a defesa do petróleo como uma riqueza a ser controlada exclusivamente pelo governo brasileiro, o MST pode estar apontando uma solução intermediária para este embate interno de forças, já que é um tema com maior apelo à sociedade civil.
– Essa questão do petróleo é uma novidade por parte do movimento, e tem um caráter nacionalista. É uma palavra de ordem com muito apelo social – avalia Gehlen.
Irritado com os investimentos do Planalto na reforma agrária e com a velocidade na distribuição, o MST também sinalizou o divórcio com o governo Lula, um tradicional aliado. O protesto dos sem-terra encontra uma das justificativas para a ruptura nos números do Ministério de Desenvolvimento Agrário. De R$ 1,666 bilhão previsto para 2008, o governo só gastou 44,24%.
Petróleo passa a ser slogan
A retomada do slogan “O Petróleo é Nosso” seria ainda uma maneira de reverter o processo de enfraquecimento político enfrentado pelos sem-terra nos últimos anos, conforme Gehlen. Esse fenômeno se expressa também de forma estatística. Com os 24,6 mil hectares de terra adquiridos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no Rio Grande do Sul, por exemplo, o prometido assentamento de 1,5 mil famílias poderia esvaziar sensivelmente os acampamentos existentes no Estado.
Por isso, diversificar as bandeiras de luta seria uma forma de garantir a sobrevivência do próprio movimento, que prometeu intensificar o processo de invasão de terras este ano. O fato de 2009 não ser ano eleitoral facilita a maior disposição de ocupar áreas, já que não desgasta parceiros políticos. A flexibilização do MST incluiu até assumir uma prática até então condenada. Durante uma coletiva de imprensa em que o movimento enumerava as conquistas dos 25 anos de existência, uma porta-voz admitiu a presença de lavouras de soja transgênica em assentamentos do norte gaúcho.
Além da presença de integrantes do movimento, a comemoração reuniu políticos e simpatizantes do MST. Até o final da manhã de domingo, alguns dos cerca de 1,5 mil participantes do encontro permaneciam no local desmontando a estrutura organizada para a festa.
Desde sexta-feira, a Brigada Militar aumentou o policiamento na região para impedir ações do MST. Batalhões da Brigada Militar de Passo Fundo, Porto Alegre e Santa Maria montaram barreiras em estradas vicinais e rodovias que davam acesso ao local do evento, com controle de pessoas e veículos.
O objetivo da polícia era impedir uma possível ação do MST na região já que, no início da semana passada, a inteligência da polícia tinha informações de que o movimento poderia entrar novamente na Fazenda Coqueiros (invadida 12 vezes pelos sem-terra e distante 25 quilômetros do local do encontro), empresas multinacionais do agronegócio (Bunge e Monsanto) ou bloquear estradas.
(ZH, 26/01/2009)