Livro utiliza relato dos pescadores da Baía de Guaratuba para ressaltar a importância da preservação ambientalRelatos de sete pescadores da Praia de Caieiras, em Guaratuba, são o pano de fundo para o livro Baía de Guaratuba – Peixes e Suas Histórias, lançado no último sábado em parceria entre a ONG de educação ambiental Instituto Guaju e a Secretaria Estadual de Meio Ambiente. A partir do relato dos pescadores, dois pesquisadores da ONG, os zootecnistas Marcio Nascimento e Rodrigo Bertoli, listaram os principais peixes da região.
“Nosso objetivo era preparar um material que elucidasse o potencial da baía e valorizasse todos os peixes encontrados nela”, explica Bertoli. Ao entrevistar a comunidade para obter informações sobre a fauna, eles se depararam com o universo dos pescadores. “Nós descobrimos a riqueza da cultura do pescador artesanal. Foi o ‘tempero’ que conseguimos encontrar para o livro”, diz Nascimento.
A obra aborda as características técnicas de 28 espécies de peixes, como o linguado, tainha e robalo e onde podem ser encontrados. Além disso, explica como era a pesca artesanal até 1970, quando era feita exclusivamente na baía graças à fartura dos cardumes, bem como a evolução do ofício e a necessidade de ações sustentáveis e de preservação ambiental para que a atividade não seja ameaçada. A publicação traz ainda a legislação ambiental para a pesca e informações sobre como dar destinação adequada aos resíduos gerados pela atividade.
Dão seus depoimentos pescadores como João Trajano Alves, natural de Barra Velha (SC) e morador de Caieiras há 44 anos. O pescador é conhecido como Generoso pelos companheiros. “Gosto de ir para o mar com a gurizada e ensinar o pessoal. E acabo sempre aprendendo alguma coisa com eles”, conta. O ensinamento mais importante do ofício que aprendeu aos 8 anos com o pai é a prática. “Saber como está a maré, se a força da água está para o Sul ou para o Norte. Aprendi tudo isso com a experiência”, conta. O mar é um velho companheiro. “Foi ele que me deu o pão para sustentar a família.”
Com 64 anos, o pescador continua na lida. Acorda todos os dias às 4 horas para lançar a rede ao mar e só volta às 11. No fim da tarde tem mais: deixa a casa às 18 e só retorna entre meia noite e 1 hora.
ParceriaO velho companheiro é Agenor Gabriel Linhares, 63 anos, parceiro há 30 de Trajano e pescador mais antigo de Caieiras. “Quando vim para cá, com 17 anos, só tinha quatro casas, nem estrada tinha”, diz. Até um tubarão de 300 quilos os dois dizem já ter pescado juntos. “Dá um prazer enorme quando vem lá do fundo aquele bichão engatado na rede”, fala Agenor.
Desde cedo, Agenor aprendeu a arte de entalhar redes. As primeiras eram feitas com fibra de tucum, árvore típica da região, e os cabos feitos de cipó. “Tinham que ser pintadas a cada dois meses com uma tinta feita com caule de bananeira para não estragarem”, conta.
Recordações de sustos a bordo todos têm. O maior deles quem conta é Ivo Chiodini, que ficou no mar oito dias. “Eu estava com dois sobrinhos que na época tinham 14 e 15 anos. A tempestade pegou a gente quando estávamos longe”, relembra o pescador, que passou os dias tirando água do barco para não afundar. Por sorte tinham levado comida e água a mais, que racionaram. Quando voltaram para casa, os familiares já acreditavam que os três estavam mortos.
Ivo, que mora há 22 anos em Caieiras, explica que na época só as grandes embarcações possuíam rádio comunicador, sonda ou radar. “Era mais no tino mesmo. Na percepção de como estava a água ou pelo céu. Aquele dia falhou e quando pegamos a tempestade era tarde.”
Serviço:O livro Baía de Guaratuba – Peixes e suas Histórias pode ser solicitado pelo site www.institutoguaju.org
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Gazeta do Povo, 23/01/2009)