Quando todo o tráfego aéreo nos Estados Unidos foi interrompido após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, os cientistas tiveram uma oportunidade inesperada para testar idéias sobre os efeitos no clima das trilhas de condensação deixadas para trás por turbinas de aviões. Um estudo em 2002 sugeriu que esses rastros de fumaça podem ter efeito significativo nos padrões diários de temperatura. Mas agora uma nova análise alega que os padrões de temperatura nos EUA durante esses três dias sem vôos podem ser explicados por variações naturais na cobertura de nuvens, e não pela ausência de aviões.
Os rastros de aeronaves podem se dispersar em altas nuvens na atmosfera, semelhantes a cirros. Embora parecidas com nuvens naturais, acredita-se que elas tenham um efeito de aquecimento no planeta. Mas elas também podem moderar os extremos de temperatura diários, capturando o calor que escapa do solo e refletindo a luz solar. Isso eleva temperaturas mais baixas durante a noite e, em menor grau, reduz as altas durante o dia, sugerem os cientistas.
Com a projeção de crescimento do tráfego aéreo em 2 a 5% por ano no futuro próximo - chegando a 2050 com pelo menos o triplo do tráfego atual - os efeitos desses rastros podem se tornar um importante fator na mudança climática. Mas meteorologistas ainda não têm certeza sobre a escala do impacto desses rastros.
Teoria ou fato?
Dois estudos observaram que quando os aviões pararam de voar no período de 11 a 14 de setembro de 2001, a variação da temperatura diária média nos Estados Unidos cresceu de forma marcante.
Os três dias excederam os períodos anterior e posterior numa média de 1,8 °C. A dimensão incomum da mudança, afirma David Travis da Universidade de Winsonsin-Whitewater, que conduziu os dois estudos anteriores, sugeriu que, na ausência de rastros de aeronaves, a variação de temperatura aumenta significativamente. Mas a idéia, afirma, é "mais uma hipótese" que uma conclusão certa.
Uma pesquisa conduzida por Gang Hong, meteorologista da Universidade Texas A&M de College Station, agora sugere que essa hipótese está errada. Examinando em estações meteorológicas americanas os padrões da cobertura de nuvens e da temperatura no início de setembro entre 1971 e 2001, Hong e seus colegas descobriram que nuvens mais pesadas e baixas são a influência dominante sobre os extremos de temperatura, enquanto nuvens altas como os rastros aeronáuticos provocam, no máximo, um efeito menor. Eles acrescentam que as variações de temperatura de 2001 parecem estar dentro da variabilidade natural dessas décadas.
O trabalho de Hong não prova que os rastros não provocam mudanças na temperatura, apenas que provavelmente não desempenham um papel preponderante, afirma Ulrich Schumann, diretor do Instituto de Física Atmosférica do Centro Aeroespacial alemão de Oberpfaffenhofen, próximo a Munique.
Mas, alerta Schumann, os debates públicos exageraram os efeitos dos rastros, uma vez que os eventos de 2001 foram muito chocantes. "Alguns argumentos científicos fracos foram mal utilizados", afirma.
No alto
A pesquisa de Hong e seus colegas, publicada na Geophysical Research Letters, segue outro estudo que defende que as variações de temperatura em setembro de 2001 podem ser explicadas pelo tempo claro e seco nos dias cruciais, e que os resultados de uma modelagem climática não sustentam o argumento dos efeitos dos rastros defendido pelo grupo de Travis.
Travis, entretanto, defende suas descobertas. Ele enfatiza que nunca assumiu a premissa de que a ausência da fumaça de aviões tenha sido a única causa das largas variações de temperatura. "Sempre dissemos que foi a combinação da falta de aviões com as condições climáticas naturais", afirma.
Como a análise de Hong estudou nuvens altas em geral - e não os rastros em particular - Travis diz que não há na pesquisa conclusões específicas sobre o papel dos rastros aeronáuticos. "Seus cálculos da influência das nuvens não levou em consideração esses rastros", disse. "Eles estavam observando apenas as nuvens naturais, e não a presença ou ausência de rastros".
Ele acrescenta que o estudo de Hong demonstra que um aumento da variação da temperatura diária média de 1,8° C é extremamente raro. E embora os eventos anteriores nessa escala possam ser explicados por efeitos meteorológicos locais, diz Travis, o salto observado em 2001 não se sustenta apenas por eles. Travis mantém que os rastros são um fator importante na mudança climática. "Cedo ou tarde esses impactos serão sentidos", disse.
(Por NatureAnna Barnett, Terra, 20/01/2009)