A contaminação química e tóxica do rio Noosa, no norte da Austrália, pode ser responsável pelas mutações fatais encontradas em peixes da região. Milhares de larvas da espécie Basa têm nascido com duas cabeças e, segundo informações do especialista em animais aquáticos e membro da faculdade australiana de cientistas veterinários, Matt Landos, a larva mutante encontrada no rio tem sobrevivido apenas 48 horas, o que indica que estão morrendo em massa.
"Eu tenho trabalhado na cultura aquática por cerca de 10 anos e esta é a primeira vez que eu vejo algo como isto", informa.
Testes têm excluído a presença de vírus ou bactérias na água, conduzindo Landos a suspeitar que os inseticidas usados em uma plantação de macadâmia - pequena oleaginosa mais parecidas com a amêndoa - vizinha à região sejam responsabilizados pelo ocorrido. "Isso deixa-nos pensar que a contaminação química tóxica da água é a mais provável causa do ocorrido. Os produtos químicos podem ter se juntado ao rio após a pulverização da plantação (...) eu acredito que alguns destes produtos estão impactando a habilidade da criação deste peixe", disse.
Embora não haja ainda nenhuma prova concludente que ligue a exploração agrícola aos peixes nascidos com duas cabeças, o proprietário de uma incubadora, Gwen Gilson, e residentes próximos à região alegam que os produtos químicos usados na plantação de macadâmia podem ser a causa do ocorrido. A deformidade dessa espécie, segundo informaram, aumentou na medida em que a plantação se expandiu nos passados dois anos.
"Alguns embriões nasceram com duas cabeças, outros tiveram duas cabeças iguais e uma cauda pequena, já outros nasceram com uma cabeça longa grande e uma cauda pequena que sai da própria cabeça", informou o proprietário.
Os fazendeiros em questão se declinaram a comentar as acusações.
Matt Landos enviou, no ultimo mês de outubro, um relatório ao Departamento de Indústria Primária e Pesca do Estado de Queensland no qual identificou o pesticida endosulfan e o fungicida carbendazim, ambos usados na plantação vizinha, como os prováveis culpados. “O sincronismo entre a pulverização da névoa e as larvas afetadas coube como uma luva", disse.
No documento, o especialista reporta às autoridades ter encontrado deformidades também em galinhas, ovelhas e cavalos da região. Os animais têm apresentados altos níveis de mortes fetais assim como deformidades congênitas.
O uso de ambos os produtos químicos é atualmente legal na Austrália. Carbendazim foi retirado voluntariamente do mercado dos EUA em 2001 pela companhia química Du Pont. O Endosulfan já é proibido em 56 países.
De acordo com Lando, aproximadamente 90% das larvas encontradas no rio de Noosa têm a deformidade. Embora diga que as concentrações das toxinas são provavelmente baixas bastante para que não haja nenhum perigo para as pessoas que nadem ou se alimentem dos peixes do rio, ele igualmente adiciona que “não gostaria de ver meus filhos nadando ao lado de um lugar que usasse estes produtos químicos ou que bebessem água proveniente desta fonte".
O governo de Queensland disse que os testes não deram nenhuma indicação que a exploração agrícola da macadâmia usasse os produtos químicos encontrados na água. O Departamento local da Pesca também está investigando o ocorrido e espera receber no próximo mês resultados dos testes dos peixes mortos.
Sob controle
As autoridades australianas especializadas em pesticidas insistem que tudo está sob controle. Informaram ter acabado uma revisão sobre o uso do endosulfan em 2005. Fez-se, assim, o endurecimento das regras que governam seu uso. Por exemplo, as plantas tratadas com o endosulfan não poderão mais ser usadas como alimento aos rebanhos animais. No entanto, traços do pesticida ainda poderão ser encontrados em alimentos como abacates, vegetais, macadâmia e maracujá, alem do algodão, segundo informou Simon Cubit.
"Mais de 200 produtos químicos são aprovados para o uso em plantações de macadâmia. Nós não temos visto nenhuma evidência que o endosulfan, quando usado corretamente, cause problemas. Toda a evidência que se levantar será considerada", disse Cubit.
Ele acrescenta ainda que o fato de outros países terem proibido o pesticida não significa que a Austrália esteja negligente quanto ao assunto. As circunstâncias do país são únicas, e outros países cancelaram a permissão do produto químico por diversas razões.
Algumas proibições, lembra, são resultadas de decisões políticas de nível elevado, tais como aquelas que estão sendo feitas pela União Européia. Apesar da intensa pressão do agronegócio, a UE está conseguindo diminuir o uso de inseticidas, impulsionando assim a promoção da agricultura orgânica. Isto produz um alimento mais limpo e saudável para as pessoas e melhor para o ambiente.
A sociedade australiana sobre macadâmia veio a público dizer que as plantações agrícolas de macadâmia no rio de Noosa usam o pesticida corretamente. Uma autoridade foi enviada ao local para investigar o ocorrido.
Pelo mundo
Na semana passada a Nova Zelândia transformou-se no 56° país a proibir o endosulfan, um organoclorado (mesma família que o DDT) que a Agência de Proteção Ambiental dos EUA classifica como categoria 1: altamente tóxico.
Em 2006, em Kerala, na Índia, compensação foi paga às famílias de 135 povos que tinham morrido em conseqüência da pulverização do endosulfan. Os estudos mostraram que a exposição ao inseticida tinha causado defeitos congênitos e tinha atrasado igualmente a maturidade sexual dos meninos.
Em outubro a convenção de Estocolmo sobre orgânicos poluentes persistentes deve considerar elevar o pesticida ao estágio final de avaliação, o que poderá conduzir a uma proibição mundial.
(Por Tatiana Feldens, AmbienteJá, com informações do The Sydney Morning Herald, 19/01/2009)