A rixa entre a Rússia e a Ucrânia pelo preço do gás natural e as taxas de transporte deixaram muitas pessoas na Europa sem aquecimento. Ainda assim, o que é frustrante é que a disputa sempre pareceu ter mais questões técnicas e ser facilmente solucionável, se houvesse a menor vontade de ambas as partes. Apesar de tudo, ambos os países querem lucrar vendendo suprimento para a Europa.
O último acordo desmoronou nesta terça-feira, em uma cacofonia de reclamações familiar, e contra reclamações, e outra vez um assunto trivial parecido. Com os monitores da União Européia (UE) junto aos oleodutos para ter certeza de que a Ucrânia não desviaria nenhum gás de seu destino, a Rússia concordou em retomar os suprimentos para a Europa.
Mas, ao invés de pressionar novamente o sistema de oleoduto ucraniano para exportações, a companhia do monopólio de gás russo, Gazprom, ordenou um simples teste de suprimento para ver se passaria via Ucrânia para a Europa, através de um oleoduto que estava sendo usado para carregar a cidade ucraniana de Odessa. As autoridades ucranianas negaram, dizendo que eles não queriam cortar os suprimentos de seu próprio povo, e a Rússia novamente interrompeu o carregamento – não relutantemente, acreditam alguns especialistas.
Especialistas políticos dizem que nenhum dos lados é motivado por esclarecer a disputa, porque não tem nada a ver com os assuntos colocados. Ao invés disso, tudo isso é um mandatário para questões muito mais fundamentais e insolúveis, particularmente a volta da Ucrânia para o ocidente em 2004, na “Orange Revolution”, que balançou profundamente os nacionalistas da Rússia.
“O lado russo está apelando para diversos detalhes técnicos para explicar porque quer que o conflito ainda continue”, disse Vladimir S. Milov, presidente do Instituto de Política de Energia em Moscou e ex-vice-ministro da energia da Rússia, em uma entrevista por telefone.
“É muito fácil ver o desejo de pressionar os políticos da Ucrânia, e pressioná-los para que se eles continuarem a perseguir a linha pro-ocidente e não aderir às regras impostas por Moscou no espaço pós-soviético, eles enfrentarão dificuldades”, disse ele.
Os nacionalistas em Moscou poderiam engolir a perda dos Estados Bálticos e as ex-colônias da Rússia na Ásia central, mas nunca irão aceitar a idéia de os ucranianos, quase metade deles são etnicamente russos, serem membros de um Estado, independente, com orientação ocidental, e potencialmente participante da OTAN.
Alguns outros analistas apontam para as consequências do conflito da Geórgia no meio do ano passado como outro ponto de problema, mostrando que depois da guerra o presidente russo, Dmitri A. Medvedev, pediu o “esfera de influência privilegiada” sobre os Estados soviéticos.
“Essa é uma continuação da guerra entre a Rússia e a Geórgia, só que por outros meios”, disse Grigory N. Perepelitsa, diretor do Instituto de Pesquisa de Política Externa, um braço do Ministério do Exterior ucraniano, em uma entrevista por telefone. “Lá eram tanques, aqui é o gás”. Embora, agora, a Europa também esteja sofrendo, com centenas de milhares de pessoas no sul da Europa vivendo sem aquecimento por seis dias e fábricas fechando em diversos países. Oficiais europeus imploraram novamente que os dois países resolvessem esse desacordo.
Pia Ahrenkilde Hansen, porta-voz da Comissão Européia, disse: “Pouco ou nenhum gás está sendo recebido atualmente. Não estamos na etapa de pular para conclusões. Mas essa situação é obviamente muito grave e precisa melhorar rápido. Nós realmente precisamos chegar ao fundo disso”. Mas chegar ao fundo dos objetivos da Rússia, disse Perepelitsa do Ministério do Exterior ucraniano, vai bem além dos detalhes industriais do trânsito de gás.
Autoridades em Moscou estão procurando tirar os créditos da liderança ucraniana e retratar a Ucrânia como um Estado falido, disse, enquanto demonstram aos países centro-europeus que apoiaram a participação da Ucrânia na OTAN, que eles podem congelar se continuarem a fazer isso. Também está em jogo uma profunda hostilidade pessoal entre o primeiro-ministro da Rússia, Vladimir V. Putin, e o presidente da Ucrânia, Victor A. Yushchenko.
(Por ANDREW E. KRAMER, The New York Times, 14/01/2009)