A guerra do gás entre russos e ucranianos ameaça degenerar numa crise do nuclear na União Europeia. Isto depois de a Eslováquia, um dos países mais afectados pelos cortes no fornecimento de gás natural, ter anunciado que vai reactivar um dos reactores nucleares que foi obrigada a desactivar por falta de segurança.
A Áustria, vizinho antinuclear, foi dos primeiros Estados membros a manifestar-se contra esta decisão. A Comissão Europeia já avisou que esta constitui uma violação ao próprio tratado de adesão da Eslováquia. Mas o primeiro-ministro checo e presidente em exercício da UE disse compreender perfeitamente a decisão tomada pelo Governo eslovaco, sob críticas da oposição. "Vejo isto como uma demonstração da sua disposição para resolver um problema que a União Europeia não pode resolver pela Eslováquia - uma ameaça de apagão", disse Miro Topolonek, citado pelas agências internacionais.
O chefe do Governo da Eslováquia, Robert Fico, anunciou no sábado à noite a reactivação de um reactor da central nuclear Jaslovske Bohunice, de tipo soviético, o qual tinha sido desactivado a 31 de Dezembro - uma obrigação que consta do tratado de adesão deste país à UE. A Eslováquia, que entrou em 2004, tem uma dependência de 98% das importações de petróleo e gás russos que transitam pela Ucrânia. O país, que importa 20% da sua electricidade, está sem fornecimento de gás desde a passada terça-feira. As restrições já obrigaram empresas como a francesa PSA e a sul-coreana Kia Motors a parar a sua produção.
"O Governo decidiu, no interesse da Eslováquia, da indústria e dos cidadãos, iniciar trabalhos técnicos para que o reactor seja relançado rapidamente", afirmou Fico, citado pela AFP, alertando para o risco de apagão. Ao mesmo tempo em que garantiu que o reactor de Jaslovske Bohunice "cumpre todos os critérios de segurança e parou por motivos políticos". Além da Eslováquia, também a Bulgária ameaçou resgatar reactores desactivados por exigência da UE, como os da central de Kozloduy. A Lituânia, que até final do ano tem de fechar a central de Ignalina, já indicou que pode não fazê-lo para fazer face aos cortes de gás por parte dos russos.
O debate sobre o nuclear, um tipo de energia que no pacote do clima da Comissão Europeia é deixado ao critério de cada um dos 27 da UE, regressa numa altura em que os ministros da Energia se reúnem hoje em Bruxelas para reflectir sobre a dependência europeia do gás russo que transita pela Ucrânia (25% do total do fornecimento aos países da UE). Os observadores exigidos por Moscovo já começaram a chegar à Ucrânia, após o acordo de sábado à noite.
Apesar disso a União Europeia ainda não voltou a ter gás, por ordem do Presidente Dmitir Medvedev, que fala em irregularidades no acordo. O primeiro-ministro, Vladimir Putin, falou, por seu lado, em 595 milhões de euros de prejuízo na Gazprom. E os europeus, que denunciam a chantagem de russos e ucranianos, percebem agora que os observadores não eram, afinal, a chave do problema.
(Por Patricia Viegas, Sapo.PT, 12/01/2009)