Fenômenos meteorológicos distintos dividem estados em duas partes: no litoral, excesso de chuvas; no interior, estiagemA ocorrência simultânea de dois fenômenos meteorológicos e a falta de preparo do país para evitar catástrofes naturais levaram a Região Sul do Brasil e viver uma situação inusitada: enquanto no litoral há cidades em estado de emergência por excesso de chuvas, no Oeste do Rio Grande do Sul e do Paraná vai aumentando o número de municípios que sofrem com a estiagem.
Santa Catarina, onde 13 municípios declararam emergência, sofre com a segunda grande enchente em menos de dois meses: no fim do ano passado, 135 pessoas morreram no Vale do Itajaí. Agora, a região mais afetada é o Litoral Sul. No Rio Grande do Sul, a faixa litorânea também tem chuva em excesso: no interior, porém, são 46 cidades em estado de emergência por causa da seca.
Estiagem afeta lavoura e pesca no interior do ParanáOs efeitos da seca no Oeste do Paraná vêm crescendo nos últimos meses. O Rio Paraná, um dos maiores do estado, vem tendo baixas na vazão e em alguns trechos deixou de ser navegável. Os problemas mais graves, porém, são para a agricultura. Lavouras de milho e feijão estão entre as mais afetadas. Por isso a preocupação em decretar emergência: os decretos permitem, entre outras coisas, o refinanciamento de dívidas agrícolas.
Quanto mais sol, melhorA enchente do final de 2008 deixou 135 mortos e um trauma para Santa Catarina. Os moradores do litoral do estado não querem nem ouvir falar em chuva. A dona de casa Andréia Gonçalves, de Laguna, é um exemplo. Além de sofrer com o mau tempo, a empresa de lava-carros do marido entra no prejuízo quando chove. Só que quando Andréia conversa com a mãe por telefone, volta a pensar que chuva pode ser bom. A família de Andréia é de Bagé, no Rio Grande do Sul, e sofre com a seca no verão.
Andréia se mudou para Laguna há dois anos e meio e conhece o sofrimento de quem passa pela seca. “Ficam sem água, principalmente as vilas que são mais distantes. O pessoal tem que buscar caminhão-pipa”, diz. “Lá, a seca é rotina. Se não chover no inverno, verão é seca na certa. Aqui (em Laguna), quanto mais sol tiver, melhor.”
A educadora física e terapeuta holística, Lilian Raquel Werner, é de Marechal Cândido Rondon, no Paraná, onde tem chovido pouco. Mas desde dezembro não está mais no município. Depois de 16 horas de viagem, chegou ao litoral catarinense, na Praia da Galheta, onde pegou um final de semana chuvoso. “Ficamos três dias em casa só com chuva”, reclama.
No Paraná, até o momento, há três cidades em estado de emergência devido à estiagem: Ponta Grossa, Renascença e Saudade do Iguaçu. Mas quase todos os municípios das regiões Oeste, Sudoeste e Noroeste sofrem com a falta de chuvas. “No segundo semestre houve pouca chuva nessas regiões. E a chuva veio irregular: podia até chover forte, mas depois ficava muito tempo sem precipitação”, explica o meteorologista Marcelo Bauer Zaicovski, do Simepar.
A explicação dos fenômenos meteorológicos que levaram seca e enchente a preocuparem os mesmos estados – e ao mesmo tempo – tem relação com a Zona de Convergência do Atlântico Sul. A imensa frente fria que se forma de setembro a março sobre a porção norte do país veio com mais força neste ano. Isso impede que outras frentes frias sigam seu caminho normal, indo para norte. Estacionadas sobre Sul e Sudeste, elas fazem com que o vento sopre do oceano para o continente, trazendo chuvas.
Do outro lado, o Oeste do Paraná e dos estados vizinhos fica à mercê de um fenômeno equivalente ao La Niña: um resfriamento do Pacífico que, entre outras coisas, cria massas quentes e secas sobre a região. “E a Serra Geral barra a passagem de 90% da umidade para o interior”, afirma Zaicovski.
DespreparoSe por um lado a meteorologia causa problemas, por outro a falta de preparo do país para enfrentar problemas naturais também pode ter influência nos estragos. Coordenador Geral do Departamento de Minimização de Desastres da Secretaria Nacional de Defesa Civil, Sérgio José Bezerra deu ontem declarações à imprensa dizendo que o Brasil não se prepara para catástrofes naturais. “A ação preventiva não é levada a sério no Brasil”, disse.
A falta de Defesa Civil é um dos principais problemas: de cada quatro municípios do país, um não tem qualquer estrutura do gênero. No Paraná, a situação é melhor. “Somos uma exceção no país. Todos os municípios têm Defesa Civil”, afirma o capitão Antônio Hiller, integrante da coordenadoria de Defesa Civil estadual. Segundo ele, várias prefeituras têm feito consultas sobre a possibilidade de decretar emergência.
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Gazeta do Povo, 08/01/2009)