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minério de ferro cvrd
2009-01-06

Com investimento planejado, em 2009, de 14,2 bilhões de dólares, a Vale, a exemplo de outras empresas globais, espera um cenário mais claro da crise econômica. Segunda maior mineradora do mundo, a empresa surfou em grande estilo na onda mundial da alta das commodities. Viu seu valor de mercado crescer de forma vertiginosa, puxada pela demanda por minério de ferro e a abundância de dólares dos países ricos em busca de ativos para investir. O desempenho foi invejável: de janeiro de 2004 a janeiro de 2008, suas ações valorizaram mais de 300%. Desde junho, o quadro mudou com velocidade igualmente estonteante, derrubando os preços dos principais papéis da companhia pela metade. O movimento de queda foi contido quando seus executivos anunciaram um programa de recompra, numa demonstração de confiança. Na entrevista a seguir, Roger Agnelli, diretor-presidente da Vale, comenta as perspectivas para 2009 e reforça seu otimismo em relação aos países asiáticos, especialmente a China. Em que pese o otimismo do executivo, o cronograma de investimentos, adverte Agnelli, estará sujeito a revisões, ao sabor dos desdobramentos da crise.

CartaCapital - É possível estimar o impacto da crise na demanda dos países asiáticos por minério de ferro em 2009?
Roger Agnelli -
Muitos confundem a questão da China (que reduziu as suas compras), com a crise do subprime, mas na nossa visão não houve conexão. O que existiu foi uma infeliz coincidência. O determinante do crescimento menor da China está ligado a fatores que giram em torno da sua própria economia, fatores internos. Em 2007, o governo chinês adotou medidas para a contenção do crédito por preocupação com a inflação, e talvez tenha praticado uma contenção excessiva. Tivemos também uma tempestade de neve que afetou muito os negócios, depois um terremoto de grandes proporções. A combinação desses fenômenos atrapalhou sensivelmente a distribuição logística no país. Houve ainda a paralisação de diversas atividades em razão dos Jogos Olímpicos. Tudo isso, combinado com a economia externa, produziu uma desaceleração forte da economia chinesa.

Então a Vale mantém o otimismo em relação às perspectivas da região?
Agnelli -
A China poupa 50% do PIB, os Estados Unidos, zero, tinham uma poupança até negativa. A China tem 2 trilhões de dólares em reservas internacionais, e a inflação sob controle. Nesse sentido, é um país com uma possibilidade de reação muito maior do que os Estados Unidos. O importante é ter essa noção, até para entender as perspectivas de desenvolvimento das economias emergentes e das maduras nos próximos anos. A despeito do desafio do curto prazo, na nossa visão a perspectiva de longo prazo permanece favorável. Ninguém imagina que a China vá parar de crescer. Ninguém imagina que os asiáticos em geral, os emergentes, estão satisfeitos com o nível de desenvolvimento que eles alcançaram. Eles evoluíram bastante, mas têm muito a fazer ainda.
Então, o fato é que as determinantes da demanda do nosso setor, que são as demandas originais de um processo de transformação secular de uma economia subdesenvolvida em uma economia desenvolvida, vão continuar movendo os nossos mercados e elas não vão ser interrompidas. Podem ser temporariamente desaceleradas, em razão da situação que vivemos, mas não acreditamos numa reversão de ganhos.

Qual o peso da Ásia nos negócios da Vale?
Agnelli -
Na demanda mundial de recursos naturais, eu diria que mais de 50% do crescimento vem desses países. O fato de a economia americana não crescer como o esperado, evidentemente, causará um arrefecimento da demanda. No entanto, a demanda provocada principalmente pelos Brics, países continentais, com uma população enorme, da forma como vinha, era insustentável. O que está acontecendo agora é tirar um pouco dessa espuma, do excesso, que tinha na demanda mundial para voltar ao equilíbrio.

Quanto a empresa planeja investir em 2009? Há possibilidade de adiar projetos de investimento?
Agnelli -
Anunciamos um plano de investimento de 14,2 bilhões de dólares para o ano que vem, e a vontade é investir todo esse montante. Há a possibilidade de adequarmos os nossos projetos, alongar a sua implementação se for o caso, de acordo com o mercado. Se a crise demorar dois anos, faremos os projetos em dois ou três anos. Se demorar três, a gente termina o projeto em três, quatro anos. Ninguém na indústria tem um pipeline do tamanho da carteira de projetos que a Vale tem. E ninguém implantou tantos projetos nos últimos dez anos quanto a Vale. Então estou otimista. Estamos entrando na crise fortes, vamos sair mais fortes. Estamos fazendo nosso dever de casa, vendo a crise com muita seriedade, mas também com muita tranqüilidade. Eu diria, com toda sinceridade, que não tem nenhuma empresa mineradora nas condições que a Vale tem hoje.

Quais mercados são vistos como os mais promissores?
Agnelli -
As economias desenvolvidas terão crescimento próximo de zero ou alguma coisa negativa em 2009. As economias maduras realmente vão ter um período maior de baixa contribuição para o crescimento global, mas as emergentes, particularmente a China, vão somente desacelerar o seu crescimento. Não vão entrar em recessão no seu conjunto e suas taxas de crescimento vão ser mais elevadas do que em recessões passadas.

Na avaliação da Vale, como será o ano para a economia brasileira?
Agnelli -
O Brasil hoje é uma chance no mundo, uma exceção. Não sentimos a crise ainda. Não estou dizendo que ela não vai chegar, ela vai acabar chegando no crédito e, quando falta crédito, o efeito é cruel. Mas estamos sofrendo muito menos que outros países. De uma perspectiva mais de longo prazo, o Brasil é o grande produtor de recursos naturais do mundo inteiro e o mundo vai precisar de recursos naturais para crescer, estamos muito bem posicionados para tirar proveito do crescimento da economia mundial.

Muitos criticam a maneira como o Brasil aproveitou o boom das commodities, por exportar principalmente produtos de baixo valor agregado. Como a Vale enfrenta essa questão?
Agnelli -
O primeiro ponto é que o País tem de ser competitivo naquilo em que ele é competitivo. Em termos de minério de ferro, de produtos primários, o Brasil é extraordinariamente competitivo. Se estamos nos posicionando no mercado internacional, trazendo dólares para o Brasil, estamos reforçando o caixa do País, o que gera emprego e muito crescimento. Não temos mercado interno para consumir tudo isso, então temos de exportar o excedente. Vamos investir pesadamente.

No plano internacional, o setor de mineração passa por um processo de concentração muito forte. O senhor acha que esse movimento ainda vai se manter nos próximos anos?
Agnelli -
Essa é uma tendência em vários setores. Em razão da globalização, do tamanho dos mercados, as empresas de escala mundial, competitivas em nível global, são necessárias. No setor de siderurgia, de química, surgem várias empresas multinacionais, transnacionais, na acepção da palavra. Onde for possível produzir com escala e menor custo, haverá esses investimentos.

Em 2008, a Vale tentou comprar a concorrente anglo-suíça Xstrata. Por que o negócio não se concretizou e em que sentido seguirá o processo de internacionalização da empresa?
Agnelli -
A nossa prioridade sempre foi o crescimento orgânico. Temos uma base de ativos no Brasil muito grande e de ótima qualidade. Qualquer aquisição fora do País só fará sentido se houver a complementação de alguma linha de produtos da Vale, para reforçar nossa base de produção, ou por ser competitiva comparativamente aos projetos no Brasil. No caso da Inco, o Brasil não tem tanto níquel, então foi uma diversificação de produtos e ao mesmo tempo geográfica, o que para nós fazia muito sentido. No caso da Xstrata, ela também tem carvão, nicho em que a gente quer se posicionar, e cobre, em que queremos crescer. Mas tudo tem um preço. Se não for aquilo que realmente faz sentido, que agregue valor para a Vale, não vamos fazer. E não fizemos. Teve uma questão também comercial, de um acionista controlador da Xstrata, a Glencore, com quem não chegamos a um acordo.

O País tem um déficit histórico na produção de matéria-prima para os fertilizantes. A Vale pretende ampliar sua produção nessa área?
Agnelli -
Esse mercado é bastante promissor. A questão do biodiesel requer mais fertilizantes e a oferta de potássio e de fosfato está cada vez mais escassa. Estamos ampliando a operação da mina de potássio em Sergipe. Há dois anos compramos, no Peru, uma área de fosfato e começamos a implementar a mina há alguns meses. Temos outras áreas em que fazemos exploração em Moçambique, Canadá, Argentina e mesmo no Brasil. A idéia é entrar forte e aumentar a produção. De qualquer maneira, a Vale estará contribuindo para uma segurança estratégica do País de um insumo essencial para a agricultura.

Além dos fertilizantes, a diversificação para além do minério do ferro é uma estratégia para os próximos anos?
Agnelli -
A nossa estratégia é estar nos mercados promissores. O Brasil não tem recursos de carvão, base para a produção de aço. Como a gente produz minério, o carvão naturalmente entra como elemento estratégico para a companhia. Então estamos crescendo fortemente na produção de carvão. Como não temos recursos aqui, crescemos em Moçambique e na Austrália.

Os investimentos que a Vale tem feito, pela própria natureza do negócio, passam sempre pelas licenças ambientais. Hoje esse processo emperra os investimentos da Vale?
Agnelli -
O diálogo tem melhorado. Foi identificado pelo governo federal que existem legislações um pouco conflitantes entre estados, federação e municípios. A tendência é melhorar. Temos de melhorar muito, porque, em termos de prazos e licenciamento, ainda estamos muito lentos em comparação a outros países. A outra questão é ter maior dinamismo nos projetos de infra-estrutura, que são grandes e caros, e que, evidentemente, geram algum impacto em termos ambientais. O País não continuará crescendo no ritmo que está se não tiver mais investimentos em infra-estrutura

(Por Luiz Antonio Cintra, Carta Capital, 05/01/2009)


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