Casado há 35 anos, ele perdeu a mulher quando sua casa desmoronou durante o terremoto de maio. No mesmo dia, ela perdeu o marido de 20 anos atingido por ruínas de uma construção.
Eles são parentes distantes que moram em uma mesma cidade cujos olhos ainda choram quando falam sobre seus companheiros mortos. Mas meses após o terremoto, o desastre natural mais fatal que a China teve em mais de três décadas, Jiang Zhongfu, 60, começou a cortejar Zhu Xiaoqiong, 42. Mês passado, ele se mudou para a casa pré-fabricada de Zhu em um campo de refugiados. “Estamos considerando nos casar”, disse Jiang enquanto Zhu se sentava ao seu lado, tricotando um casaco cinza.
Mais de sete meses depois que o terremoto destruiu o sudoeste da China, novos casais como Jiang e Zhu são um sinal de que, ao menos psicologicamente, esse é o começo de uma recuperação. Cerca de 370 casais do devastado condado de Beichuan registraram um novo casamento e o governo local planeja uma casamento comunitário em breve, disse Wang Hongfa, uma autoridade do condado.
Mas o progresso da região destruída tem sido bem lento, temperado pelos maus tempos na economia e as difíceis condições no inverno. O terremoto deixou 88 mil pessoas mortas ou desaparecidas e mais de 5 milhões sem casa. Agora, muitos sobreviventes estão alojados em abrigos temporários e sem trabalho, tentando manter o calor com poucos cobertores e garrafas de água quente distribuídos pelo governo. Em uma área da província de Sichuam, onde a destruição foi maior, pessoas estão dormindo em trens de metrô distribuídos por Pequim.
Linhas de casas pré-fabricadas organizam os campos, alguns com mais de 10 mil residentes. Em todos os lugares há cartazes vermelhos exaltando a ajuda dada pelo Partido Comunista. “A atenção do partido é nosso poder”, diz um deles. Os governos locais prometeram que todos terão suprimentos para o inverno. Mas no fim do mês passado, o vice-governador da província de Sichuan disse em uma coletiva de imprensa em Pequim que os sobreviventes ainda precisam de 330 mil cobertores e alguns aquecedores.
O vice-governador, Wei Hong, também disse que o financiamento do governo poderá cobrir apenas metade dos estimados US$438 bilhões para a reconstrução. O resto virá de empréstimos e investimentos de empresas privadas e estatais, disse.
As autoridades estão encorajando os sobreviventes a construírem suas próprias casas, usando o subsídio do governo de US$2.900 por lar. Autoridades da cidade de Mianyang, que fiscaliza a administração de boa parte da região atingida pelo terremoto, dizem que a construção de 410 mil casas já começou na região.
Reconstrução lenta
Mas aqui em Beichuan, a reconstrução é particularmente lenta. Localizado no fundo das montanhas da província de Sichuan, o condado se tornou símbolo da brutalidade do terremoto. Cerca de 20 mil pessoas – de uma população de 180 mil – foram mortas, e deslizamentos de terra enterraram metade da cidade. Uma cerca com arame farpado no topo evita que os sobreviventes voltem à cidade. Ao invés disso, eles vivem em um purgatório, espalhados em 11 largos campos.
A construção de uma nova cidade de Beichuan não está programada até o começo do próximo ano. “O ritmo da reconstrução é muito lento”, disse Han Dongmei, 26, enquanto deitava no berço sua filha de seis meses de idade em um campo onde água quente é artigo esporádico. “Claro que eu quero voltar para minha casa. O problema é que eles não têm nem a planta da casa ainda.”
O prefeito de Beichuan disse que era difícil “balancear as demandas dos refugiados e o processo de reconstrução.” Em uma entrevista em Mianyang, o prefeito Jing Dazhong disse: “Claro, nós queremos que seja mais rápido, mas precisamos atender aos padrões científicos.”
Sobreviventes encontraram diferentes maneiras de cooperar. Em uma colina acima da cidade de Beichuan, moradores ousados vendem souvenirs do terremoto àqueles que vão até as ruínas. Centenas de turistas chegam toda semana. Fotos laminadas e DVDs com cenas horríveis da destruição são vendidos por US$1,50 cada, assim como incensos para serem queimados em memória dos mortos.
“Eu não tenho medo de fantasmas aqui”, disse uma sobrevivente, uma garota de 17 anos chamada Zhou Qiaoyun, enquanto se dirigia para sua barraca de souvenir. “Eu vi muitas pessoas mortas. O dia que escapei de Beichuan, você tinha que pisar em corpos para sair.”
Os acampamentos provisórios ganham ares de permanetes. Um campo próximo à entrada de Beichuan tem um posto de polícia, uma escola e uma mulher que anda por lá vendendo pão de milho quente. A quitanda está contratando gente. Existe uma clínica de saúde mental próximo ao escritório do secretário do partido.
O secretário do partido, Jia Dechum, é capaz de citar de cabeça o número de residentes no local: 5.008 pessoas em 1.175 casas. Muitos são de etnia minoritária Qiang. Um sinal na entrada do acampamento conta os suprimentos: 1.050 peças de roupa de inverno, 800 cobertores e 45 toneladas de arroz.
Os residentes já estão se preparando para o Ano Novo Lunar em janeiro, suspendendo o consumo de salsichas secas. “Aqui é muito melhor que nas tendas disse Liu Xihua, 62, que mora com o filho mais velho e um quarto pré-fabricado, com um tapume de plástico separando as duas camas. “Eu acho que o governo é bom. Eles fornecem muitos suprimentos diários.”
Mais abaixo vivem Jiang e Zhu, o viúvo e a viúva que se apaixonaram depois que a mulher de um e o marido da outra morreram no terremoto. Eles sentam a tarde e assistem TV. Eles viviam em acampamentos separados depois do terremoto, até que um parente em comum os apresentou. “Começamos logo a sair juntos”, disse Zhu.
(Por EDWARD WONG, The New York Times, Ultimo Segundo, 30/12/2008)