União quer pagar R$ 21 milhões por local, no Pará, onde foram libertados 82 trabalhadores em 3 ações
Pela primeira vez no país, o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) conseguiu concretizar a desapropriação de uma área sob o argumento de que nela foi realizada a prática de trabalho análogo à escravidão.
A fazenda Cabaceiras, que tem 10 mil hectares, fica em Marabá (PA) e é da família Mutran, tradicional no meio rural paraense. Entre 2002 e 2004, três ações do grupo móvel do Ministério do Trabalho resgataram 82 trabalhadores em situação tida como degradante.
Segundo proposta do Incra, os Mutran irão receber ao menos R$ 21 milhões de indenização. Renata Dávila, subprocuradora-chefe do instituto, disse que o ideal seria a expropriação da terra (sem indenização). O valor ainda será alvo de negociação na Justiça.
Apesar de a decisão da Justiça Federal ser considerada por entidades que defendem os direitos humanos uma vitória histórica, a emissão de posse em favor do Incra só ocorreu após os Mutran terem desistido de um mandado de segurança deferido pelo STF (Supremo Tribunal Federal). O mandado suspendia os efeitos de um decreto presidencial de 2004 que ordenava a desapropriação.
Segundo Délio Mutran, um dos donos, a família desistiu da ação porque a fazenda está invadida há cerca de dez anos pelo MST (Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). Como já havia o decreto, criou-se um impasse jurídico, que impedia a reintegração de posse.
"Não queríamos [desistir]. Lá tem estrada, rio, nascentes, é uma terra fértil. Mas fazer o quê? O MST radicalizou", disse. Refutou a existência de trabalho degradante na área e disse que houve "exagero" nas blitze.
Contribuíram para a decisão da Justiça danos ambientais e a conclusão de que a terra era improdutiva -mesmo havendo, diz Délio Mutran, milhares de cabeças de gado e plantações de castanhas e seringueiras.
O Incra argumentou que a fazenda não cumpria sua função social, obrigação prevista na Constituição. O MST chamou a desapropriação de "conquista". José Batista, advogado da Comissão Pastoral da Terra, disse se tratar de "marco histórico".
(Por THIAGO REIS e JOÃO CARLOS MAGALHÃES, Folha de S. Paulo, 18/12/2008)