Hackers contratados por 107 madeireiras invadiram o sistema de controle de transporte de madeira e estão sendo acusados de falsificaram os registros online para aumentar a quantidade permitida para comercialização. As multas aplicadas pelo Ministério Público superam os R$ 2 bilhões.
Destruir a Amazônia cortando árvores e ateando fogo na mata não tem nada a ver com alta tecnologia, certo? Errado. Madeireiras decidiram contratar hackers para invadir o sistema de controle de extração madeireira do Pará e fraudar os registros que autorizam o transporte de madeira, inundando o mercado com madeira ilegal “esquentada”.
Para monitorar a quantidade de madeira comercializada no Pará, o governo federal decidiu, em 2006, substituir as autorizações em papel por um sistema online. As madeireiras que destroem as florestas para produção de madeira e carvão só são autorizadas a retirar uma certa quantidade de madeira por ano. Na Amazônia, essa quantidade é controlada por dois sistemas eletrônicos, o Documento de Origem Florestal (DOF) do governo federal ou o Sisflora, gerenciado pela Secretaria de Meio Ambiente do Pará. Para ser exportado ou comercializado no sul do país, cada carregamento de madeira precisa de um documento eletrônico, emitido online, como numa operação de Internet banking. O volume de madeira de cada carregamento é deduzido da quantidade total anual permitida (a “conta-corrente” da empresa), de acordo com o plano de manejo de cada empresa madeireira. Quando o volume é reduzido a zero, nenhuma outra autorização é emitida e a empresa não pode mais explorar ou comercializar.
Ao menos deveria ser assim. Hoje, o Ministério Público do Pará divulgou detalhes de como hackers contratados por 107 madeireiras e carvoarias invadiram o sistema de controle de transporte de madeira que, na época era o DOF. Eles estão sendo acusados de falsificaram os registros online para aumentar a quantidade permitida para comercialização. O Estado do Pará é conhecido nacionalmente por abrigar quadrilhas de hackers, especializadas em fraudar o sistema bancário.
Aproximadamente 1,7 milhão de metros cúbicos de madeira ilegal foram “esquentados” pelo esquema, o suficiente para encher 680 piscinas olímpicas. As multas aplicadas pelo Ministério Público superam os R$ 2 bilhões. De acordo com o promotor Daniel Avelino, muitas destas empresas respondem a diversos outros processos por práticas ilegais. "Aproximadamente metade das empresas envolvidas neste escândalo têm outras acusações pendentes por crimes ambientais ou uso de trabalho escravo”.
A polícia começou a investigar hackers suspeitos em abril de 2007, culminando na prisão de 30 chefes da quadrilha meses depois. Escutas telefônicas registraram as conversas entre as madeireiras, os mentores do esquema e os hackers. O líder do grupo, Menandro, que conectou os hackers aos madeireiros, ainda está na cadeia. Os demais aguardam o processo em liberdade. No total, 202 pessoas estão sendo acusadas.
"O Greenpeace já tinha apontado que este método de controle do transporte de madeira era passível de fraude. E isso é só a ponta do iceberg, pois os sistemas adotados pelos estados e pelo governo federal não são seguros. Além disso, a quantidade de auditores não é suficiente para monitorar e evitar fraudes ", disse André Muggiati, da campanha da Amazônia. "Ao invadir o sistema, estas empresas transformam seus carregamentos ilegais em madeira legal, como se viesse de planos de manejo florestal. Na realidade, eles estão comercializando madeira de desmatamento ilegal. A falta de governança na região estimula este tipo de crime, e reforça a sensação de impunidade”, completa.
Além dos processos referentes ao esquema com hackers, o Ministério Público Federal no Pará também encaminhou ontem à Justiça Federal ações contra as empresas que até 2007 deviam as maiores multas aplicadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no Estado. Entre elas está a madeireira Eidai, que já foi denunciada várias vezes pelo Greenpeace por compra e comercialização de madeira ilegal. As ações ajuizadas nesta quinta-feira compõem a maior quantidade de ações por irregularidades ambientais que a instituição já encaminhou de uma só vez à Justiça Federal no Pará. Os acusados também serão obrigados a reflorestar as áreas desmatadas, calculadas em um total de 364 quilômetros quadrados.
O município com maior número de empresas denunciadas é Paragominas, no sudeste paraense, onde também está sediado o empreendimento que, das 107 ações, é acusado de ser o responsável pelo maior prejuízo socioambiental, a U-Guazu Agropecuária. O MPF quer que a empresa pague R$ 90,8 milhões em indenização pelo desmatamento de uma área de 22 quilômetros quadrados, de onde foram retirados 88,3 mil metros cúbicos de madeira.Outro pedido da ação, coordenada pelo procurador da República Daniel César Azeredo Avelino, é que a Justiça Federal suspenda a atuação das empresas condenadas.
(Greenpeace Brasil, Amazonia.org.br, 15/12/2008)