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passivos do agronegócio
2008-12-12
Nesta segunda reportagem do especial "Agricultura e os desafios ambientais", você conhece o cenário nacional, onde é preciso a criação de estratégias de valorização da biodiversidade, que hoje é substituída por lavouras e pecuária extensiva
 
Terras férteis para as mais variadas culturas, água em abundância e uma história de colonização baseada na extração de recursos naturais fizeram com que o Brasil desenvolvesse uma economia fortemente ligada ao setor agrícola e que se expande degradando biomas como o Cerrado e a Amazônia.

O país tem 30% do Produto Interno Bruto (PIB) vindo do agronegócio e possui a balança comercial agrícola mais elevada do mundo. “Nosso modelo econômico é muito baseado na exploração de recursos naturais. A mineração é outro exemplo, além da agricultura. Porém isto é fruto, além de escolhas políticas, da situação natural, uma vez que somos um país ambientalmente rico”, explica o coordenador do Programa Agricultura e Meio Ambiente da WWF-Brasil, Luis Fernando Laranja.

Entre 1994 e 2003, quando a moeda passava por uma forte desvalorização, quase US$ 90 bilhões entraram no país por meio das exportações do agronegócio, segundo o Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone). Neste mesmo período outras áreas industriais importaram US$ 88 bilhões, situação que se altera a partir de 2003.

“Porém, mesmo com outros setores mostrando um balanço positivo, o agronegócio continua exibindo números mais favoráveis no balanço comercial quando comparado com o resto da economia”, aponta o relatório “Panorama do setor de agricultura in países selecionados na Ásia e América Latina”. 

A produtividade cresce para quase todas as culturas no Brasil, particularmente a soja, trigo, arroz e algodão. O mesmo ocorre com as criações de animais, especialmente porco, aves e gado, todos com forte expansão na região Centro-oeste. O fator total de produtividade cresceu em média 2%  ao ano nas últimas quatro décadas, registrando o aumento mais elevado da América Latina e ficando próximo aos números dos Estados Unidos.

“Apesar desta situação da dependência dos produtos agrícolas primários, a taxa de industrialização do setor aumentou muito nos últimos anos, trazendo a agregação de valor”, ressalta Laranja.

O chefe-adjunto de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Meio Ambiente, Ariovaldo Luchiari Júnior, explica que, apesar das notícias constantes de avanço dos latifúndios e pecuária sobre áreas sensíveis, a prática do desmate, sem cuidado com a biodiversidade e sem o cumprimento da lei tende a perder espaço no país. “Grandes extensões de terra com baixo índice tecnológico significam uma expansão desordenada. Isso ninguém quer e governo nenhum vai fazer uma política neste sentido”, afirma.
 
Lavouras e Pecuária

Os latifúndios ocupam 60% do total da área privada no Brasil, mas representam apenas 3% dos proprietários. Já as fazendas de médio porte (200-800 hectares), pequeno porte (50-200 hectares) e agricultura familiar (até 50 hectares) representam 90% dos proprietários, mas ocupam apenas 40% das áreas privadas.

“As grandes propriedades estão concentradas nas regiões Centro-Oeste e Norte, basicamente devido ao grande capital necessário para ser competitivo nestas áreas, enquanto as pequenas produções estão espalhadas pelo Nordeste, Sul e Sudeste”, explica o Icone no estudo.  

A maior parte do gado brasileiro ainda é produzida de maneira extensiva, fazendo com que as pastagens ocupem a maior extensão de terra do país. “A maior preocupação hoje é quando a criação intensiva será adotada, uma vez que isto evitaria a necessidade do setor agrícola abrir novas áreas florestais para a pastagem”, afirma o relatório.

Laranja ressalta que o país está exportando mais carne industrializada e aumentando a participação no PIB. “Vimos um crescimento espetacular das carnes bovinas nos últimos anos, o que gera empregos e melhores retornos financeiros”, afirma.
 
Pressão sobre os Biomas
A pressão sobre biomas frágeis, principalmente a Floresta Amazônia e o Cerrado, é a principal conseqüência ambiental de um modelo econômico baseado no agronegócio.

“Se analisarmos o mundo, vemos que a questão não é tanto deixar de produzir ou explorar estes recursos, pois a demanda irá crescer e, se não for o Brasil, alguém vai ocupar este lugar”, explica Laranja.

Segundo o especialista, a questão é não ter medo de discutir o modo como se desenvolve o setor no país, usando as vantagens naturais e pensando cada vez mais em alternativas para racionalizar o uso dos recursos. “A água, por exemplo, penso que é muito mais uma questão de não poluir. Podemos usá-la intensamente que, se não estiver poluída ou degradada, ela continuará sendo produzida pela natureza”, cita Laranja.

O mesmo vale para a água nos centros urbanos. Por isso, ele chama a atenção para o debate sobre o uso dos recursos hídricos, que precisa ser mais eficiente, com a redução do uso de fertilizantes nas plantações, por exemplo. “É um negócio extremamente importante e mais grave no setor agrícola, justamente porque grande parte do uso brasileiro se dá na agricultura”, comenta.

Cerca de 70% da água utilizada no país vai para a irrigação, porém apenas 4% da produção agrícola é irrigada, segundo o relatório do Icone. 

A degradação ambiental no Cerrado coloca em risco a região que é o nascedouro dos rios que formam as três mais importantes bacias hidrográficas brasileiras (Amazônica, São Francisco e Paraná-Paraguai). Em pouco mais de três décadas, metade da vegetação nativa já se perdeu na dinâmica da ocupação humana resultante principalmente das atividades agropecuárias, do desenvolvimento urbano, da produção de carvão e de mais uma série de outras ações.

Laranja diz que o cerrado é visto pelo agronegócio como uma “grande lavoura em potencial”. “O Cerrado tem uma função ecológica importantíssima, mas tem um sistema de monitoramento muito pior que o da Amazônia por não ter um apelo tão grande”, lamenta.

Ele explica que há uma dificuldade técnica em medir a destruição, com dados precários que confundem a vegetação com lavouras. Além disso, as informações são desatualizadas. O último monitoramento, segundo Laranja, é de 2004 com levantamento de 2003. “Imagine o que não deve ter mudado de lá para cá”, exclama.

 
Critérios e valoração das riquezas naturais

Laranja defende a criação de critérios mais adequados de expansão da agricultura no Cerrado, com a avaliação criteriosa para permitir áreas de lavoura e pecuária e a criação de áreas estratégias de conservação. “Se não tivermos geração de riqueza para áreas nativas, não conseguiremos segurar a pressão econômica”, afirma.

O cerrado é o segundo maior bioma do Brasil, com mais de 1,9 milhão de quilômetros quadrados de área que se estende por 12 estados e pelo Distrito Federal, onde está cerca de um terço da biodiversidade do País e 5% da fauna e flora mundiais.

O especialista lembra que uma coisa é os biomas terem valor, outra é valorar esta riqueza. “Precisamos associar ao produto nativo para serem explorados de forma sustentável e criar serviços ambientais, que ainda é muito incipiente com as práticas ligadas ao carbono apenas”, afirma.

Por isso, ele propõe a exploração econômica da riqueza dos biomas brasileiros de forma inteligente e cita uma experiência de venda do azeite da Castanha do Pará. “Se você oferece R$ 100 a safra por árvore e ele ganha R$ 150 pela árvore derrubada, na segunda safra já vai ganhar mais do que se a tivesse cortado. Essa é a lógica que o cidadão entende”, explica.

(Por Paula Scheidt, Carbono Brasil, 11/12/2008)

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