Como juízes, elas decidem o certo e o errado. Como oráculos, mas baseadas em conhecimento acumulado, mostram o melhor caminho. As comissões de ética ambiental da USP têm poder para decidir se um projeto de pesquisa pode ir para frente ou não. E, se ele não puder seguir adiante, mostram que alterações devem ser feitas para seu prosseguimento. Tudo isso considerando o impacto que as pesquisas podem causar ao meio ambiente.
Uma tendência que vem crescendo gradualmente na Universidade – tal qual aumenta a conscientização ambiental na população –, essas comissões analisam os projetos de pesquisa e emitem pareceres sobre o tratamento e/ou a disposição final dos resíduos químicos que eles podem produzir. Patrícia Busko Di Vitta, chefe do setor de tratamento de resíduos químicos do Instituto de Química (IQ) da USP, afirma que mais de 90% dos processos químicos realizados no IQ geram resíduos perigosos. O papel da comissão de ética é, então, dar um parecer sobre a pesquisa, com um olho nos resíduos (quais são e para onde vão) e outro nas leis ambientais.
Os pesquisadores preenchem um formulário e o enviam à comissão de suas unidades junto com seus projetos para análise do grupo, formado por docentes e especialistas. No IQ, a comissão de ética ambiental foca principalmente os rejeitos químicos. Há outras comissões na unidade que tratam pontos diversos, como uso de animais e de radioatividade nas pesquisas.
No Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da USP, a comissão de ética ambiental trata, além dos resíduos químicos, dos radioativos. Segundo o professor José Albertino Bendassolli, coordenador da comissão, há uma nova proposta no Cena estabelecendo que todos os projetos de pesquisa realizados na unidade devem ser enviados à comissão de ética ambiental, já que, por enquanto, este processo não é obrigatório. No IQ, o envio de projetos ainda não é obrigatório, mas, conforme Patrícia, será futuramente.
Incentivo
Para Patrícia, que é membro da comissão do IQ, esses grupos de ética ambiental começaram a surgir na Universidade principalmente depois que a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) passou a ceder recursos a unidades como o IQ e o Cena para a montagem de laboratórios de tratamento de resíduos químicos.
Além disso, há um ano, a Fapesp começou a requerer o parecer das comissões de ética sobre projetos de pesquisa como condição para que eles passem a receber apoio financeiro. A comissão da Escola de Engenharia de Lorena (EEL) da USP, por exemplo, surgiu na metade deste ano por causa dessa exigência.
Para o presidente da comissão de ética ambiental da EEL, professor Francisco José Moreira Chaves, a agência lançou uma tendência. Ele diz ser cada vez mais comum órgãos de apoio à pesquisa exigirem comissões de ética ambiental em unidades onde os processos liberam resíduos que podem causar impacto ecológico. Patrícia confirma, e vai além: no Instituto de Química, por exemplo, além dos órgãos, empresas como Vale do Rio Doce e Petrobras também têm pedido o parecer da comissão a respeito dos projetos que financiam.
Conscientização
Segunda a professora do IQ, a recomendação da comissão de ética da unidade aos pesquisadores é que eles, ao criarem seus projetos, pensem em como gerar a menor quantidade possível de resíduos perigosos e que eles mesmos tratem dos rejeitos. “É importante que cada um trate a maior quantidade de resíduos possível”, diz.
No Cena, os próprios pesquisadores devem planejar quanto da verba para a pesquisa será destinada ao gerenciamento dos resíduos. Grande parte destes é tratada por um grupo gestor. Segundo o coordenador da comissão do Cena, a unidade obteve até agora uma economia de cerca de R$ 200 mil com energia, reciclagem e reutilização de água.
Sobre a conscientização ambiental de docentes e alunos, Bendassolli é realista. “Ainda não está como desejamos”, diz. “Tem que haver um empenho maior. Mas existe uma evolução, e é importante tratar essa questão com muito carinho.”
Tratamento de resíduos químicosO projeto de pesquisa chega à comissão de ética ambiental da unidade à qual está vinculado. A comissão, composta por docentes e especialistas, analisa o trabalho, atenta aos resíduos que o processo químico ou físico da pesquisa pode obter. Muitos dessas "sobras" causam impacto ambiental (contaminação de solos e águas, por exemplo). Por isso, a comissão tem o poder aprovar ou desaprovar um projeto. No caso de o trabalho ser reprovado, ele volta ao pesquisador para que algumas alterações sejam feitas.
(Por Saulo Yassuda,
USP online, 11/10/2008)