“O governo é aderente à iniciativa privada. Não falta plano, não falta lei, não falta competência. É preciso mudar o mercado imobiliário”. A afirmação é da professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo (USP) Ermínia Maricato. Ela participou do Urban Age, conferência internacional para discussão sobre o urbanismo das megacidades, que ocorreu na última semana na cidade de São Paulo.
A professora participou do debate “Negociando projetos da cidade”, no qual foram apresentados projetos que buscam melhorar a qualidade de vida em algumas megacidades do mundo. Segundo Ermínia, os projetos conseguem solucionar determinadas demandas, mas antes é necessário discutir questões estruturais que acabam ditando a dinâmica urbanística.
De acordo com a arquiteta, a falta de solução dessas questões de base, principalmente nos países do hemisfério Sul, está relacionada a problemas como a especulação imobiliária e a ocupação ilegal. “No Nordeste, a ilegalidade chega há 90%. O Estado não tem controle dessa situação”, comentou.
O ex-secretário de Planejamento da cidade de São Paulo Jorge Wilheim, que participou como mediador do debate, lembrou a importância de entender o papel das incorporadoras neste processo de construção das cidades brasileiras mais sustentáveis. “Quem são os atores que constroem as cidades?”, lançou a questão aos debatedores.
Para o ex-governador do Paraná e ex-prefeito de Curitiba, Jaime Lerner, falta diálogo entre os diferentes agentes: planejadores, iniciativa privada e população.
Segundo o diretor do programa London 2012 Olympic Legacy Team, Richard Brown, o poder público precisa passar da fase da regulamentação para a negociação, utilizando as regras para beneficiar a população. Para alcançar esse patamar, é preciso ter clareza sobre que cidade se deseja construir, além de habilidade e capacidade para fazer acordos com a iniciativa privada.
O mediador do debate Jorge Wilheim acredita que a crise econômica financeira é uma oportunidade para a mudança da relação entre governo e iniciativa privada. “Crise quer dizer decisão e mudança”, concluiu.
Intervenções urbanas internacionais
Além da discussão sobre os problemas das cidades brasileiras, a conferência trouxe exemplos internacionais de soluções urbanísticas. Um deles foi o projeto de revitalização da região chamada Low Manhattan, em Nova Iorque, nos Estados Unidos.
No início dos anos 2000, essa região comercial estava decadente com a mudança dos escritórios para outros locais da cidade. “Para salvar a região, oferecemos incentivos fiscais aos comerciantes e a novos moradores. Depois, incentivamos a construção de novos espaços. No final do processo, conseguimos não só revitalizar o local, como trazer 45 mil novos moradores“, descreveu a diretora de Departamento de Planejamento da Cidade e Comissionado de Nova Iorque, Amanda Burden.
O arquiteto holandês Kees Christiaanse apresentou o projeto Cidade Aberta para construção de um bairro sustentável com prédios multifuncionais. Já o vice-prefeito da Filadélfia (EUA), Andrew Altman, mostrou como em 2004 conseguiram mudar a região do Waterfront com a construção de conjuntos habitacionais de baixa renda e com a participação comunitária.
Intervenção para capital paulista
A diretora do curso de arquitetura da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Nádia Somekh, apresentou um projeto para a região central da cidade de São Paulo. Um dos pontos centrais é a questão da moradia. “É preciso ocupar essa região esvaziada”, afirmou.
Para aumentar a concentração demográfica do Centro, a arquiteta defendeu a reforma dos prédios que se transformaram em cortiço, como o São Vito. Dessa maneira, a intervenção urbana serviria para a inclusão social.
“São Paulo teve intervenções urbanas ruins em que nunca esteve presente o desejo de uma cidade mais fluída”, disse o professor de arquitetura do Mackenzie, Carlos Leite. “Articulação dos diversos níveis é fundamental para um planejamento urbano metropolitano”, afirmou Nádia.
(Por Talita Mochiute, do Aprendiz, Envolverde, 09/12/2008)