Bagaço e palha de cana-de-açúcar em grande quantidade e a preço muito baixo dão vantagem para o Brasil liderar a produção de etanol de segunda-geração, apesar de ainda faltar investimento e incentivo à pesquisa e tecnologia
Mesmo com todo o investimento internacional em pesquisas e tecnologias avançadas, o Brasil tem condições de liderar o mercado de biocombustíveis de segunda geração, mais especificamente o de etanol, afirma o pesquisador do Centro de Tecnologias Ambientais e Energéticas do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (Cetae/IPT), Ademar Ushima. A explicação é a abundância de matéria-prima e a baixo preço.
“Hoje o Brasil produz o etanol mais barato do mundo e também produz a biomassa mais barata do mundo. Tanto o açúcar, quanto o bagaço ou a palha no Brasil são os mais baratos do mundo - e a quantidade gerada é muito grande”, explica.
Apesar disso, Ushima diz que as plantações de cana-de-açúcar no país possuem um potencial ainda inexplorado. “Tanto o bagaço quanto a palha que fica no campo podem ser aproveitados para a produção de etanol de segunda geração ou de pellets – compensados que servem de combustível para caldeiras ou lareiras, altamente consumidos em países como os da Europa”.
Hoje boa parte dessa biomassa é desperdiçada, mas o pesquisador afirma que cada tonelada de cana-de-açúcar plantada no Brasil pode gerar uma receita de R$ 25 em energia elétrica; R$ 32,80 em pellets; R$ 59,00 em metanol e R$ 44,80 em etanol, se todos os resíduos forem aproveitados na colheita.
Para a produção de etanol, há duas grandes rotas tecnológicas desenvolvidas no Brasil. Uma delas é a hidrólise, que pode ser enzimática ou ácida. “A tendência mundial está indo para a hidrólise enzimática”, afirma Ushima. Ele diz que, as pesquisas realizadas no Brasil são bastante intensas nesse sentido, com várias equipes trabalhando nessa linha, desde a área de enzimas até a de reatores e de genética.
“O Brasil está bem representado em termos tecnológicos na linha de hidrólise”, avalia. A liderança nesse setor, no entanto, cabe aos Estados Unidos. “Eles investem muito mais recursos do que o Brasil, mas é compreensível”, observa.
Ushima destaca a criação do Centro Tecnológico do Etanol, em Campinas, São Paulo, onde deverá ser construída uma unidade-piloto para realização de testes com as tecnologias desenvolvidas nos laboratório das universidades brasileiras. “Essa unidade-piloto vai ser fundamental para provar se essas tecnologias realmente são passíveis de serem transferidas para a indústria”, comemora.
Rota térmicaUma outra linha de estudo para produção de etanol de segunda geração é a rota térmica, pela qual se gaseifica a biomassa para geração de combustíveis líquidos. Ushima é um dos poucos pesquisadores que atuam na área térmica no país e diz que as pesquisas nesse campo no Brasil estão atrasadas em relação à enzimática. “Existem poucos grupos estudando e os recursos colocados também são menores. Perdemos na ordem de seis para um”, lamenta.
O pesquisador explica que na Europa a rota térmica recebe um incentivo muito grande e acredita que a visão brasileira sobre essa linha de estudo precisa mudar porque, segundo ele, as duas tecnologias apresentam o mesmo potencial de geração de etanol a partir da biomassa. “Ninguém sabe ainda qual será o modelo que irá prestar, porque ninguém conseguiu desenvolver a linha completa de conversão de biomassa até o etanol, seja na parte de hidrólise ou na de gaseificação”. Ushima diz que isso só será provado no momento em que se conseguir construir uma unidade de demonstração.
A Alemanha é o país que está mais avançado nesse aspecto, pois já construiu uma unidade na área térmica que entrará em operação no próximo ano. “É uma unidade de demonstração, que ficará um ano em processo de comissionamento e que permitirá testar a tecnologia, avaliando os custos reais da unidade. Se obtiver sucesso, poderá ser implantada em vários locais do mundo”.
No Brasil, a previsão é de que se chegue ao processo completo de produção de etanol de segunda geração dentro de cinco anos. Ushima diz que ainda faltam pesquisadores e investimentos na área de desenvolvimento, mas garante que, em termos de matéria-prima, inegavelmente é o país com o menor custo da biomassa no mundo.
(Por Sabrina Domingos,
Carbono Brasil, 08/12/2008)