EM 2001 , quando o Congresso Nacional estava para alterar o Código Florestal, reduzindo a reserva legal (área de proibição de desmate em cada propriedade rural) na Amazônia, 287 entidades da sociedade civil lançaram na internet a campanha SOS Florestas, para pressionar contra a medida.
O provedor do Senado Federal entrou em colapso: num único final de semana, meu endereço eletrônico recebeu 35 mil mensagens.
O mesmo aconteceu com todos os deputados e senadores. Outra avalanche de e-mails chegou ao Palácio do Planalto. Na comissão, os ruralistas ganharam por 13 a 2 (Fernando Gabeira e eu), porém, antes da votação final em plenário, a pressão foi vitoriosa. O presidente Fernando Henrique, respaldado pela sociedade, retirou o projeto que continha a proposta.
Agora, tenta-se uma espécie de "liberou geral", na contramão do combate ao desmatamento.
Proposta apresentada pelo ministro da Agricultura quer reduzir a reserva legal na Amazônia, anistiar desmatadores de áreas de preservação permanente -como topos de morros, encostas e margens de rios- e transformar o zoneamento ecológico-econômico obrigatório em mera peça de "orientação". Também dispensa transgressores de recuperar áreas degradadas e os habilita a receber financiamentos hoje vedados na Amazônia.
Não bastasse, o ministro Mangabeira Unger (Assuntos Estratégicos) propõe regularização fundiária dissociada do zoneamento e com alto risco de legalizar terras públicas griladas.
Não sobrou nem o bom senso. O mundo enfrenta mudanças climáticas severas; entre nós, Santa Catarina tenta emergir de um desastre provocado, em grande medida, pela imprevidência ambiental, mas o mau senso quer premiar a ilegalidade. É total a contradição com planos do governo (mudanças climáticas, combate ao desmatamento, Amazônia sustentável) e com o discurso do Brasil na conferência de mudança do clima, no qual acertadamente assume metas de redução do desmatamento.
ONGs que participavam de grupo de trabalho informal com os ministérios da Agricultura, do Meio Ambiente e a Frente Parlamentar Ruralista comunicaram a decisão de deixar as discussões. Vêem a proposta do ministro como bomba-relógio para novos casos como o de SC, ao incentivar, na prática, a ocupação de áreas de risco.
O que fazer? A sociedade brasileira não pode permitir tal retrocesso. De várias formas, ela já demonstrou ser sensível à proteção ambiental. Um exemplo são os 41 milhões de protestos contra desmatamentos e queimadas na Amazônia no site Globo Amazônia em apenas três meses de funcionamento. Que essa força se mostre, porque o momento é grave.
(Marina Silva, Folha de S. Paulo, 08/12/2008)