Vacas e porcos pastando em planícies verdes do sul da Holanda criam uma paisagem bucólica. Mas olhando pela ótica da emissão dos gases que provocam o efeito estufa, esses animais são chaminés vivas, emitindo metade das poluentes no ar.
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Essa é a razão pela qual um grupo de fazendeiros que se tornaram ambientalistas em uma uma fazenda de pesquisa malcheirosa, mas impecavelmente limpa, tem uma nova tarefa além de fazer bolsa de seda a partir da orelha de uma porca: ele cozinham o estrume de seus 3 mil porcos e capturam o metano preso nele. A partir desse processo, usam o gás para gerar eletricidade para a rede elétrica local.
Com o crescimento dos “ecologicamente conscientes” na Holanda, o projeto de Sterksel é um raro exemplo dos novos esforços que visam mitigar as pesadas emissões de gases por parte dos animais. Mas muito mais precisa ser feito, dizem cientistas, porque mais e mais pessoas estão comendo carne vermelha ao redor do mundo.
O que fazer com as emissões das fazendas é um dos principais problemas que vem sendo discutido nesta e na próxima semana quando os ministros do Meio Ambiente de 187 nações irão se reunir em Poznan, Polônia, para discutir um novo acordo para combater o aquecimento global. Ao divulgarem as emissões de gás do último mês, as autoridades das Nações Unidas apontaram a agricultura e o transporte como os dois setores mais “problemáticos”.
“Essa é uma área que foi largamente negligenciada”, disse Dr. Rajendra Pachauri, comandante do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas das Nações Unidas, vencedor do prêmio Nobel. Ele disse que as pessoas deveriam comer menos carne para controlar a emissão de carbono. “Nós não trabalhamos para conter as emissões da agricultura.”
Vilões
Os trilhões de animais nas fazendas ao redor do mundo geram 18% das emissões que estão aumentando as temperaturas globais, de acordo com estimativas da ONU. Mais ainda que carros, ônibus e aviões.
Mas diferentemente das outras indústrias, como as de cimento e de energia, que estão sendo pressionadas para se tornarem mais “verdes”, as fazendas estão apenas começando a ficar sob o olhar atento dos políticos, fazendeiros e cientistas escaldos para desenvolver soluções.
As medidas de alta tecnologia incluem o projeto da fazenda holandesa, chamada “captura de metano” assim como o desenvolvimento de rações que façam com que as vacas emitam menos metano. A Califórnia já está trabalhando em um programa para encorajar fazendas de porco e laticínios como a de Sterksel.
Outras propostas incluem de tudo, desde convencer os consumidores a comerem menos carne até implantar os chamados “impostos do pecado” nas carnes de porco e de vaca. No ano que vem, a Suíça vai começar a rotular os produtos alimentícios para que os consumidores possam saber o impacto da carne bovina no meio ambiente, em comparação com a carne de frango e peru, por exemplo.
“Claro que para o meio ambiente é melhor comer feijão e não carne, mas se você quiser comer um bife no Ano Novo, você saberá qual bife comprar”, disse Claes.
Consumo crescente
Mas essas propostas iniciais são parte de um assombroso jogo. Em grandes países em desenvolvimento como a China, Índia e o Brasil, o consumo de carne vermelha cresceu 33% na última década. E é previsto que o consumo global dobre entre 2000 e 2050. Enquanto a economia global deverá diminuir momentaneamente o apetite mundial por carne, é provável que não reverta a tendência de crescimento do consumo.
Dos mais de 2 mil projetos apoiados pelo sistema de financiamento das Nações Unidas para desacelerar as emissões, apenas 98 são na agricultura. De fato, cientistas estão ainda tentando definir uma versão prática e “verde” de bacon ou hambúrguer. Todos os passos da produção de carne provoca emissões poluentes.
Flatulência e estrume de animais contêm não só metano, mas também óxido nitroso, um agente ainda mais potente. E carne requer refrigeração enquanto é transportada da fazenda para o supermercado, e depois para uma residência.
Produzir carne neste mundo cheio de gente requer a criação de novos pastos e cultivo de novas terras. Esse processo contribuiu para o desmatamento de florestas tropicais principalmente na América do Sul, destruindo as “pias de carbono”, já que essas vastas extensões de árvores e vegetação absorvem parte do dióxido de carbono emitido.
“Eu não tenho certeza se esse sistema que temos para os animais pode ser sustentável”, disse Pachauri das Nações Unidas. Cientista conceituado, ele sugere que a solução “mais atrativa” é que todos “reduzam o consumo de carne”, uma mudança que, diz, poderá ser mais efetiva que implantar carros híbridos.
Resistência
O jornal de medicina Lancet e grupos como o Conselhor por Alimentos Éticos na Grã-Bretanha apoiaram a sugestão de reduzir o consumo de carne vermelha para controlar as emissões. De qualquer maneira, os ocidentais comem mais carne vermelha que o recomendado.
Produzir 450 gramas de carne produz 11 vezes mais gases do efeito estufa que 450 gramas de carne de galinha e 100 vezes mais que 450 gramas de cenoura, de acordo com Lantmannen, o grupo suíço.
Mas qualquer sugestão de consumir menos carne vermelha é vista com resistência em um mundo de carnívoros e que sofre um boom na indústria de criação de animais. Produtores de carne questionam os números das Nações Unidas, dizendo que são exagerados porque incluem o desmatamento da floresta amazônica, um fenômeno que segundo os produtores brasileiros aconteceria de qualquer maneira.
(NYT, Ultimo Segundo, 05/12/2008