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patagônia
2008-12-05

Após quatro anos de trabalho, mais de 80 especialistas elaboraram um diagnóstico sobre o estado de conservação do Mar Patagônico, uma das áreas oceânicas mais produtivas do Hemisfério Sul, e destacaram que ainda é tempo de reverter as ameaças que turvam suas águas. “Hoje ainda existem condições de sustentar a integridade ecológica e o potencial produtivo deste grande ecossistema”, conclui o vasto informe do qual este mês se divulga apenas um resumo de 300 paginas intitulado “Síntese do estado de conservação do Mar Patagônico e suas áreas de influência”.

O Mar Patagônico inclui, nas costas americanas do Atlântico, desde o sul do Brasil, margeia o Uruguai e chega até a Terra do Fogo, a província mais austral da Argentina. É um ecossistema de três milhões de quilômetros quadrados. O monumental trabalho foi feito pelo Fórum para a Conservação do Mar Patagônico e Áreas de Influência, uma coalizão de entidades da sociedade civil argentinas e internacionais que desde 2004 mostram a necessidade de preservar uma área de riquíssima biodiversidade e que fornece serviços ambientais à humanidade.

Entre os membros argentinos da coalizão estão Fundação Patagônia Natural e Fundação Vida Silvestre, e entre os internacionais Wildlife Conservation Society, Conservation Internacional e União Mundial para a Natureza. A publicação contou com apoio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. O coordenador do Fórum, Claudio Campagna, disse à IPS que um dos objetivos da Síntese é “integrar o conhecimento atomizado e parcial que existe sobre a área. Se é certo que a informação é a origem da mudança, estamos na fase de maior promessa quanto à solução dos problemas do ecossistema”, previu.

Campagna, especialista em mamíferos marinhos, explicou que, ao contrário de outros mares, no Patagônico “ainda não se registra nenhuma extinção de espécies. Vamos a caminho do colapso de algumas populações e outras estão diminuindo seu tamanho de forma considerável, mas, não há extinções”, ressaltou. O informe alerta que a pesca ilegal e não sustentável, a captura incidental de aves, mamíferos e tartarugas marinhas, as espécies introduzidas para a aqüicultura e o despejo de esgoto sem tratamento são alguns dos “graves problemas que ameaçam a abundância de espécies e a potencialidade econômica” desta massa de água salgada.

“Pelo menos 20 cidades costeiras do Uruguai e da Argentina despejam nessas águas esgoto sem tratamento”, diz o informe. Este fenômeno se observa sobretudo nas águas que margeiam a região metropolitana de Buenos Aires e Montevidéu, mas também em outras cidades costeiras. O Mar Patagônico é uma das áreas marinhas mais produtivas do hemisfério. Em média, o fitoplâncton – base da cadeia alimentícia em ecossistemas aquáticos – é três vezes mais abundante em suas águas do que no resto da área oceânica mundial. Absorve grandes quantidades de dióxido de carbono e ajuda a mitigar o aquecimento global.

Mas, também – sempre segundo o estudo – neste habitat encontram refúgio cerca de 700 espécies de vertebrados, alguns carismáticos que ajudam a sustentar os programas de conservação como golfinhos, variedades de pingüins, lobos marinhos e baleias. Das 129 espécies de mamíferos marinhos descritos no mundo, 47 podem ser encontrados nessas águas. As aves marinhas e costeiras somam 83 espécies e cinco das sete tartarugas marinhas conhecidas vivem em suas águas. Entre os invertebrados, apenas os moluscos somam 900 espécies, algumas endêmicas, isto é, só encontradas no Mar Patagônico.

À margem da exploração pesqueira industrial, com da lula, merluza comum, corvina ou camarão, o ecossistema tem importância global como fonte de alimentação para espécies migratórias de aves, peixes, tartarugas e mamíferos marinhos que provêm de áreas distantes, destaca o documento. Mais de um milhão de casais de pingüins de Magalhães se reproduzem anualmente em colônias da costa e das ilhas, e algo semelhante ocorre com a baleia franca austral, que a cada ano oferece um espetáculo único aos visitantes quando se aproxima da costa argentina para sua reprodução.

Apesar dessa riqueza, apenas 0,5% da superfície está protegida mediante quase uma centena de áreas de preservação costeiras, que não estão integradas para enfrentar os desafios apresentados por um sistema dinâmico. E, pior, estas áreas se caracterizam “por uma baixa efetividade de manejo”, ressalta o estudo. “O objetivo internacional é que 10% dos oceanos estejam sob alguma forma de proteção até 2012”, alerta Campagna, uma meta que parece distantes nesta região. Porém, o Fórum “não compartilha da idéia simplista de que a solução dos problemas de conservação do Mar Patagônico esteja unicamente na geração de áreas protegidas onde não tenha lugar nenhum atividade econômica”.

“O Fórum detectou algumas áreas onde se justificaria maior proteção. Mas considera que é possível chegar a uma modalidade de gestão do ecossistema que favoreça os usos econômicos do mesmo sem afetar a biodiversidade ou a continuidade dos processos ecológicos”, acrescenta. Além disso, “a pesca de Brasil, Argentina e Uruguai tem uma importância relativamente baixa no contexto de cada Estado”, dizem os autores do informe. Trata-se de 0,8% da produção total de bens do Brasil, 0,3% da Argentina e 0,1% do Uruguai, ou seja, há potencial de desenvolvimento.

Os pesquisadores afirmam que falta um “modelo integrado” para medir o valor dos bens e serviços do mar e para preservar cerca de 65 espécies ameaçadas de extinção como as tartarugas marinhas e um número crescente de tubarões e arraias, além de aves e mamíferos marinhos expostos a riscos. A Síntese diz que os problemas “não se devem a um vazio normativo, mas a deficiências na aplicação e cumprimento do arco jurídico vigente” e que as ferramentas de conservação para uso sustentável dos recursos “são usadas, mas de forma incipiente”.

“O planeta Terra é um grande oceano com algumas enormes ‘ilhas’ chamadas continentes”, conclui o estudo para chamar a atenção da riqueza a ser preservada. Os mares – compara a Síntese – ocupam 70% da superfície planetária, e 80% no Hemisfério. (IPS/ Envolverde)

(Por Marcela Valente, IPS, Envolverde, 04/12/2008)


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