Os moradores do sul do Estado esperam ansiosos pela a audiência pública que será realizada na região, no próximo dia 12, sobre o recuo do governo estadual no caso da implantação da mega-siderúrgica da Baosteel e Vale no Pólo de Serviços, em Ubu. Desconfiados com a mudança repentina de planos do governo, eles esperam os devidos esclarecimentos para sanar suas dúvidas.
A expectativa é que participem os secretários envolvidos com a questão, o de Desenvolvimento, Guilherme Dias, e a de Meio Ambiente, Maria da Glória Brito Abaurre. Também estará presente a diretora-presidente do Instituto Estadual do Meio Ambiente (Iema), Sueli Passoni Tonini, prefeitos dos municípios envolvidos, comitês de bacias, Ministério Público e empresários.
Nesse encontro, a pedido do Iema, só serão aceitas perguntas por escrito, o que inviabilizará a correta participação popular. Mas, como há interesse da sociedade em conhecer o que o governo vai apresentar, as entidades aceitaram a condição.
Para Ilda de Freitas, presidente do Programa de Interação e Apoio Ambiental (Prograia), o momento deve ser de cautela, pois ainda restam muitas dúvidas sobre a real motivação da desistência do governo estadual em relação ao projeto, e muitas informações contraditórias. “A mudança foi muito radical. Tem mais coisa por trás dessa decisão”, pontuou.
Ela cita como exemplo que poucas semanas atrás, antes do anúncio do governo, Sueli Tonini havia informado que as entidades ambientalistas não teriam seus questionamentos sanados nessa audiência, pois a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) ainda não estaria pronta. “Logo depois, são anunciado não só os estudos completamente concluídos, como a decisão final, consolidada”, questionou.
Para Ilda, também causa estranheza a justificativa usada pelo governo, apontando problemas ambientais há muito tempo conhecidos na região e, em especial, o possível recuo sobre a 4ª usina da Samarco, que degrada o sul do Estado há anos, sem providências. “Há três semanas, estava tudo ótimo para o governo, que afirmava ser totalmente possível a Baosteel no pólo, e a ampliação da Samarco. Essa reviravolta precisa ser esclarecida”, afirmou.
A ambientalista acredita que o governo está preparando o terreno para a Petrobras. Por isso, o Fórum de Entidades Ambientalistas do Sul do Estado começou a estudar a questão e vai exigir um planejamento que possibilite um diálogo real com a comunidade. “Não vamos abaixar a cabeça. Queremos um processo mais tranqüilo e transparente, e que seja considerada a infra-estrutura existente, para garantir a qualidade de vida da população”, ressaltou.
Ela lembra a força que o movimento das entidades consolidou no sul do Estado, movimento que vem ganhando cada vez mais credibilidade e precisa ser não só reconhecido como respeitado pelo governo estadual.
A desistência de implantar o projeto foi anunciada por Guilherme Dias e Maria da Glória no último dia 27, sob a justificativa de que a Companhia Siderúrgica Vitória (CSV) é inviável em Anchieta, pelo esgotamento dos recursos hídricos da região, o que poderia causar a um colapso em 2018, e os elevados índices de poluição do ar emitidos pela Samarco, que se aproxima do máximo permitido. Portanto, o aumento da demanda pelo pólo somente agravaria os problemas.
O governo não afirma que desistiu do projeto no Estado, e sugere outra localização, Itapemirim ou Presidente Kennedy, o que não muda na questão dos impactos sociais e ambientais, já que, na verdade, os três municípios estão na mesma região. Em todos os casos, o Fórum de Entidades do Sul do Estado já avisou que a luta migrará para essas localidades, no caso de a mudança ser confirmada.
Nas duas localidades, há complicadores. Em Itapemirim, a indústria será instalada às margens do rio Itapemirim, e em Presidente Kennedy, já está previsto o Ferrous, que tem o potencial poluidor atual da Samarco Mineração S.A. Para o município, está reservada a implantação de três usinas de pelotização de minério de ferro, com produção total de 21 milhões de toneladas anuais, além de um porto de águas profundas.
O Pólo Industrial e de Serviços de Anchieta, em seu modelo original, abrigaria a 4ª usina da Samarco Mineração, a CSV (Baosteel e Vale), a Unidade de Tratamento de Gás (UTG Sul), porto e retroárea da Petrobras, porto de águas profundas, ramal da Ferrovia Litorânea Sul e, ainda, um condomínio para instalação de empresas correlatas e de apoio.
Agora, com a possibilidade de não abrigar também a Samarco, o pólo sofrerá alterações, em um novo modelo, provavelmente com mais espaço para a Petrobras, com as novas descobertas do pré-sal.
A Samarco é uma empresa da Vale e da australiana BHP Billiton, e opera suas três usinas a pleno vapor, em Anchieta. Além da emissão de poluentes particulados, a empresa também emite gases, e contamina praias e a lagoa Mãe-Bá, onde existem metais pesados lançados pelos efluentes da mineradora.
(Por Manaira Medeiros,
Século Diário, 04/12/2008)